Juízes pedem apoio do governo brasileiro para resolver caso de desaparecimento de 43 jovens no México

O presidente da Rede Ibero-americana de Juízes (Redij), Daniel Urrutia Laubreaux, e o presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), João Ricardo Costa, entregaram hoje (21) ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, uma carta pedindo que a presidente Dilma Rousseff consulte o embaixador brasileiro no México sobre o caso do desaparecimento de 43 estudantes naquele país. A intenção é que o Brasil, assim como outros países latino-americanos, se envolva no caso afim de pressionar as autoridades mexicanas a investigar e punir os responsáveis pelo crime, que aconteceu em setembro, no estado de Ayotzinapa.

Daniel é chileno, atua na área de direitos humanos e está no Brasil participando do Seminário República – Impasses da Democracia Brasileira, promovido pela AMB. O juiz compartilhou sua experiência na defesa da independência dos juízes na América Latina.

Confira abaixo entrevista com o magistrado.

O desaparecimento dos 43 estudantes mexicanos ainda não está completamente elucidado. O que se sabe do caso?

Sabemos que a polícia local abriu fogo contra alunos de uma escola de Ayotzinapa, por ordem do prefeito. Seis jovens morreram e 43 estão desaparecidos. Há indícios de que a Policia Federal também tenha participado do massacre, mas não atuando diretamente. O governo mexicano diz que este não é um crime de Estado – o que é contestado pelas organizações civis – e deu uma versão oficial de que os jovens desaparecidos haviam sido assassinados e queimados e que seus corpos foram jogados em um rio. Mas o grupo forense argentino, que está ajudando as vítimas, declara que os restos mortais encontrados não são destes estudantes. Então, se mantém a situação de desaparecimento.  Outro fato importante é que, durante as buscas aos jovens, foram descobertas mais de 20 covas clandestinas, com centenas de corpos que ninguém reclamou até agora. Ou seja, são assassinatos políticos e motivados pelo narcotráfico. Isso mostra a decomposição da sociedade mexicana, já que os familiares dessas vítimas nunca manifestaram seus desaparecimentos por medo. Eles sabem que se registrarem e denunciarem os casos à polícia – que está infiltrada no narcotráfico – podem ter o mesmo fim.

Qual é a importância da atuação dos juízes em casos como este? Como os magistrados podem ajudar efetivamente?

No México, estamos enfrentando uma decomposição moral, uma falta absoluta das instituições. Deste ponto de vista, organizações como a AMB e a Rede Ibero-americana de Juízes, têm uma virtude: concentram uma reserva moral, porque são organizações de credibilidade e têm como prerrogativa a preocupação com a sociedade, com os cidadãos. A possibilidade de instituições de alto valor moral e ético atuarem por meio de declarações ou visitas faz com que as vitimas se sintam acompanhadas, assistidas, e, portanto, os ajuda a manter a esperança de que se faça justiça.

Como é a atuação dos juízes da Redij para preservar os direitos humanos?

A Rede Ibero-americana de Juízes atua por meio de visitas a países. Em 2012, por exemplo, João Ricardo Costa e eu fomos ao México e realizamos mais de 34 recomendações, sobretudo por problemas de corrupção e impunidade. Atuam naquele país grupos organizados que permeiam o aparato do Estado. As visitas, as declarações e a confecção de manuais de direitos humanos para magistrados possibilita que eles possam aplicar as normas internacionais de direitos humanos nas legislações nacionais. E o Brasil, em si, tem um peso específico no contexto latino-americano, ressaltando-se a importância da AMB, como a maior organização de juízes do Brasil. Temos a esperança de que as declarações da AMB e sua participação internacional possam equilibrar a balança para uma justiça real no caso do México.

Além deste caso do México, há outros tão relevantes na América Latina, recentemente, de violação dos direitos humanos?

Sim, a Rede, assim como a AMB, tem acompanhado a situação de Honduras. Há denúncias de violação de direitos humanos em função do Golpe de Estado, e assim sucessivamente em outros países da região. As organizações de juízes, por seu alto valor moral, estão em uma situação privilegiada para exigir dos governos que respeitem os direitos humanos a favor das vítimas, que as investigações aconteçam de forma rápida e séria e que os culpados paguem por seus crimes. A Rede Ibero-americana de Juízes está solicitando a todos os governos latino-americanos que consultem seus embaixadores no México, como mecanismo de pressão ao Estado mexicano. Hoje entregamos uma carta ao ministro da Justiça do Brasil, José Eduardo Cardozo, solicitando à presidenta Dilma Rousseff que faça uma consulta ao embaixador brasileiro no México, para que o Brasil se envolva efetivamente no caso.

(Fonte: AMB)