A BRF S.A foi condenada a indenizar a família de um trabalhador que faleceu em decorrência de complicações da Covid-19. O obreiro, de 41 anos de idade, era portador de comorbidade prévia que o enquadrava em grupo de risco (obesidade). Mesmo assim, durante a pandemia, ele teve de retornar ao labor e, menos de um mês após, contraiu o coronavírus e faleceu.
O juiz Túlio Macedo Rosa e Silva, da Vara do trabalho de Goiatuba, em Goiás, arbitrou o valor de R$ R$145.090,00, a título de danos morais, além de pensão à esposa e filhos do trabalhador. O entendeu que a empresa não comprovou que o contágio ocorreu fora do ambiente de trabalho. E que, levando em consideração a função desenvolvida pelo obreiro e a grande circulação de pessoas no local (funcionários, terceirizados e agregados), se presume o nexo de causalidade da doença com a atividade laboral.
O magistrado citou que, de acordo com entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), há necessidade de fixação do nexo causal, cujo ônus probatório pertence, em tese, ao empregado. Admitindo-se exceções de acordo com as previsões legais e admitindo-se, ainda, a responsabilidade civil objetiva, independente de culpa, quando a atividade do empregador apresentar risco de contágio pela doença, nos termos do art. 927, parágrafo único, do Código Civil.
Obesidade mórbida
Segundo esclareceram no pedido os advogados Pedro Henrique Rodrigues da Silva, Luane de Paula Machado Oliveira e Francinaldo Bessa Oliveira, o reclamante possuía obesidade mórbida e enquadrava no grupo de risco. Ressaltaram que ele ficou afastado de suas atividades por 33 dias antes de retornar ao trabalho presencial, mesmo sem ter se vacinado.
Observaram que a obrigação de ter que retornar ao serviço, sendo enquadrado em grupo de risco para a doença, independentemente da natureza da atividade, constitui, por si só, agravamento da possibilidade de contágio. Citaram a adoção pela teoria da responsabilização objetiva e a vulnerabilidade do trabalhado nos ambientes a que se submetia, “tendo contato com várias pessoas, sem ter o distanciamento necessário.”
Em contestação, a empresa afirmou que afastou funcionários que estavam em grupos de risco, seguindo todas as recomendações, orientações e determinações legais. Disse que, no caso em questão, o trabalhador não se enquadrou como obeso e não possuía qualquer doença crônica. Porém, disse que o obreiro foi considerado grupo de risco após retorno de férias, quando ganhou bastante peso, sendo imediatamente afastado. Ponderou que “não é possível se ter certeza do local e momento da contaminação, porquanto não há regras específicas para que esta ocorra”.
Responsabilização objetiva
Em sua sentença, o magistrado destacou, contudo, que a obesidade do reclamante se tornou incontroversa, eis que, além de estar consignada na certidão de óbito, todas as testemunhas ouvidas em juízo relataram tal fato. Disse que, ante o panorama fático, e tendo a reclamada negado ao obreiro, integrante de grupo de risco, a suspensão temporária do contrato de trabalho (Lei nº 14.020/2020), a ré se enquadra nas disposições do parágrafo único do art. 927 do CC, que trata de responsabilização objetiva do empregador.
Ressaltou que a reclamada não adotou todas as medidas desejáveis e necessárias capazes de evitar o contágio do vírus e a preservação da saúde do seu empregado, integrante do grupo de risco. Ainda que cabe à empresa não apenas orientar os trabalhadores por meio de ordens de serviço, mas também o dever de manter o ambiente de trabalho em condições adequadas de segurança. Não sendo tais deveres cumpridos, caracteriza-se a culpa.
Leia aqui a sentença.
ATOrd 0010943-25.2021.5.18.0128