Após 4 anos de tolerância zero na Lei Seca, motoristas continuam sendo autuados por dirigir embriagados

A embriaguez ao volante foi responsável pela morte de 479 pessoas nas rodovias federais no ano passado. O número é praticamente o mesmo de 2012 – ano em que as penas para quem dirige depois de ingerir bebidas alcoólicas se tornaram mais rígidas – quando 485 pessoas morreram em acidentes nas estradas fiscalizadas pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) por influência do álcool.

E, ao final de feriados prolongados, percebe-se também que é grande o número de motoristas autuados nas rodovias por dirigirem embriagados. Segundo balanço da Operação Tiradentes, realizada nas rodovias estaduais e saídas para pontos turísticos de Goiás durante o feriadão de Tiradentes, em 37 abordagens foram registradas as presenças de álcool no sangue dos motoristas.

Para o advogado Rogério Leal
Para o advogado Rogério Leal as penalidades previstas no Código de Trânsito são leves

A embriaguez ao volante é combatida pelo Código de Trânsito Brasileiro (CTB), que entrou em vigor em 1998; e  pela Lei Seca, de 2012. Quem descumpre a norma de tolerância zero de álcool na direção sofre punição na esfera administrativa (multa de quase R$ 2 mil e suspensão do direito de dirigir por 12 meses e, em caso de reincidência, o valor da multa dobra, segundo o CTB). Na esfera penal, a pena por dirigir embriagado vai de 6 meses a 3 anos de prisão. Caso haja acidentes e vítimas, a pena poderá ser elevada.

Para o advogado Rogério Leal, as penalidades previstas no Código de Trânsito Brasileiro para o motorista bêbado são leves. Ele contesta a ideia, defendida por parte da sociedade, de que multas e sanções econômicas resolveriam a questão da embriaguez no trânsito. “Temos a falsa impressão de que a sanção financeira resulta em algo, o que não é verdade”, diz. “A conscientização no trânsito tem que nascer na infância, na adolescência e no Ensino Médio, quando o jovem já sonha em dirigir”.

O advogado, que também é professor de Direito, alerta para o excesso de leis para ordenar a nossa rotina. “Quando vemos que é necessária uma Lei Maria da Penha para garantir a segurança das mulheres; uma outra para garantir que o idoso seja bem tratado ou ainda uma terceira para assegurar que as crianças tenham direito à educação e saúde, questões mais morais que políticas, algo está errado”, alerta. “Aprendemos desde cedo que crianças, idosos, mulheres, enfim, todos têm de ser bem tratados e ter seus direitos respeitados. Então, onde nos perdemos?”.

Dolo eventual

O advogado Rogério Lustosa
O advogado Rogério Lustosa diz o Direito não é como a matemática. “Cada caso é um caso”

E no caso do motorista embriagado que causa morte ou lesão no trânsito? O assunto ainda gera polêmica mas, em determinado caso, o Supremo Tribunal Federal já entendeu que, ao dirigir embriagado, o motorista assume o risco de matar, o que configura no Direito o chamado “dolo eventual”.

Em 2009, um frentista foi condenado a seis anos de prisão em regime semiaberto pelo atropelamento e consequente morte de uma idosa. Ele estava em alta velocidade, havia bebido. Em 2013, ao julgar o pedido de habeas corpus impetrado pela defesa do frentista, o ministro Ricardo Lewandowski concluiu que as circunstâncias do crime não eram favoráveis ao motorista e discordou da defesa, que pedia a desclassificação da conduta para homicídio culposo (ou seja, sem a intenção de matar).

O advogado criminalista Rodrigo Lustosa lembra que o Direito não é objetivo como a matemática. “Os dispositivos do Direito sempre demandarão interpretação em cada caso concreto”, explica. Assim, se alguém na direção de veículo automotor matar outra pessoa, sem a intenção que isto acontecesse, responderá pelo crime de trânsito (Artigo 302 do CTB- detenção de dois a 4 anos). Se houver a intenção, responderá pelo crime de homicídio do artigo 212 do Código Penal (6 a 20 anos).