Contribuição condominial em empreendimentos para habitação de interesse social

*Vinícius Silva Lima 

Todos têm direito à moradia. Tal direito está previsto na Declaração Universal dos Direitos Humanos, artigo 25[1], sendo posteriormente consolidado como direito fundamental presente na Constituição Federal do Brasil em seu artigo 6º[2].

A Constituição prevê ainda no artigo 23, inciso IX[3] que compete tanto à União quanto aos Estados, Distrito Federal e Municípios promover programas de construção de moradias e melhoria das condições habitacionais.Cumprindo, ou tentando cumprir, a competência destinada pela Constituição Federal, os entes da federação, alguns antes mesmo da criação do programa acima, também constituíram mecanismos de políticas no intuito de promover a moradia.

O Governo Federal, em 08.07.2009 publicou a Lei nº 11.977/09 que dispõe sobre o Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV, cuja finalidade está disposta no artigo 1º[4]. Referido programa foi criado a partir do incentivo do governo para atendimento à população de baixa renda, com intuito de garantir acesso à moradia digna.

Em atenção às regras do Minha Casa, Minha Vida, é necessário que haja uma comprovação de renda familiar. O programa atende famílias com renda de até R$9.000,00 (nove mil reais) e, além disso, estabelece faixas de renda em que os subsídios e as taxas de juros se diferenciam. Entre as faixas de rendas, estão incluídas famílias com renda de até R$1.800,00 (um mil e oitocentos reais) cujas condições para integrar o programa também se diferenciam.

Sendo assim, essas famílias devem procurar a prefeitura ou os programas habitacionais específicos para essa situação, realizar cadastro e aguardar o sorteio ou a contemplação do imóvel para que possam então fazer um financiamento na Caixa.

Cumpre esclarecer que em Goiás foi instituída a Agência Goiana de Habitação S/A – Agehab antes mesmo da existência do programa Minha Casa, Minha Vida, sendo ela responsável pela elaboração e implementação das políticas públicas de habitação voltadas para o desenvolvimento urbano com objetivo de promover o acesso universal à moradia digna. Inclusive em seu Estatuto Social, artigo 3º[5], consta descrito como objeto social, entre outros, produzir unidades habitacionais de interesse social.

Em Goiânia foi criado também o sistema Municipal de Habitação de Interesse Social – SMHIS pelo Decreto Municipal nº 514/2007, com o objetivo expressamente previsto:

“Art. 2º O Sistema Municipal de Habitação de Interesse Social – SMHIS, tem como objetivos:

  1. viabilizar para a população de menor renda o acesso à terra urbanizada e à habitação digna e sustentável;
  2. implementar políticas e programas de investimentos e subsídios, promovendo e viabilizando o acesso à habitação voltada à população de menor renda;

III. articular, compatibilizar, acompanhar e apoiar atuação das instituições e órgãos que desempenham funções no setor de habitação.”

Apesar de existirem críticas aos programas, não se pode fechar os olhos para os benefícios criados que possibilitaram, ao longo destes anos, inúmeras famílias a adquirirem sua tão sonhada casa própria.

Segundo definição do Wikipédia: “Empreendimentos habitacionais de interesse social são geralmente de iniciativa pública e têm, como objetivo, reduzir o déficit da oferta de imóveis residenciais de baixo custo dotados de infraestrutura (redes de abastecimento d’água, esgotamento sanitário e energia elétrica) e acessibilidade.”

Neste contexto, nasce então as chamadas unidades habitacionais de interesse social.

Somado a isso, entendemos que unidades habitacionais de interesse social são conjuntos habitacionais destinados à população de baixa renda, qual seja aquela não possui condições de ter acesso à moradia através da forma tradicional disponível no mercado imobiliário.

Assim, com o intuito também de gerar economia e possibilitar moradia para um número maior de famílias, é comum que estas unidades habitacionais sejam construídas sob a forma de condomínios verticais.

Sob a perspectiva acima, em que são criadas moradias exclusivas para famílias de baixa renda, e com o intuito de alcançar cada vez mais famílias optando pela forma do condomínio edilício, é possível cobrar contribuição condominial?

