Lei da Palmada ficará só no papel

A Lei da Palmada ainda gera polêmica. Sancionada há um mês pela presidente Dilma Rousseff, ela pode não pegar. A justificativa é a falta de estrutura da rede de proteção a crianças e adolescentes para atender o que a lei determina.

Pais que agredirem os filhos devem, a partir da regra, receber orientação, tratamento psicológico ou psiquiátrico, além de advertência. Conselheiros tutelares de Goiânia afirmam que esse tipo de demanda não será atendida, já que falta estrutura para atendimento básico. “É uma lei que não vai se colocada em prática pela falta de profissionais.”

Conselheiro da região leste, Francisco Tavares entende que a lei pode ser mais uma a ficar só no papel porque os conselhos agonizam falta de diversos itens básicos, desde papel até energia ou maquinário. Segundo ele, não existe rede de profissionais para atender a demanda existente. “Muitas vezes precisamos de psicólogo ou outro profissional para atendimento de crianças e adolescentes com problemas graves, como dependência de drogas e não temos. Quando tem, a fila de espera é enorme e não consegue nos atender.”

José Nilton, conselheiro da região noroeste, afirma que a demanda atendida hoje pelos postos já é grande e não sabe se serão capazes de absorver mais essa questão. “Quando o caso é de agressão, de violência, os conselhos já atendem e fazem os encaminhamentos. Isso não muda nada no nosso trabalho. O que não temos é a rede de apoio para encaminhar esse pai ou mãe agressor. Hoje não temos nem a rede que suporte o atendimento para o agredido. Acho difícil que essa lei siga adiante”, opina.

Especialista em educação infantil e pedagogo, José Elias de Oliveira entende que a lei terá dificuldades para se firmar. Ele não defende e nem apóia a regra. “A questão merece debate. Qualquer coisa que tente frear a agressão é válida, mas o País não tem como manter essa lei pela falta de investimentos. Essa é uma lei que poderia dar certo em países de primeiro mundo, onde há investimentos massivos em Educação.” E ele reafirma a opinião dos conselheiros tutelares: “Acredito que essa lei vai ficar apenas na teoria”.

José Elias destaca que a palmada é uma alternativa dos pais para coibir maus comportamentos. “Não está proibido corrigir, o que não pode é agredir.” A legislação proíbe castigo físico, que cause sofrimento físico ou lesão. Assim, só seriam punidos, caso a lei tivesse o suporte necessário, aqueles que agredirem, usando a violência. Para o especialista, o que vale nessa questão é o debate gerado. “Temos que aproveitar a polêmica e discutir mais o tema em todas as esferas. A lei seria eficiente se contássemos com uma rede integrada e eficiente, para que, daqui a alguns anos, a agressão contra crianças fosse excluída do nosso histórico.”

Filósofo Joel Pinheiro também discorda da aplicação da lei. Em publicação ele avalia que o custo social da implementação é alto demais. Para ele, a Lei entrará, assim, “no rol das leis hipócritas: aquelas que ninguém espera que sejam seguidas, mas que continuam valendo quando convém. Como a Lei Seca”. Ele ainda acrescenta: “Me digam, o que será pior para uma criança: levar uma palmada no bumbum ou ser tirada à força de seus pais, dada aos cuidados da Assistência Social, ir e vir a tribunais familiares, e ser repassada a uma nova família?”, contesta o filosofo.

Lei

Em vigor desde 27 de junho, a Lei, após sua aprovação no congresso, foi batizada de Lei Bernardo, em homenagem ao garoto gaúcho Bernardo Boldrini, de 11 anos, morto com uma injeção letal em abril deste ano. O corpo do menino foi encontrado às margens de uma estrada em Frederico Westphalen (RS); o pai e a madrasta do garoto são suspeitos do crime.

Segundo a norma, pais que aplicarem castigo físico ou tratamento cruel ou degradante para educar os filhos devem ser acompanhados, assim como os filhos, ou vítimas. A presidente Dilma Rousseff vetou um único trecho. O dispositivo que punia com multa de 3 a 20 salários mínimos servidores públicos, profissionais de saúde, educação ou assistência social que deixassem de comunicar às autoridades casos em que houvesse suspeita ou confirmação de maus-tratos a crianças e adolescentes. Fonte: Jornal O Hoje