Em seus últimos dias de vida, Ada Pellegrini interveio como amicus curiae em duas ações da goiana AMARBRASIL

Ada Pellegrini Grinover morreu dia 13 de julho

Uma das mais respeitadas juristas do país, a processualista Ada Pellegrini Grinover, que morreu no último dia 13 de julho aos 84 anos de idade, deixou grandes contribuições para o Direito brasileiro. Ela participou efetivamente da reforma do Código de Processo Penal e do Código de Defesa do Consumidor, foi coautora da Lei de Interceptações Telefônicas, da Lei de Ação Civil Pública e da Lei do Mandado de Segurança e fez pesquisas sobre meios alternativos de solução de controvérsias. Mas, o que quase ninguém sabe, é que Ada dedicou parte do último mês de vida a análise de duas ações propostas contra as operadoras de telefonia celular pela Associação Nacional para da Defesa da Cidadania, Meio Ambiente e Democracia (AMARBRASIL), que tem sede em Goiânia.

O advogado Uarian Ferreira, superintendente fundador da AMARBRASIL, conta que, no dia 27 de junho, enviou e-mail para a jurista com informações sobre os processos – uma ação civil pública coletiva contra cobrança por serviço de caixa de mensagem e a outra para barrar os telefones piratas – na tentativa de que ela pudesse intervir como amiga da causa (amicus curiae) em ambos os feitos. A entidade é associativa não governamental, sem fins lucrativos com atuação em qualquer região do Brasil.

Uarian Ferreira é o fundador da AMARBRASIL

Segundo Ferreira, Ada aceitou a incumbência. E para viabilizar os trabalhos, os dois trocaram dezenas de e-mails. O último foi enviado por ela às 15h25 do dia 13, poucas horas antes da sua morte, ocorrida à noite. Na correspondência, ela garantia já ter apresentado sua petição (veja e-mail abaixo) no processo do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (leia aqui)”. No dia anterior (12 de julho), ela também já havia peticionado para ser incluída como amiga da causa na ação em tramitação na 7ª Vara Federal de Brasília (leia qui), que trata sobre a proibição da venda de celulares sem certificação (telefone piratas).

Uarian, que somente soube do falecimento de Ada por volta das 23 horas do dia 13, chegou a enviar uma correspondência eletrônica perguntando se Ada havia recebido todos os documentos enviados por ele. Mas não obteve resposta, pois a jurista já havia morrido e ele ainda não sabia. Apesar da perda de pessoa tão prestativa e que se mostrou realmente interessada nas causas abraçadas pela AMARBRASIL, Uarian garante que os esclarecimentos da jurista estão devidamente apontados não só nas nas petição apresentada por mas também foram elencados em agravo interno (Processo 2012.01.1.156939-3) apresentado pela AMARBRASIL no TJDFT, no último dia 14 de julho.

Ação Civil Coletiva

O recurso da AMARBRASIL (leia aqui) diz respeito à Ação Civil Coletiva que questiona a ilicitude dos serviços de caixa de mensagem oferecidos pelas operadoras de telefonia celular do Brasil. Em um dos despachos da Justiça, foi solicitado à entidade que juntasse aos autos Edital de Convocação e Ata de Assembleia “específica” para a propositura da ação. Posteriormente, o relator, monocraticamente, decidiu pela extinção da ação com fundamento na ilegitimidade da AMARBRASIL para a formulação de Ação Civil Coletiva com base na Lei de Ação Civil Pública (LACP).

Ao analisar o caso, Ada observou que os pedidos da inicial são quase todos indicativos da substituição processual (que não exige autorização dos associados). No agravo interno, o advogado que representa a Amarbrasil salienta que, com base nos relatos apresentados, interessava à professora e doutora Ada Pellegrini Grinover que os tribunais entendessem a “distinção entre substituição processual e representação processual da associação” e, especificamente, como “amiga das causas” da AMARBRASIL, combater “o foco das operadoras” que “miram confundir a substituição com a representação, para abortar todas as ACPs baseadas na LACP e no CDC”.

Em uma das correspondências eletrônicas, Ada diz: “Sei muito bem qual é o foco das operadoras e o que elas miram é confundir a substituição com a representação, para abortar todas as ACPs baseadas na LACP e no CDC. É isto que temos que combater agora.” Ao fundamentar o recurso, o advogado da Amarbrasil mostra justamente esse entendimento e diz que a exigência que faz o órgão julgador monocrático para a AMARBRASIL “demonstrar documentalmente o procedimento de autorização específica adotado por ela” ofende ao art. 5º, 1º, II e V, alínea b, da Lei 7.347/85; e art. 21 da Lei 7.347/85 c/c 82, IV do CDC.

“A decisão agravada esvazia (sic) “a própria finalidade da associação” prevista no art. 5º, XXI, da CRFB, por atentar contra postulados constitucionais de acesso coletivo ao Poder Judiciário e ao desenvolvimento da Democracia Participativa”, completa Ferreira.

Veja o último e-mail enviado por Ada Pellegrini a Uarian Ferreira. Nele, ela apontava  que já havia enviado sua intervenção na 7ª Vara Federal.  A correspondência foi enviada às 15h25, poucas horas antes da morte da jurista