Apesar de as famílias de baixa renda enfrentarem dificuldades demasiadas em sua vida, a resposta para a questão acima é sim, sob pena de enriquecimento injusto.

Os condomínios edilícios, uma vez criados para habitação de cunho social, não se diferenciam dos demais quando se fala em áreas comuns e existência de manutenção. Em grau elevado, disposições de ofertas ou não, todos eles possuem áreas comuns e necessitam de manutenção adequada.

Para proporcionar adequada vida em condomínio, adequada moradia e utilização dos espaços comuns, é necessária gestão do condomínio, sendo certo que não podem os condôminos se afastarem de tal responsabilidade.

É importante destacar que taxa de condomínio é um valor pago mensalmente pelos condôminos, a qual serve para o custeio da manutenção do condomínio. Trata-se de uma contraprestação pelo serviço que é consumido pelos próprios, inexistindo caráter enriquecedor, mas tão somente de rateio de despesas ordinárias e extraordinárias necessárias a, pelo menos, o mínimo existencial do condomínio.

Cada unidade precisa pagar a sua parte da taxa condominial, fazendo assim o rateio dos gastos do condomínio, como: contas de água e energia elétrica; compra de materiais; realização de obras de melhoria e/ou manutenções periódicas nas áreas comuns do condomínio, dentro outros.

O direito social é garantia fundamental, no entanto, apesar de vivermos num tempo no qual a sociedade luta desenfreadamente por direitos, não podemos esquecer que com o direito nascem também deveres.

Com o direito à habitação, nasce também a responsabilidade inerente ao bem adquirido, entre eles, o pagamento da taxa de condomínio para quem assim vive.

Prevendo tentativas de exoneração de obrigação, a lei prevê no artigo 1.315 do Código Civil que: “O condômino é obrigado, na proporção de sua parte, a concorrer para as despesas de conservação ou divisão da coisa, e a suportar os ônus a que estiver sujeita.”

O artigo 1.336 do mesmo Código afirma ainda que são deveres do condômino, entre outros: “I – contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção”.

Diante disso, podemos concluir que a cobrança da taxa de condomínio, mesmo em conjuntos habitacionais construídos com interesse social, tem sua cobrança legitimada pela lei e é obrigatória.

Sendo legal e obrigatória, vindo o condômino se tornar inadimplente, nasce o direito do condomínio, através do síndico, cobrar judicialmente a dívida. Em última análise, pode o condômino ter o seu imóvel penhorado para quitar a dívida, mesmo se tratando de conjuntos habitacionais de interesse social.

Por fim, como alerta, é importante consignar que a cobrança em juízo da taxa condominial prescreve em 5 (cinco) anos, contados do dia seguinte ao vencimento da prestação. Esse é o entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça[6].

*Vinícius Silva Lima é advogado da Jacó Coelho Advogados Associados

[1] Artigo XXV 1. Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar-lhe, e a sua família, saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle.

[2] Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

[3] Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: IX – promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico;

[4] Art. 1o O Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV tem por finalidade criar mecanismos de incentivo à produção e aquisição de novas unidades habitacionais ou requalificação de imóveis urbanos e produção ou reforma de habitações rurais, para famílias com renda mensal de até R$ 4.650,00 (quatro mil, seiscentos e cinquenta reais) e compreende os seguintes subprogramas:

[5] Artigo 3° A AGEHAB tem por objetivo desenvolver e implementar a política habitacional do Estado de Goiás, devendo para isso: I. produzir unidades habitacionais de interesse social, obedecendo aos critérios 3 3 e às normas estabelecidas pela Legislação Federal e Estadual;

[6] AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA DE TAXAS CONDOMINIAIS. PRESCRIÇÃO. PRAZO QUINQUENAL. SÚMULA Nº 568/STJ. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.483.930/DF, sob o rito dos recursos repetitivos, firmou entendimento no sentido de que a pretensão do condomínio geral ou edilício de cobrar em juízo a taxa condominial ordinária ou extraordinária, constante em instrumento público ou particular, prescreve no prazo de 5 (cinco) anos contados do dia seguinte ao vencimento da prestação. Incidência da Súmula nº 568/STJ. 3. Agravo interno não provido. (AgInt no AREsp 887.196/PR, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/02/2019, DJe 21/02/2019)