Uma estudante cotista, que teve sua matrícula cancelada por não ter sido considerada parda, garantiu na Justiça o direito de permanecer no curso de Medicina da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSBA). Ela passou por procedimento de heteroidentificação, por meio de Processo Administrativo Disciplinar, quatro anos após o ingresso na Instituição de Ensino Superior (IES).
A decisão é da 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), que reformou sentença que havia negado o pedido. Os magistrados seguiram voto do relator, desembargador federal Souza Prudente.
No pedido, o advogado goiano Sérgio Merola, do escritório Sérgio Merola Advogados, disse que a estudante sempre se considerou uma pessoa de cor parda, sendo legítima sua autodeclaração. Observou ser descabida a avaliação feita pela Comissão de Averiguação, porquanto não corresponde à realidade fática. Defende que a invalidação da autodeclaração não se pautou em critérios objetivos, e não foi devidamente motivado.
Além disso, alegou que que não se pode admitir que a Administração Pública crie, quatro anos depois, critérios não exigidos pelo Edital. E que a aprovação no curso, dentro de todas as exigências editalícias, é direito conquistado pela estudante. Sendo que este direito não pode ser reavaliado a qualquer tempo a critério da Administração, sob pena de violação à segurança jurídica e ao Princípio da Proteção da Confiança.
Previsão expressa em edital
Ao analisar o recurso, o relator salientou que, não obstante se reconheça a legalidade do procedimento de heteroidentificação para verificação da veracidade da autodeclaração dos candidatos, a sua utilização requer expressa previsão em edital, por força do princípio da vinculação ao instrumento convocatório. Não sendo legítima a submissão dos candidatos à comissão de verificação quando o edital estabeleceu, como critério para o ingresso na instituição de ensino por meio das cotas raciais, apenas a autodeclaração dos candidatos.
Disse, ainda, que decorridos quatro anos do seu ingresso na Universidade, não se mostra razoável o ato de cancelamento da matrícula da autora. Revelando-se mais pertinente a manutenção da aluna no curso de Medicina, tendo em vista todo o esforço despendido durante esse tempo e os recursos financeiros empregados na formação da estudante.
Ressaltou que as fotografias acostadas à exordial demonstram, à saciedade, a veracidade da autodeclaração de cor levada a efeito pela requerente, enquadrando-se na condição de cor parda. Citou o direito constitucional à Educação (CF, art. 205) e a expectativa de futuro retorno intelectual em proveito da nação, “que há de prevalecer sobre formalismos eventualmente inibidores e desestimuladores do potencial científico daí decorrente.”