Tarja Preta: prefeito de Mozarlândia e mais 14 são denunciados por crimes apurados na investigação

O Ministério Público de Goiás ofereceu denúncia criminal no dia 20 contra o prefeito de Mozarlândia, João Soares de Oliveira, e outras 14 pessoas por crimes apurados nas investigações da Operação Tarja Preta. Deflagrada em outubro de 2013, a ação desmontou um esquema de venda fraudada e superfaturada de medicamentos e equipamentos hospitalares e odontológicos para prefeituras goianas.

Os fatos apresentados na denúncia foram apurados em um inquérito específico, desmembrado da investigação principal, que deu origem a 19 procedimentos investigativos. A peça acusatória foi encaminhada à Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Goiás, onde tramitam os processos que envolvem chefes de Executivos municipais.

A denúncia oferecida no TJGO, por envolver prefeito, é assinada pelo procurador-geral de Justiça, Lauro Machado Nogueira; o promotor designado para a Procuradoria de Justiça Especializada em Crimes Praticados por Prefeitos, Marcelo André de Azevedo, além dos membros do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), Luís Guilherme Martinhão Gimenes, Mário Henrique Cardoso Caixeta, Walter Tiyozo Linzmayer Otsuka e Juan Borges de Abreu.

Os crimes
Além de João Soares de Oliveira, são relacionados na denúncia, entre os agentes públicos, a secretária de Saúde do município, Maria José Matias Pereira, e os servidores municipais Thiago Lorena Reis, Fábio Borges Arruda e Vildenan Rezende Bezerra. Em relação ao gestor, é imputada pelo MP a prática dos crimes de corrupção passiva (artigo 317, parágrafo 1º, do Código Penal), dispensa irregular de licitação e inexigibilidade indevida de licitação (artigo 89, “caput”, da Lei nº 8.666/1993). Já a secretária e os servidores são acusados de dispensa irregular de licitação.

Entre os empresários, a denúncia abrange Edilberto César Borges, administrador e sócio oculto das empresas J. Médica e Pró-Hospital; a sócia da J. Médica, Jaciara Borges, e os filhos desse casal, Mariana Borges Garcia Reis e Edilberto César Júnior, sócios da Pró-Hospital.

Ligados à J. Médica, os vendedores Milton Machado Maia e Fernanda Cristina Dias Sousa foram incluídos na peça acusatória como beneficiário do crime de dispensa irregular de licitação (artigo 89 da Lei nº 8.666/1993). Esse mesmo delito é atribuído a Edilberto Borges, que, contudo, também está sendo acusado de corrupção ativa, bem como seu filho, Edilberto Júnior. Já sua mulher e a filha foram denunciadas pela participação na dispensa indevida de licitação.

A peça acusatória do MP aponta ainda a participação do empresário Vanderlei José Barbosa, sócio da Ideal Hospitalar, e do representante de vendas dessa empresa, Domingos Amorim da Silva. As acusações contra eles são também de terem se beneficiado da dispensa irregular de licitação (artigo 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/1993).

Como colaboradores do esquema criminoso, a denúncia cita ainda o advogado Tomaz Edilson Felice Chayb e Mariana Pereira de Sá, do escritório Chayb & Máximo Advogados Associados, que prestaram assessoria jurídica para viabilização das dispensas indevidas de licitação. O próprio escritório, conforme o MP, foi igualmente contratado sem licitação, por meio de inexigibilidade indevida. Aos dois foi imputada justamente a conduta de se beneficiar das irregularidades.

O esquema
A Tarja Preta desmontou uma organização criminosa que atuava tanto no pagamento de vantagem indevida a agentes políticos em troca de futura contratações com a administração pública, quanto na simulação de licitação e dispensas indevidas de licitações para compra de medicamentos, materiais hospitalares e odontológicos. Esses produtos eram superfaturados e, em alguns casos, sequer entregues. O crime de organização criminosa e formação de quadrilha foi objeto de denúncia em autos separados.

Conforme essa denúncia específica, a forma de atuação da organização foi praticamente a mesma em todos os municípios investigados, com o aliciamento de agentes públicos, como prefeitos e secretários e candidatos a cargos eletivos em 2012, com o pagamento a estes de vantagem indevida, antes e depois da posse no cargo, a pretexto de condicionar a preferência ou exclusividade no futuro fornecimento de medicamentos e produtos hospitalares ao município. Posteriormente, eram simuladas as licitações e sua dispensa, para dar aparência de legalidade.

Em Mozarlândia
Em Mozarlândia, a associação criminosa atuou na contratação irregular das empresas Ideal Hospitalar, Pró-Hospital e J. Médica para fornecimento de medicamentos e insumos hospitalares sem licitação e sem que houvesse procedimento regular de dispensa do certame. Foi adotada também no município a prática dos chamados “vales”, que também foi registrada em outras cidades.

Por meio desses “vales”, compras de medicamentos e insumos hospitalares foram realizadas sem qualquer tipo de procedimento licitatório ou de dispensa. Tratavam-se de compras diretas, a prazo, sem que houvesse, minimamente, um contrato escrito. Para viabilizar o pagamento, depois da compra já feita, simulava-se uma licitação ou dispensa, com a emissão posterior dos documentos necessários para que a administração pudesse realizar a quitação. O embasamento dessa conduta estava numa interpretação abusiva e ilícita de uma orientação do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM).

Diálogos captados mediante interceptação das comunicações telefônicas e mensagens veiculadas por e-mail detalharam como funcionava o esquema criminoso, com o ajuste entre o prefeito e os sócios e representantes das empresas para o direcionamento fraudulento das aquisições de medicamentos e insumos hospitalares.

Para que isso fosse possível, relata a peça acusatória, a organização criminosa contou com o auxílio efetivo do advogado Tomaz Edilson Felice Chayb, que, além de ter sido contratado para a prestação de assessoria jurídica ao município de Mozarlândia, também viabilizou as fraudes nas compras dos produtos.

Conforme a denúncia, para beneficiar as empresas envolvidas, o gestor municipal recebeu vantagem indevida paga por Edilberto Borges, com apoio do filho, Edilberto Júnior. Esse pagamento foi feito a título de auxílio para a campanha eleitoral do então candidato João Soares. Os valores foram repassados por meio de cheques, quitados em 2013 (já no mandato do prefeito), que totalizaram R$ 30 mil.

A denúncia do MP é instruída com os elementos de prova coletados durante a operação, como, por exemplo, depoimentos dos investigados, cópias de anotações e documentos apreendidos, fotografias, transcrição de escutas telefônicas e informações coletadas a partir de quebras do sigilo bancário. Diante do conteúdo sigiloso de algumas provas, o processo tramita em segredo de justiça.

Desmembramento
Os membros do MP também requereram à Justiça, em uma manifestação anexa à denúncia (cota), o desmembramento do processo relativo ao caso de Perolândia, para manter em andamento no TJGO apenas os autos em relação ao prefeito, remetendo-se todo o restante (as acusações contra os demais denunciados) para o juízo de primeiro grau, na comarca de Mozarlândia. A intenção é garantir maior celeridade processual, tendo em vista o grande número de denunciados. Fonte: MP-GO