As principais alterações nos direitos dos empregados domésticos

*Ludimila Lacerda

É cediço que, ao longo da história do nosso país, diversos fatores contribuíram para a desvalorização do empregado doméstico. A abolida escravidão deixou um legado injusto àqueles que desempenham suas atividades no setor residencial que culminou na discriminação legal e, quiçá, constitucional desses trabalhadores para com as demais categorias profissionais.

Portanto, diante dessas considerações, questiona-se: Quais foram as alterações implementadas pelo legislador brasileiro a fim de tutelar os direitos dos empregados domésticos e suplantar a desigualdade inconstitucional desfraldada diante das demais classes de trabalhadores?

A Lei Complementar nº 150, de 1º de junho de 2015 traz, em seu artigo 1º, a definição de empregado doméstico como sendo “aquele que presta serviço de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas, por mais de 2 (dois) dias por semana”, ficando vedado o trabalho doméstico aos menores de 18 anos.

Portanto, enquadra-se nesta categoria, não somente a faxineira e a passadeira, mas também o motorista particular, o cozinheiro, o cuidador de idoso ou de criança, o jardineiro, etc., desde que preenchidos os requisitos legais supracitados.

Segundo os índices do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística atualizados em 30 de abril de 2019, existem 6,1 milhões de trabalhadores domésticos no Brasil. Não obstante o expressivo número de empregados na categoria, por décadas, não fora capaz de se fazer perceber, mantendo-se uma classe trabalhadora legalmente segregada das demais.

Isso porque a Constituição da República Federativa do Brasil concedia aos empregados domésticos apenas alguns direitos trabalhistas, tais como: salário-mínimo; irredutibilidade salarial; décimo terceiro salário; repouso semanal remunerado; férias anuais remuneradas, acrescidas de um terço do salário; licença-maternidade; licença-paternidade; aviso prévio; aposentadoria e integração à previdência social.

No entanto, essa realidade teve seu processo de transformação impulsionado a partir da promulgação da Emenda Constitucional nº 72, de 02 de abril de 2013, a qual assegurou aos trabalhadores domésticos vários direitos já consagrados aos trabalhadores urbanos e rurais e, até então, não conferidos à categoria primeira.

Nesse ínterim, foram garantidos aos empregados domésticos, de forma imediata, os seguintes direitos: garantia do salário-mínimo, inclusive para os que percebem remuneração variável; proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa; jornada de trabalho não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, assegurada a remuneração do serviço extraordinário, acrescida do respectivo adicional; redução dos riscos inerentes ao trabalho, a partir da aplicação de normas de saúde, higiene e segurança; reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho; proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil, o que também foi estendido ao trabalhador portador de deficiência.

Todavia, a despeito do grande avanço legislativo na tutela dos direitos dos empregados domésticos, a Emenda Constitucional supracitada deixou outras tantas garantias, anteriormente conferidas às demais classes trabalhadoras, cuja aplicação à categoria de empregados no âmbito residencial e familiar ficara pendente de regulamentação.

Com isso, no intuito de conferir segurança jurídica na execução do contrato de trabalho doméstico, bem como de regulamentar os direitos introduzidos pela reforma constitucional, fora aprovada a Lei Complementar nº 150/2015, a qual concedeu ao empregado doméstico inúmeros direitos como, por exemplo, a proteção contra a despedida arbitrária ou sem justa causa, o direito ao seguro-desemprego, ao fundo de garantia por tempo de serviço, ao adicional noturno, ao salário-família, ao seguro contra acidentes de trabalho a cargo do empregador, dentre tantos outros dispostos na legislação.

Outrossim, a Reforma Trabalhista de 2017 (Lei nº 13.467/2017) alterou mais de cem artigos da Consolidação das Leis do Trabalho, atingindo de forma significativa a relação de trabalho do empregado doméstico, visto que aplicada à categoria em comento nos casos de omissão da Lei das Domésticas (LC nº 150/2015), por se tratar de norma geral e com aplicação abrangente.

Assim, mister sobrelevar que o Brasil tem vivido tempos de avanço social, promovidos pelas alterações implementadas no ordenamento jurídico do país, a partir da tutela dos direitos das classes trabalhadoras, dentre elas os empregados domésticos. Isso porque, a utilização da força de trabalho jamais pode ser considerada como um ato de favor, tampouco como uma obrigação do ser humano economicamente desfavorecido.

Dessa feita, tem-se que a invisibilidade do trabalho doméstico e a desigualdade histórica e inconstitucional sobre ele instalada foi suplantada pela valorização social do trabalho, bem como pela consolidação da igualdade e da dignidade da pessoa humana, constitucionalmente garantidas a todos os trabalhadores.

*Ludimila Lacerda é advogada da Jacó Coelho Advogados Associados