Integrantes da Comissão de Direito Sindical da seccional goiana da Ordem dos Advogados do Brasil leram, durante a sessão do Conselho Seccional realizada na noite desta quarta-feira (5), o teor de uma nota em que criticam as ações propostas na Justiça pela própria OAB-GO para que os bancos públicos atendessem os advogados nas agências filiadas ao Judiciário durante a greve dos bancários, que completa hoje 31 dias. O objetivo é que o Conselho Seccional consentisse com a publicação do documento como Nota de Repúdio, o que não foi autorizado pelo conselheiros.
A leitura da nota pela Comissão não foi novidade para boa parte dos advogados presentes na sessão do Conselho Seccional. Isso porque, ontem, ao longo de todo o dia, o teor do documento circulou pelas redes sociais e pode ser lida abaixo.
Além da não autorização, o corregedor-adjunto José Carlos Ribeiro Issy e outros conselheiros seccionais presentes ontem deliberaram pelo envio de expediente ao corregedor-geral, Roberto Serra, solicitando a abertura de sindicância para apurar os responsáveis pela nota de repúdio e pela sua divulgação sem a autorização devida .
Eles entenderam que a comissão extrapolou limites de sua competência, denotando afronta ao ato da diretora que foi autorizada pelo Conselho Seccional a propor as ações na Justiça. Para o corregedor-adjunto e conselheiros, a conduta dos integrantes da Comissão Sindical fere o que preceitua o artigo 62, do Regimento Interno da OAB-GO, que prevê às comissões caráter de assossoramento e auxílio, não lhes cabendo, salvo melhor juízo, autonomia para emitir nota de repúdio sem autorização do Conselho Seccional e da Diretoria.
Motivos
Para a Comissão Sindical, que garante não ter sido ouvida pela seccional antes da propositura dos processos, as ações propostas na Justiça pela OAB contribuem para o enfraquecimento do movimento grevista, que eles consideram ser legal. Apesar de entender que a OAB tem mesmo de atuar em defesa dos advogados, a Comissão entende que “esta defesa não pode inarredar o compromisso que a OAB tem com a construção e o fortalecimento do Estado Democrático de Direito”.
Leia a íntegra da nota:
Ofício n˚ 001/2016 Goiânia-GO, __05__ de setembro de 2016
Senhor Presidente:
A Comissão de Direito Sindical da OAB-GO, em reunião ordinária, realizada aos 15 de setembro do corrente ano, na sala de sessão da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção de Goiás, decidiu, por unanimidade de seus membros, aprovar NOTA DE REPÚDIO ao protocolo das ações cíveis públicas ajuizadas por esta prestigiosa seccional.
Ao entendimento dos membros que compõem a destacada Comissão, a medida judicial, tomada por V. Exª, consubstanciada na epigrafada ACP, mesmo que não tenha a intenção, afronta o quarto fundamento da República Federativa do Brasil, que é o dos valores sociais do trabalho, consoante o que preconizam o Art. 1º, inciso IV, 170, caput, e 193, da Constituição Federal (CF), por caracterizar-se como o seu reverso, ou seja, representar o seu desvalor, posto que contribui, decisivamente, para o enfraquecimento do movimento grevista dos bancários, convocado e promovido com a estrita observância do Art. 9º, da CF, e, até mesmo, da restritiva Lei N. 7783/1989.
A comentada medida, Senhor Presidente, ainda ao entendimento da Comissão Sindical, não dignifica a OAB; e, o que é pior, macula a sua história, de intransigente defesa do Estado Democrático de Direito, desde a sua criação, em 1930. Ao longo dos seus oitenta e seis anos, a OAB sempre esteve à frente, como protagonista, de todas as batalhas que se travaram pela construção democrática. A OAB goiana sempre foi destaque nessa luta, destacaram-se na história o Presidente Rômulo Gonçalves, perseguido por impetrar HC contra prisão com base no AI5 e Wanderley de Medeiros, cujo STF o ameaçou de enquadrá-lo nos rigores da então Lei de Segurança Nacional.
A Comissão de Direito Sindical compreende a natureza da OAB e o seu papel na defesa intransigente das prerrogativas dos advogados, onde, muitas vezes, tem de apelar pelo caráter corporativo da profissão e é sabedora da dificuldade dos advogados com o fechamento das agências bancárias em todo país, contudo, entende que esta defesa não pode inarredar o compromisso que a OAB tem com a construção e o fortalecimento do Estado Democrático de Direito, como, aliás, expressamente determina o artigo 133 da Constituição Federal.
A Comissão enxerga com enorme preocupação a adoção de medidas injustas contra a parte trabalhadora, ao mesmo tempo, que tem tido a nossa Ordem absoluto silêncio pela persistente e crescente prática antissindical dos bancos, elas são muitas e os trabalhadores dos bancos não contaram com nenhuma medida judicial para coibi-las, preferiram impedir, mesmo que indiretamente, o exercício legal do direito à greve.
Por outro lado, o atendimento exclusivo ao advogado para levantar alvará, data venia as liminares concedidas, ao nosso entendimento, não constitui serviço essencial relacionado na Lei 7.783/1989, sendo que essas questões deveriam ser o Tribunal competente em Dissídio de Greve ajuizado pelas partes, visto que compete aos trabalhadores, segundo essa mesma lei, de decidirem sobre a sua oportunidade e o interesse a quem deve defender.
A pressão da OAB-GO, ainda que por meios legítimos e legais, é indevida e inoportuna. A Comissão de Direito Sindical da OAB-GO condena o uso de medidas que visam pressionar a classe trabalhadora e que esse modus operandi pode gerar desequilíbrio de forças, pois, na outra ponta, estão os bancos, cuja classe, em minoria, está no topo da classe capitalista, sendo a greve, o único instrumento dos trabalhadores do banco legítimo e capaz de pressionar o seu empregador a atender as suas legítimas reivindicações.
Outrossim, Senhor Presidente, sentimo-nos compelidos a perguntar-lhe qual é a razão de ser da Comissão Sindical, posto que ela não é chamada a discutir e a manifestar-se sobre os conflitos que se materializam nas relações de trabalho, como é o caso sob discussão?
Frise-se, Senhor Presidente, que a nossa Comissão não mereceu nem um simples comunicado sobre a medida ora contestada.
Por derradeiro e por ser oportuno, esclarecemos-lhe que o presente registro, longe de questionar a legitimidade de V. Exª, visa a concitá-lo a abrir o debate, para que possamos, enquanto Comissão de Direito Sindical, participar de forma ampla e intensa, sobre todas as matérias que são afetas à OAB nesse campo, pois é assim que vamos fortifica-la e proporcionar-lhe plenas condições para continuar a ser farol da cidadania.
Atenciosamente,