IPTU: você se impôs essa norma?

O Estado cria direitos e deveres para seus cidadãos por meio de um processo legislativo que tem sua origem na outorga pelos cidadãos integrantes desse Estado de um mandato àqueles que agem em nome desse mesmo Estado.

A vontade coletiva dos cidadãos integrantes do Estado gera uma auto-regulação intermediada por representantes do povo – eis o cerne da democracia representativa constitucional.

“Después a este resultado de la voluntad general se llegue por la via de la democracia directa, con la activatión desde abajo de la voluntad del pueblo soberano protagonista en primera persona de la deliberación de la ley, o por la via de la democracia representativa, mediante el gran artifício de la representación política como representacíon de la nación, provista de la prohibición del mandato imperativo y por tanto capaz de expresar con la ley uma voluntad general y abstrata no viciada por voluntades e interesses particulares(…) La soberania es una fuerza que nasce limitada en si, pues existe para una finalidad principal o exclusiva: la de generar una ley positiva estatal que garantice los derechos de los indivíduos en cuanto tales, em condición de igualdad. ”

A soberania referida por FIORAVANTI é a “soberania interna”, chamada por FERRAJOLI  de “Estado Pessoa”, que consiste no dever ou na possibilidade de o Estado, por delegacia de seus cidadãos, de criar normas jurídicas em caráter de exclusividade.

Essa conjugação de fatores – noção de soberania interna, direitos fundamentais, igualdade e legalidade – marca, no início do século XIX, a transição para o Estado Democrático Constituiconal.

A presença de uma Constituição liberal, regulando e limitando a atuação do próprio Estado, a separação das funções estatais, a atuação do Judiciário na proteção de direitos e liberdades individuais e coletivas plasma a noção de que ao Estado apenas é lícito atuar sob regras jurídicas e nos limites balizados pela Constituição.

A legitimidade do poder é dada pelo poder político titularizado pelo povo e outorgado por ele aos seus representantes. Nos Estados em que há regime constitucional-democrático a soberania do povo é que legitima o poder e a elaboração das normas jurídicas .

A ideia de Estado Democrático, base de todo o ordenamento jurídico brasileiro, predica decisões coletivamente tomadas reconhecendo direitos subjetivos, mesmo pertencentes a grupo minoritários, sendo democrática, portanto, normas contra majoritárias produzidas em decorrência de um sistema eleitoral proporcional no processo eleitoral para cargos no legislativo.

Assim, até mesmo as normas produzidas sem o alcance de uma “maioria na vontade direta do povo” seriam legítimas se produzida no sistema constitucional representativa que, inclusive, considera a vontade das minorias na tomada de decisões.

Até mesmo normas impostas aos cidadãos – por exemplo, normas restritivas de liberdades individuais – seriam legítimas na medida em que fruto de um processo de produção normativa previamente fixado. Seriam essas normas, em verdade, decorrência de uma auto-limitação realizada pelos próprios titulares do direito.

E você? Se auto impôs pagar mais IPTU no seu imóvel?

*Carlos Vinícius Alves Ribeiro, mestre e doutorando em Direito do Estado pela USP, Professor de Direito Administrativo e Urbanístico, Promotor de Justiça.