É inconstitucional o Decreto 10.004, de 5 de setembro de 2019, que instituiu o Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares (Pecim). Este é o entendimento do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) que, na sessão ordinária virtual de quarta-feira (2/6), conduzida pela presidente nacional, Rita Cortez, aprovou com 91% dos votos o parecer elaborado pelos relatores Hariberto de Miranda Jordão Filho e Gabriel Lima Marques, da Comissão de Direito Constitucional. Eles apontaram diversas inconstitucionalidades no decreto. “A educação pública existe para formar cidadãos, e não soldados”, afirmou Hariberto de Miranda Jordão Filho.
Ele tratou dos aspectos históricos e políticos que envolvem o ensino militar brasileiro, enquanto Gabriel Lima Marques fez uma análise jurídico-constitucional do decreto. “O decreto é inconstitucional por violar o princípio da legalidade, desrespeitar o pluralismo de ideias e ofender a exigência de concurso público para ingresso nas estruturas das escolas cívico-militares”, sentenciou Gabriel Lima Marques. Ele explicou que o decreto viola o princípio da legalidade, “porque qualquer método de ensino alternativo à educação escolar deve ser criado por meio de lei, e não de decreto”. O advogado disse também que a iniciativa do governo não se coaduna com os preceitos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).
De acordo com o relator, o pluralismo de ideias é desrespeitado porque “o regime educativo dos colégios militares está voltado exclusivamente para preparar os alunos para a carreira militar, logo, incutindo comportamentos, valores e atitudes típicos do quartel”. Ainda segundo o advogado, é dispensada pelo decreto a exigência de realização de concurso público para atuar nas áreas de gestão educacional, didático-pedagógica e administrativa. “Está previsto no Pecim o aproveitamento de oficiais e praças das polícias militares e dos corpos de bombeiros militares”, ressaltou.
Elitista
Hariberto de Miranda Jordão Filho também classificou o decreto como inconstitucional. Segundo ele, a iniciativa do governo visa a “utilizar a estrutura estatal para conceber um tipo de educação elitista, extensível apenas a uma pequena parcela da população, sendo incompatível com uma gestão democrática de ensino público, como exige a Constituição”. O relator comentou a trajetória histórica do ensino militar: “As escolas militares nunca formaram professores, mas sim mestres nas artes da guerra, pois a Academia Militar das Agulhas Negras, a Aman, por exemplo, forja exclusivamente militares das mais diversas armas e nenhum professor de Ciências Sociais, de Humanidades ou outras matérias não militares”.
Para o relator, há um projeto autoritário por trás da criação das escolas cívico-militares. “O objetivo da criação das escolas, através de um decreto inconstitucional, é formar uma classe militar com a ambição de, amanhã, dominar o país”, alertou. De acordo com Hariberto de Miranda Jordão Filho, “infelizmente, pelo processo das eleições livres e democráticas, uma minoria militar se elegeu pelas falsas notícias, transformou-se em dona da verdade e diz que quer salvar o País, embora esteja matando as instituições constitucionais”.
O parecer será encaminhado às presidências da República, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados e do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB); à Procuradoria-Geral da República (PGR), à Advocacia-Geral da União (AGU) e ao Ministro de Estado da Defesa.