Advogado que teria recebido indenização e não a repassado ao cliente poderá responder por apropriação indébita

Wanessa Rodrigues

Um advogado de Goiânia poderá responder por apropriação indébita por, supostamente, ter recebido indenização cível e não ter repassado o valor para seu cliente. Somente após um ano do término da ação judicial, quando foi chamado na delegacia que estava investigando o caso, foi que o profissional repassou parte da quantia recebida. Ao analisar o caso, a juíza Placidina Pires, da 10ª Vara Criminal de Goiânia, determinou a remessa do inquérito policial à Procuradoria-Geral de Justiça (PGJ), conforme o artigo 28 do Código de Processo Penal.

Juíza da 10ª Vara Criminal Placidina Pires
Juíza da 10ª Vara Criminal Placidina Pires

A magistrada encaminhou os autos à PGJ porque discordou do Ministério Público de Goiás (MP-GO), que requereu o arquivamento do caso por entender que o ressarcimento parcial do prejuízo excluía a tipicidade material da conduta. O advogado repassou R$ 14.479,00 dos R$ 16.983,08 devidos ao cliente, já descontado o valor dos honorários devidos, que, em tese, seria de apenas R$ 7.278,46 – correspondente a 30% sobre o valor da indenização recebida ao final da referida ação cível, que foi fixada em R$ 24.261,54.

Placidina diz que, ao contrário do que sustenta o MP, o ressarcimento do dano, mesmo antes do recebimento da denúncia, por si só, não exclui o dolo do agente e não afasta a tipicidade da conduta. “Podendo caracterizar, tão somente, o benefício do arrependimento posterior, previsto no artigo 16 do Código Penal, desde que preenchidos os requisitos legais”, explica.

O caso
A vítima relatou que contratou os serviços do profissional em 2008, com o objetivo de ajuizar Ação Cível Indenizatória contra uma financeira. Disse, ainda, que, no ano passado, recebeu uma intimação judicial para impulsionar a referida ação, no prazo de 48 horas, sob pena de extinção do processo, e que, diante disso, procurou o advogado. Como não conseguiu encontrá-lo em seu escritório, deixou cópia do mandado de intimação com a secretaria dele.

Conforme relata, ele descobriu que os autos haviam sido arquivos após seu filho realizar consulta no site do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO). Afirma que tentou contato com o advogado por diversas vezes, mas não obteve sucesso. Por isso, requereu no Fórum o desarquivamento dos autos, tendo constatado que a ação já havia sido julgada e fixada indenização em seu favor.

Afirma que a quantia foi depositada em uma conta na Caixa Econômica Federal, a qual não teve acesso. Além disso, que o advogado, supostamente, teria se apropriado do valor após ter recebido alvará para o levantamento do dinheiro. O filho da vítima disse em depoimento na delegacia que procurou por diversas vezes o advogado, sem encontrá-lo e, por isso, procurou a polícia. Declarou, também, que o profissional teria depositado um valor em consignação, mas que não a vítima não aceitou a quantia por considerá-la inferior ao que tinha direito.

Negativa
A respeito do suposto delito em apuração, ao ser ouvido perante a autoridade policial, o advogado confirmou ter sido contratado pelo cliente. Confirmou o valor da indenização, mas negou ter se apropriado da quantia, alegando que tentou avisar o cliente sobre a indenização, mas não obteve êxito. Por fim, informou que, após ter sido notificado pela autoridade policial, consignou o valor de R$ 14.479,00 na conta do cliente.

Porém, ao analisar o caso, Placidina disse que os elementos indiciários evidenciam que o advogado, se aproveitando de sua profissão, teria se apropriado do valor da indenização e sequer informou ao ofendido que teria feito o levantado do dinheiro. A magistrada salienta que, apesar de o advogado, em tese, ter recebido a mencionada quantia em abril de 2015, o depósito que ele teria realizado em favor do ofendido somente foi efetivado em junho de 2016.

Placidina salienta que, no momento em que recebeu o alvará judicial, em tese, o advogado tinha todos os dados do cliente, inclusive o seu endereço e telefone de contato, conforme Contrato de Prestação de Serviços e Honorários. A magistrada ressalta que todos os dados constantes na guia de Recebimento de Depósito de Consignação e Pagamento, coincidem com os informados no referido contrato de prestação de serviços firmado entre eles.

A magistrada lembra que o ofendido teria procurado o advogado várias vezes, indo ao escritório dele ou ligando em seu telefone, mas o profissional supostamente se esquivou de encontrá-lo. “Verifico que, em tese, o advogado tinha todas as condições para localizar a vítima, mas, aparentemente, não fez o menor esforço para encontrá-la, só o fazendo depois que o cliente procurou a autoridade policial”, completa.