Ao aplicar o instituto “duty to mitigate the loss” (dever de reduzir os prejuízos), a Segunda Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (Goiás) cassou condenação de empresa de coleta de lixo a indenizar por danos morais e materiais a um gari. A Turma acompanhou o voto do relator que aplicou, por analogia, o artigo 77 da Convenção das Nações Unidas sobre contratos de compra e venda de mercadorias que estabelece que “a parte que invoca a quebra do contrato, deve tomar as medidas razoáveis levando em consideração as circunstâncias, para limitar a perda, nela compreendido o prejuízo resultante da quebra. Se ela negligencia em tomar tais medidas, a parte faltosa pode pedir a redução das perdas e danos, em proporção igual ao montante da perda que poderia ter sido diminuída”.
O Juízo da 18ª Vara do Trabalho de Goiânia condenou a empresa de coleta de lixo a indenizar o coletor de lixo em danos morais e materiais decorrentes de doença ocupacional equiparada a acidente do trabalho. Desta decisão, a empresa e o trabalhador interpuseram recurso ordinário para questionar a condenação.
Ao iniciar seu voto, o desembargador Geraldo Nascimento, relator dos recursos, destacou a existência de normas de responsabilização civil previstas nos artigos 186,187 e 927 do Código Civil de 2002. Tais dispositivos, afirmou o relator, estabelecem que aquele que, por ação ou omissão voluntária, por negligência ou imprudência, violar o direito e causar dano a outrem, ainda que moral ou exceder o exercício de seus direitos seja por finalidade econômica, social, boa-fé ou pelos bons costumes ficará obrigado a reparar os danos causados.
Após, Nascimento salientou a previsão constitucional contida no inciso XXVIII do artigo 7º da Constituição da República que assegura aos trabalhadores a responsabilidade subjetiva do empregador, caso o empregado se acidente por dolo ou culpa por parte da empresa. Assim, o desembargador salientou que os recursos seriam analisados com o enfoque da teoria da responsabilidade subjetiva do empregador. Para ele, não se pode transformar a tutela jurisdicional trabalhista numa forma de favorecimento dos que apenas buscam obter benefícios econômicos.
De acordo com o relator, a análise dos recursos deveria ser feita pelo nexo de causalidade entre a execução do contrato de emprego e a moléstia, além do comportamento doloso ou culposo da empregadora, contributivo, direta ou indiretamente, para a eclosão da doença laboral. “Nos termos do inciso I, art. 20, da Lei nº 8.213/91, a doença profissional é aquela produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social. Note-se que a citada norma exige que o trabalho haja contribuído diretamente para redução ou perda da capacidade laboral do empregado, para caracterizar a doença ou acidente de trabalho”, considerou o relator.
Geraldo Nascimento analisou, também, a perícia juntada aos autos. Neste documento, o médico perito confirmou a doença alegada pelo autor, que teria lombalgia crônica. O relator, antes de expressar seu convencimento jurídico sobre a perícia, afirmou que o magistrado ao apreciar a ação não está vinculado ao laudo pericial, de acordo com o artigo 479 do Código de Processo Civil (CPC/15).
O desembargador discordou da conclusão do perito, mesmo sendo a lesão na coluna incontestável. Para ele, não há como inferir que a doença decorreu do trabalho exercido na empresa-ré. “Trata-se de lesão comum que, inclusive, pode ser decorrente de atos cotidianos”, afirmou o relator, que em razão das inúmeras análises periciais submetidas a instância revisora (2º grau) percebeu que a lombalgia se manifestaria independentemente das atividades que o trabalhador estivesse desenvolvendo. “O autor, em qualquer atividade que se disponha a fazer, poderá ter reincidências das crises de dores, não sendo possível atribuir a cada novo empregador a responsabilidade pelas patologias das quais ele é portador”, considerou o desembargador.
Geraldo Nascimento salientou que o empregado tinha conhecimento de seu estado de saúde desde julho de 2015 e, apenas em agosto de 2016, teria comunicado a seu empregador a doença ao prestar depoimento em processo administrativo interno para apuração de falta grave. “Ou seja, o demandante deixou transcorrer mais de um ano para comunicar a empresa sobre a existência da moléstia que o acometia e para informá-la sobre a alteração de função recomendada pelo médico particular”, expôs o relator. Com essa conduta, prosseguiu o desembargador, o empregado teria violado o princípio da boa-fé objetiva ao não comunicar ao empregador sua doença, como forma de minimizar seu próprio prejuízo.
Para o relator, incide nos recursos analisados, com base na teoria do diálogo das fontes, o instituto “duty to mitigate the loss” em que a parte a que a perda aproveita não pode permanecer deliberadamente inerte diante do dano. Ele destacou a existência nos autos de infringência dos deveres de cooperação e de lealdade entre as partes. Com essas considerações, o relator entendeu que o surgimento da moléstia ocorreu no curso do contrato do trabalho, inexistindo culpa patronal e que o empregado foi negligente quanto ao tratamento de sua moléstia, havendo neste momento a ruptura do nexo (con)causal. Assim, ele deu provimento ao recurso da empresa para afastar a condenação por danos morais e materiais e negou provimento ao recurso do coletor de lixo. Fonte: TRT-GP
Processo 0010633-97.2017.5.18.0018