Escravidão contemporânea

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    Escravidão contemporânea

    Em um passado recente proprietários de Fazenda eram os alvos principais do Ministério Público do Trabalho em ações civis públicas por manterem funcionários em condições análogas à escravidão.

    Um caso emblemático foi o julgado pela Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho que condenou o proprietário da Fazenda Triângulo, José Roberto Gomes Mansur (Beto Mansur, deputado federal pelo PRB/SP) ao pagamento de indenização de R$ 200 mil por dano moral coletivo.

    De acordo com o relato feito na reclamação trabalhista além trabalhar em condições precárias, os trabalhadores ficavam alojados em barracões com cobertura de plástico preto e palha, sobre chão batido, sem proteção lateral, em péssimas condições de higiene. Também não havia instalações sanitárias ou fornecimento de água potável.

    A fiscalização migrou do campo para a cidade e empresas que produzem roupas e utilizam imigrantes como mão-de-obra passaram a ser autuadas. A Justiça do Trabalho condenou a Lojas Pernambucanas a pagar uma multa de R$ 2,5 milhões por usar trabalho análogo ao escravo na produção de roupas. A sentença foi dada pelo juiz Marcelo Donizeti Barbosa, da 81ª Vara do Trabalho de São Paulo, em uma ação civil pública movida pelo MPT.

    Foram resgatadas 31 pessoas vindas da Bolívia, do Paraguai e do Peru. Nos dois flagrantes em 2010 e 2011, os trabalhadores estavam submetidos a jornadas de trabalho superior a 14 horas diárias, em oficinas sem higiene e segurança e não eram registrados. Da remuneração era por produção e consistia, entre R$ 0,20 e R$ 0,50 por peça, sendo descontados valores relativos a alimentação e transporte.

    Já a M.Officer foi condenada a pagar R$100 mil de danos morais, além de verbas trabalhistas, a um boliviano que trabalhava em condições análogas à de escravo, em uma oficina de costura contratada pela marca.

    De acordo com a sentença, a M.Officer subcontratou a oficina para dissimular a relação de emprego entre o trabalhador e a empresa, a verdadeira destinatária dos produtos. Para a magistrada Sandra Assali Bertelli, titular da 37ª VT/SP, a escravidão contemporânea não é traduzida pelo aprisionamento, mas por situações que reduzem o trabalhador a condições brutais, indignas, inseguras, humilhantes, retirando-lhe de sua condição humana.

    No local trabalhavam quatro homens e duas mulheres. Todos moravam e costuravam no mesmo ambiente, onde eram submetidos a condições péssimas de higiene e segurança (com fios expostos e acúmulo de botijões de gás), jornadas de 14 horas de trabalho e sendo remunerados de R$4 a R$6 por peça.

    De acordo com o artigo 149 do Código Penal brasileiro, são elementos que caracterizam o trabalho análogo ao de escravo: condições degradantes de trabalho, jornada exaustiva, trabalho forçado e servidão por dívida. Os elementos podem vir juntos ou isoladamente.
    Portanto, a escravidão não é apenas constatada, quando um trabalhador perde sua liberdade, mas quando deixa de ter condições mínimas de dignidade.

    *Ludmilla Rocha Cunha Ribeiro, pós-graduada em Direito Público, Direito e Processo do Trabalho, L.LM em Direito Empresarial pela FVG, Advogada e Gerente Jurídica da Quick Logística.