Recuperação judicial: Projeto de Lei 03/1004 altera a Lei 11.1010/2005

Igor Billalba Carvalho*

Muito se tem falado no meio jurídico sobre o Projeto de Lei 03/2024, apresentado pelo Poder Executivo em 10 de janeiro de 2024, o qual tramitou em caráter de urgência na Câmara dos Deputados e que agora será encaminhado ao Senado Federal para deliberação e eventual aprovação. Neste período, foram apresentados 13 substitutivos à proposta e realizadas inúmeras emendas, sendo, então, aprovado o substitutivo apresentado pela deputada Dani Cunha, cujo texto foi aprovado pela Câmara dos Deputados na data de 26 de março passado.

Dentre algumas alterações que implicarão diretamente na Recuperação Judicial, principalmente na Administração Judicial da Recuperação Judicial, a maior parte do Projeto de Lei visa o alinhamento do procedimento falimentar dando, em tese, mais celeridade ao dito procedimento que, não raras vezes, é extremamente lento e moroso.

Especificamente com relação a Recuperação Judicial, a mudança de maior impacto diz respeito a Administração Judicial que, se definitivamente aprovado o projeto, passará ter as seguintes regras:

  • Determinação de um mandato de três anos para o Administrador Judicial, ou seja, o Administrador Judicial nomeado não permanecerá até o fim do procedimento na Administração da Recuperação Judicial, permanecendo pelo prazo de três anos a frente do processo, caso o referido procedimento supere este prazo. Claro que teremos uma regra de transição para empresas que já se encontrem em Recuperação Judicial, prevendo o Projeto de Lei que o juiz responsável deverá confirmar ou substituir o Administrador atual, que terá mandato de três anos a partir de referida decisão. Assim, tendo o processo duração superior a três anos, necessariamente, o Juiz Responsável por referido procedimento, deverá substituir o Administrador Judicial antes nomeado.
  • O Administrador Judicial não poderá assumir mais de um processo com dívidas superiores a 100 mil salários-mínimos em até dois anos do término de seu mandato anterior perante o mesmo Juízo, exceto se o Administrador concluir seu trabalho em até três anos.
  • O Administrador Judicial, no caso de convolação da Recuperação Judicial em falência, não poderá continuar na condução do processo falimentar, devendo ser substituído pelo juiz responsável.
  • A remuneração dos Administradores que atualmente se encontra com um limite máximo de 5% dos créditos sujeitos ao procedimento recuperacional, caso o texto seja aprovado, terão os seguintes parâmetros:
  • 2% dos créditos sujeitos ao procedimento recuperacional, caso os valores sejam acima de 400 mil salários-mínimos;
  • 3% dos créditos sujeitos ao procedimento recuperacional, caso os valores sejam acima de 100 mil salários-mínimos até 400 mil salários-mínimos;
  • 4% dos créditos sujeitos ao procedimento recuperacional, caso os valores sejam acima de 50 mil salários-mínimos até 100 mil salários-mínimos e;
  • 5% dos créditos sujeitos ao procedimento recuperacional, caso os valores sejam abaixo de 50 mil salários-mínimos;

Estes percentuais deverão respeitar um teto máximo de remuneração da Administração Judicial de 10 mil salários-mínimos, incluindo eventuais substituições de administradores e todo pessoal de apoio da administração judicial como peritos, contadores, avaliadores, etc.

No caso de administrador judicial pessoa física, o limite da remuneração mensal paga será a do funcionalismo federal que atualmente se encontra em 44 mil reais.

Por fim, o administrador judicial que não tiver suas contas aprovadas não terá direito a remuneração.

Também, para a Recuperação Judicial, há previsão de mudança de cinco para dois anos o intervalo mínimo entre dois pedidos de recuperação judicial de uma mesma empresa, sendo que, ainda, o prazo poderá ser dispensado se todos os credores sujeitos ao plano de soerguimento anterior houverem sido pagos.

No caso de novo procedimento recuperacional, o projeto de lei proíbe a inclusão dos créditos inclusos na recuperação judicial anterior.

Estas são as principais mudanças trazidas pelo Projeto de Lei 03/2024 para o Procedimento Recuperacional.

No caso do procedimento falimentar, as mudanças foram inúmeras, como:

a) Créditos apurados pela justiça trabalhista terão seu pedido de pagamento exclusivamente processados no juízo falimentar, não podendo a Justiça do Trabalho executar qualquer ato de expropriação de bens do falido.

Uma observação. Nosso entendimento é de que esta mudança deveria também ser aplicada ao procedimento Recuperacional pois, nos termos do artigo 47 da Lei 11.101/2005, o procedimento recuperacional visa o soerguimento da empresa, o restabelecimento de sua função social e o estímulo à atividade econômica. Assim, nada mais certo que o Juiz Responsável pela Recuperação Judicial ser o único competente para analisar pedidos de expropriação de bens do devedor.

b) O limite de crédito a ser pago na classe trabalhista, pelo projeto de lei, é aumentado de 150 para 200 salários-mínimos;

c) Os débitos fiscais do falido deverão ser informados no procedimento falimentar, já constando o maior desconto possível para pagamento;

d) Nomeação pela Assembleia Geral de um GESTOR FIDUCIÁRIO que será o responsável por elaborar o plano de falência e realizar a venda do ativo da massa falida para satisfazer as despesas do processo falimentar e pagar os credores, conforme preferência de recebimento.

e) Com relação ao Gestor da Falência, as regras são as mesmas previstas para o Administrador Judicial da Recuperação Judicial.

f) Credores que representem no mínimo 10% dos créditos da massa falida poderão se opor ao plano de falência.

g) A classe de créditos que não tiver expectativa de recebimento não terá direito a voto em Assembleia;

h) O falido não terá qualquer ingerência na empresa, nos bens da massa falida ou no plano de pagamento dos credores;

i) Previsão de um representante da Fazenda Pública no comitê de credores, caso este seja nomeado;

j) Modificação de quórum de aprovação das deliberações de Assembleia;

k) Isenção de Imposto de renda no caso de liquidação judicial, extrajudicial e falência sobre o lucro havido com a venda de bens e direitos do ativo da empresa falida.

l) Proibição de extensão da falência a outras empresas do grupo ou a extensão das responsabilidades pelas dívidas a pessoas que não tenham dado causa a dívida.

m) Utilização de precatórios entre outros.

Estas são as principais mudanças trazidas pelo Projeto de Lei 03/2024 que, agora, passa a tramitar no Senado Federal.

São mudanças em pontos específicos que visam a auxiliar tanto o procedimento recuperacional como o procedimento falimentar.

De toda forma, caso não aplicadas com bastante cuidado poderão dificultar todo o procedimento, principalmente o procedimento recuperacional da empresa, haja vista que, por exemplo, a substituição ou alteração do Administrador Judicial que já conheça o procedimento e o funcionamento da empresa, no meio do processo de soerguimento, poderá causar embaraço a atividade da própria empresa e, ao invés de beneficiar o processo, vir a ser o causador de eventual piora nas condições de soerguimento da empresa sujeita ao procedimento recuperacional.

Assim, os Juízes responsáveis pelo procedimento recuperacional deverão ter cautela na aplicação e modificação dos responsáveis pelo procedimento.

Entretanto temos certo que o procedimento recuperacional deve ser adequado às novas diretrizes societárias não esquecendo de sua função que é manter a função social da empresa e a geração de empregos e riquezas. 

*Igor Billalba Carvalho é sócio do Escritório Billalba Carvalho Sociedade de Advogados.  Especialista em Direito Empresarial e Recuperação de Empresas.