No dia 26 de agosto de 2021 foi sancionada a Medida Provisória (MP) 1.040 de 2021 e convertida na Lei 14.195/2021. Uma das principais medidas que constavam no Projeto de Lei de Conversão da referida MP em Lei era a revogação do art. 980-A do Código Civil, o qual dispõe a respeito da empresa individual de responsabilidade limitada (Eireli).
A revogação do artigo em tela eliminaria esta “jabuticaba” do direito societário brasileiro, tendo em vista especialmente as exigências, em certa medida, descabidas para a constituição da Eireli, tais como: (i) capital social superior a cem vezes o maior salário-mínimo vigente no País e (ii) a proibição de a pessoa natural titular de Eireli constituir outra empresa da mesma categoria.
Contudo, para surpresa de todos, a alínea “e” do inciso XXIX do caput do art. 57 do Projeto de Lei de Conversão que revogava o art. 980-A do Código Civil foi vetado pelo Presidente, com a justificativa de que a supressão iria de encontro ao interesse público. Além disso, para aumentar as divergências, a lei foi sancionada com a seguinte disposição em seu art. 41: “As empresas individuais de responsabilidade limitada existentes na data da entrada em vigor desta Lei serão transformadas em sociedades limitadas unipessoais independentemente de qualquer alteração em seu ato constitutivo”.
Diante disso, o Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração (DREI) — órgão que, no plano técnico, supervisiona, coordena e orienta as Juntas Comerciais, bem como edita normas e diretrizes gerais sobre o registro do comércio — elaborou Minuta de Ofício Circular que pretendia orientar sobre a interpretação a ser dada ao art. 41 da referida lei, bem como eventual revogação tácita do inciso VI, do art. 44 e do art. 980-A do Código Civil. A minuta partia da premissa de que tais dispositivos do Código teriam sido tacitamente revogados, pois o § 1º do art. 1.052 no Código Civil e o art. 41 da Lei 14.195/2021 implicam, respectivamente, na constituição de sociedades limitadas unipessoais e a conversão automática das Eireli existentes em sociedades limitadas unipessoais.
Assim sendo, o DREI submeteu a referida minuta para análise jurídica da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, a qual, em 8 de setembro, aprovou o Parecer nº 00733/2021/PGFN/AGU, que atestou a juridicidade do texto que o DREI pretendia enviar às juntas comerciais.
Nessa senda, importante destacar o entendimento certeiro do parecerista, Advogado da União, Caio Márcio Melo Barbosa: “Essa nova conformação jurídica é incompatível com a constituição de novas Eireli, quer porque as Eireli e as sociedades limitadas unipessoais têm a mesma função no direito empresarial (sendo que estas últimas oferecem vantagens comparativas sobre as primeiras), quer porque não há sentido lógico extinguir as Eireli existentes na data da entrada em vigor da Lei nº 14.195/2021 mas, a um só tempo, admitir que novas Eireli sejam constituídas a partir da sua entrada em vigor. Numa palavra, a coerência do sistema jurídico somente é atingida se concluirmos que o instituto da Eireli foi extinto.”
Dessa forma, denota-se que, com a atuação primordial do DREI, preenchendo a lacuna deixada pela legislação, contribuindo para a melhoria do ambiente de negócios e, principalmente, facilitando a vida dos empresários com a dispensa de requisitos despropositados para constituição de sociedade, a Eireli deixou de existir.
Portanto, agora os empresários possuem maior liberdade para reorganizar suas estruturas societárias, aprimorar a governança e a proteção ao patrimônio das pessoas jurídicas ou físicas acionistas/quotistas, utilizando-se, dentre outras fermentas, dos principais tipos societários existentes (sociedade limitada unipessoal, sociedade limitada e sociedade anônima).
*Gabriel Pedra é advogado da Biolchi Empresarial
1 http://www.planalto.gov.br/
2 http://www.planalto.gov.br/
3 Advocacia Geral da União. Parecer nº 00733/2021/PGFN/AGU. Disponível com o código 719271385 em http://sapiens.agu.gov.br. Acesso em 16 de set. de 2021.