É crime ter empresas em paraísos fiscais?

Advogado-Giuliano-MiottoCom a recente divulgação dos famosos “Panama Pappers”, onde consta que um famoso escritório abriu milhares de empresas Offshore para empresários, políticos, ministros, artistas e outros, surge uma importante questão que precisa ser abordada de forma bastante equilibrada e sem apego a certos conceitos arraigados no imaginário popular de que o planejamento societário e fiscal, o lucro e a riqueza são males a serem combatidos.

Primeiramente é necessário definirmos uma empresa Offshore, que nada mais é do que uma pessoa jurídica que opera fora dos limites territoriais de onde está localizado seu controlador. Essa é uma definição simples e limitada, mas é preciso entender que não existe uma forma jurídica determinada para o estabelecimento de uma empresa Offshore, a qual pode ser constituída conforme as regras de cada jurisdição onde se encontra sua sede e se amoldar às necessidades e peculiaridades de cada caso específico, sendo que sua principal finalidade é servir aos seus sócios e empresas e até exercer controle sobre outras empresas dentro e fora de sua jurisdição.

Infelizmente, dado o mau uso e as constantes notícias na imprensa de abusos cometidos por políticos e empresários, ao se utilizarem desse importante instrumento de planejamento fiscal, sucessório e até para questões de estratégias comerciais, as Offshores têm se tornado quase como um opróbrio na mente das pessoas. Sendo comum que empresários e investidores que fazem bom uso deste instrumento tenham que se manter sempre na defensiva, como se isso fosse algo ilegal ou imoral.

Na verdade, ter uma empresa Offshore é perfeitamente legal e admitido pelo ordenamento jurídico brasileiro e internacional, tem o mesmo efeito de se abrir uma empresa aqui no Brasil, com a simples diferença de que uma Offshore pode adotar formas jurídicas que hoje não são permitidas na nossa jurisdição e também pelo fato de que essa empresa pode vir a ser constituída em um País com tributação zero ou mais favorável, como é o caso do Panamá. É muito comum empresas como a Vale se utilizaram desse instrumento para efetuarem pagamentos a fornecedores no exterior ou, até mesmo, para se proteger informações comerciais valiosas no momento de se efetuar uma operação internacional.

Outro ponto a ser considerado é que não se deve demonizar ou criminalizar qualquer pessoa que decida constituir uma Offshore, mas sim deve-se tratar de forma rígida e nos termos da lei, aqueles que decidem fazer um mau uso desse mecanismo. E isso deve ser feito com a mesma medida que se combate crimes e desvios cometidos por pessoas que se utilizam de empresas no Brasil. Ou seja, não é ter uma Offshore que é ilegal, mas pode ser ilegal ou imoral aquilo que as pessoas venham a fazer com essa empresa. Por exemplo, um politico que constitui uma empresa em um paraíso fiscal apenas para receber propinas e fugir da justiça e fisco brasileiros, não está cometendo um crime ao abrir esta Offshore em si, mas em não a declarar e ainda a utilizar para o recebimento de dinheiro de corrupção e outros que venha a cometer.

Diante disso, é necessário bastante equilíbrio na abordagem do tema, pois tenho visto pessoas divulgarem informações do tipo, fulano de tal está na lista de pessoas que abriram empresa no Panamá, dando a entender que o simples fato da pessoa constar na lista de detentores de uma Offshore a torna um tipo de criminoso ou a desqualifica moralmente. Como é o caso do ex-ministro Joaquim Barbosa e do cantor Roberto Carlos, dentre vários outros. É claro que se estas pessoas tiverem cometido algum ilícito no uso deste instrumento jurídico, isso sim, pode vir a ser denunciado. Mas criminalizar a simples ação de se constituir uma empresa Offshore não é algo que nos parece correto e não condiz com a realidade dos fatos que envolvem a questão.

*Giuliano F. Miotto é advogado, consultor patrimonial e presidente do Instituto Liberdade e Justiça