Carf reconhece aplicação de princípio que impede cumulação de duas penalidades

*Márcio Miranda Maia

Dezembro de 2020 – A Câmara Superior do Conselho Administrativo de Contribuintes (CARF) reconheceu a aplicação do Princípio da Consunção (ou Absorção) para afastar a cumulação de penalidades sobre um ato que seja considerado preparatório para outro, também punido, devendo prevalecer somente a multa pelo ato mais grave (Acórdão nº 9101-005.080 – CSRF / 1ª Turma, Processo Administrativo nº 10665.001731/2010-92, Sessão de 01/09/2020).

O Princípio da Consunção, importado do Direito Penal, determina que somente deve ser punida a infração mais grave, absorvendo-se nessa penalidade as infrações de menor gravidade que tenham sido praticadas para alcançar aquele fim. Um dos exemplos clássicos do Direito Penal, é a falsificação de identidade para a prática de estelionato, que é considerada uma preparação e, portanto, não punida isoladamente.

No recurso julgado, discutia-se a cumulação das multas de ofício e isolada e, diante do empate nos votos dos Conselheiros, prevaleceu a posição favorável ao contribuinte, em conformidade com o artigo 19-E, da Lei nº 10.522/2002, incluída pelo artigo 28, da Lei nº 13.988/2020.

O contribuinte não recolheu o IRPJ devido por estimativa mensal, ensejando a cobrança da multa isolada de 50% do valor. Além disso, após encerrado ano calendário, verificou-se o recolhimento insuficiente do IRPJ devido no ajuste anual o que, por sua vez, motivou o lançamento da multa de 75% do imposto devido.

Comumente, a multa de ofício é exigida quando o Fisco apura o não recolhimento do tributo, lavrando auto de infração para cobrança do imposto, cumulada com a penalidade que varia de 75% a 150% sobre o valor devido.

Já a multa isolada visa punir o contribuinte pelo descumprimento de uma obrigação, e é cobrada independentemente de ser devido imposto. Uma das hipóteses comuns de aplicação é da multa de 50% sobre o não recolhimento do IRPJ devido por estimativa mensal.

De acordo com o que restou decidido, as estimativas são mero adiantamento do tributo, que é devido ao final do período de apuração. Assim, a falta de pagamento da antecipação é elemento que concorre a infração correspondente ao não recolhimento do imposto anual.

Ou seja, como o não recolhimento da estimativa mensal é um “ato preparatório” para a infração mais grave de não recolhimento do imposto devido ao final do ano, ocorrendo a absorção da conduta pela infração mais grave. Desse modo, o dano causado ao Fisco um só, a ausência de recolhimento do imposto, ato esse que deve ser punido.

Concluiu-se que: “O instituto da consunção (ou da absorção) deve ser observado, não podendo, assim, ser aplicada penalidade pela violação do dever de antecipar o valor de um determinado tributo concomitantemente com outra pena, imposta pela falta ou insuficiência de recolhimento desse mesmo tributo, verificada após a sua apuração definitiva e vencimento”

Em 2014, o CARF já havia aprovado a Súmula nº 105, que estipulava a impossibilidade de cumulação da multa isolada por falta de recolhimento de estimativa com a multa de ofício por falta de pagamento de IRPJ e CSLL apurado no ajuste anual, devendo subsistir a multa de ofício.

No entanto, como o contexto dos julgamentos envolvia a legislação vigente até 2006, o Fisco defendia o entendimento não se aplicava a partir de 2007, diante da alteração legislativa (Lei nº 11.488/2007).

Assim, o recente julgamento é importante para os contribuintes, pois reconhece que, mesmo sendo legítimas as duas penalidades para punir as condutas distintas, deve se observar o princípio da consunção na esfera tributária para impedir a cumulação da multa por ato que seja considerado meio de execução de outra infração, devendo a pena pela infração-meio ser absorvida por àquela aplicada à infração-fim.

*Advogado e sócio no escritório Maia & Anjos, especializado em Direito Empresarial e Tributário