Dois policiais e um estagiário de Direito são condenados por cobrarem para não autuar flagrante

A juíza Placidina Pires, da 10ª Vara Criminal de Goiânia, condenou dois policiais pelo crime de concussão (exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida) por deixarem de autuar uma pessoa presa em flagrante delito. Os agentes de polícia Rogerildo Gentil de Melo e Luís Eduardo Gonçalves, que também foram penalizados com a perda dos cargos, receberam penas de 3 anos e 9 meses e 2 anos e 9 meses de reclusão, respectivamente. Também foi condenado por auxiliar os civis no crime o estagiário de Direito Claudionor Ribeiro de Almeida, punido com 2 anos e 9 meses de reclusão. Os regimes impostos foram o semiaberto para Rogerildo e o aberto para Luis e Claudionor.

Em razão das penas aplicadas aos três acusados não excederem a quatro anos e o crime não ter sido praticado mediante violência ou grave ameaça, a magistrada (foto à direita) procedeu a substituição por duas penas alternativas: a primeira consiste na execução de tarefas gratuitas, durante uma hora de tarefa por dia de condenação, por seis horas semanais, em instituição a ser designada pelo Setor Disciplinar Penal (SIP), situado no Fórum Criminal Desembargador Fenelon Teodoro Reis, sala 123, de acordo com as necessidades da instituição e aptidões do cumpridor. Já a segunda equivale a doação de um salário mínimo para cada um, vigente à condenação, em favor do Programa Penas Pecuniárias, do Fundo Penitenciário. Como eles permaneceram soltos durante toda a instrução e compareceram a todos os procedimentos judiciais, poderão recorrer em liberdade, conforme determina a  juíza na sentença.

Segundo a denúncia formulada pelo Ministério Público do Estado de Goiás (MPGO), em 19 de agosto de 2010, em Goiânia, os policiais Rogerildo e Luís Eduardo, lotados na época no 22º Departamento de Polícia, receberam uma informação anônima de que Diego Glonc de Lima, que estava sendo investigado por tráfico de drogas, se encontrava em uma praça próxima a uma oficina de motos no Jardim Curitiba III. Ao encontrarem Diego na oficina de Willian Moreira De Melo, consertando sua motocicleta, Rogerildo e Luís Eduardo o abordaram e o revistaram, encontrando em seu poder uma pequena porção de maconha e 30 reais em dinheiro.

Ao ser indagado pelos agentes, Diego confessou ter em sua casa uma quantidade maior de maconha. Após deslocarem-se até a sua residência, foram encontrados no local vários papelotes de maconha prontos para venda, totalizando aproximadamente 500 gramas. Aproveitando-se da situação, conforme narra o MPGO, Luis Eduardo e Rogerildo, cientes de que Diego era proprietário de uma motocicleta que estava sob conserto na oficina de Willian, exigiram que ele assinasse uma procuração autorizando-os a retirarem o veículo da oficina.

O argumento usado pelos agentes de polícia foi o de que Diego teria a prisão “aliviada” se obedecesse tal orientação. Rogerildo, de acordo com o órgão ministerial, chegou a exigir de Diego e sua companheira Jessika Lorraine que não citassem a existência da moto em seu depoimento no distrito policial. Então, Claudionor, estagiário no escritório de advocacia de Raimundo Lisboa Pereira, tomou conhecimento da trama ilícita envolvendo os denunciados e elaborou tal procuração, mesmo sem ser advogado.

Segundo o MPGO, Luis Eduardo e Rogerildo tentaram pegar a moto na oficina, no entanto, não obtiveram êxito porque Willian Moreira de Melo, dono da oficina, afirmou que só entregaria a moto com autorização do dono. Os policiais negaram terem voltado à oficina de Willian para buscar a motocicleta, no entanto, Willian confirmou que Luis Eduardo retornou à oficina com Claudionor, que se identificou como “advogado Lisboa”, em uma outra tentativa de retirar a moto. Contudo, ele também não a entregou aos dois e reafirmou que só a passaria às mãos do verdadeiro proprietário.

Fundamentação
Para Placidina Pires, o conjunto probatório constante dos autos evidencia que os três acusados atuaram de forma decisiva para a execução do crime, uma vez que, a seu ver, ficou comprovado que Rogerildo e Luis Eduardo, na condição de policiais civis, exigiram a motocicleta de Diego, enquanto Claudionor se passando pelo advogado Lisboa, elaborou uma procuração e dirigiu-se até a oficina em que estava com sua moto para buscá-la, caracterizando, assim, contribuição direta e preponderante na execução de infração penal.

“Denoto que Claudionor prestou auxílio moral e material a Rogerildo e Luis Eduardo durante todo o caminho do crime (iter criminis), devendo também ser responsabilizado pelo deito em tela. É inviável, portanto, o pleito formulado pela sua defesa técnica de reconhecimento de participação de menor importância”, asseverou. Na opinião da juíza, a materialidade e a autoria do crime ficaram provadas, e não militam em favor dos acusados nenhuma excludente da tipicidade, da ilicitude ou culpabilidade. Fonte: TJGO