O fim do regime jurídico único e suas nuances no tocante ao super(hiper) endividamento

André Ricardo de Almeida*

A decisão do Plenário do STF, tomada no último dia 06 de novembro sobre a constitucionalidade da quebra de obrigatoriedade de regimes jurídicos únicos (RJU) e planos de carreira para servidores da administração pública direta, de autarquias e das fundações públicas das três esferas da União, encerrou, de forma negativa, uma contenda que se arrastava há 26 anos.

Sendo uma decisão polêmica em todas as suas vertentes, tal diapasão traz perspectivas futuras, haja vista se tratar de norma de eficácia limitada, que não está apta a produzir todos os seus efeitos sozinhos, dependendo de complementação por outro ato normativo posterior. Coerentemente, o que se destaca não é um tema, um assunto (“a extinção do Regime Jurídico Único”); mas um texto, uma porção de uma proposição legislativa e que “não se exaure na simples normatização, porquanto compreende – coerentemente – o momento aplicativo das próprias normas, incluídas as escolhas pertinentes à concreta adoção das medidas apropriadas a assegurar sua observância” no caso concreto a ser dirimido num futuro próximo.

Segundo o que se vislumbrou até agora no arcabouço jurídico (pareceres, notícias, artigos, etc), temos que nos ater nesse primeiro momento às questões que são, a meu ver, primordiais e essenciais para o deslinde hermenêutico jurídico do tema, haja vista a sua repercussão geral, qual seja: a decisão poderá impactar a gestão de pessoas no serviço público, envolvendo desde a estabilidade até o regime de contratação temporária? E a questão que envolve o superendividamento do servidor público, poderá ser afetado?

Importante salientar e mencionar que o atual presidente do STF, Luís Roberto Barroso, ao proferir seu voto, criticou o RJU, argumentando que “o modelo único já não atende adequadamente às demandas do serviço público moderno, manifestando apoio à flexibilização”.

Sob esse manto da chamada “modernização”, a qual, nos atuais liames constitucionais, entendo como necessária e viável, desde que não nos abstermos de incluir as reformas da previdência nesse contexto, que mudaram, na prática, as formas de relações de trabalho em todas as esferas do Estado brasileiro.

Entende-se que tais repercussões oriundas de tai decisão possam e vão de encontro com o impacto concernente aos direitos trabalhistas, previdenciários, assim como aos efeitos na prestação de serviços públicos à sociedade, o que via de regra é apenas a “ponta do iceberg” da discussão jurídica sobre o tema.

Preocupa-me de forma futura a possibilidade da contratação de servidores em funções semelhantes com direitos completamente diferentes. Segue esse raciocínio, a manifestação da ministra do STF, Carmen Lúcia Antunes Rocha, que salientou o seguinte: “o que a norma constitucional contida no art. 39, em sua versão originária, veio trazer ao sistema foi a superação daquele estado administrativo caótico e a obrigatoriedade de um tratamento unívoco para o servidor de cada entidade, a fim de que o tratamento desigual para aqueles em condição de identidade não pudesse ocorrer e gerar situações de injustiça, insegurança e comprometimento da própria qualidade do serviço e atendimento da demanda social.” (ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. Princípios Constitucionais dos servidores públicos. São Paulo: 199, p. 113).

Nesse contexto, cinge-se primordial fazer um paralelo entre a mencionada decisão da Corte Superior e o superendividamento. Relativamente à discussão em voga, certo é que tal perspectiva acerca das consequências da decisão retro mencionada afetará não apenas as finanças do servidor, mas também sua qualidade de vida.

O estresse financeiro causado pela incapacidade de pagar as dívidas pode levar a problemas de saúde mental, como ansiedade e depressão, além de afetar o desempenho no trabalho. O impacto na família também é significativo, pois o endividamento pode comprometer o bem-estar dos dependentes do servidor.

O superendividamento entre os funcionários públicos é um problema crescente, que requer atenção e medidas eficazes. A Lei do Superendividamento representa uma oportunidade para que esses servidores possam renegociar suas dívidas e recuperar sua saúde financeira, sem comprometer seu bem-estar.

No entanto, é imprescindível que cada servidor assuma a responsabilidade pelo planejamento e controle de suas finanças, buscando sempre a educação financeira e evitando o uso descontrolado de crédito. Somente assim será possível garantir uma vida financeira equilibrada e sem endividamentos.

Em conclusão, esse novo modelo deverá ser bem estruturado para evitar que a flexibilização leve à precarização. A importância de um planejamento cuidadoso é crucial para que o novo regime não crie uma situação de desigualdade e insegurança para os servidores, mas, ao contrário, contribua para a construção de uma administração pública moderna e focada em resultados.

Resta saber quem irá arcar com essa conta!!! É aguardar!!!

*André Ricardo de Almeida é advogado e doutorando em Direito Constitucional.