Pedido de inscrição: 1ª Câmara do Conselho Federal da OAB afasta a incidência do “in dubio pro societate”

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No último dia 23, foi publicada no Diário Eletrônico da Ordem dos Advogados do Brasil (DEOAB) a Ementa n. 67/2023/PCA, do Recurso n. 19.0000.2022.000034-3/PCA, da 1ª Câmara do Conselho Federal da OAB, na qual, por maioria, foi afastada a incidência do “in dubio pro societate”. O posicionamento do conselheiro federal de Goiás, Roberto Serra da Silva Maia, foi o vencedor no julgamento.

O processo diz respeito a um recurso interposto pelo presidente da Seccional do Rio de Janeiro (OAB-RJ) contra decisão majoritária do Conselho Pleno da OAB-RJ que deixou de reconhecer a inidoneidade de uma pessoa que havia sido condenada em primeiro grau pela 27ª Vara Criminal da comarca do Rio de Janeiro pelos crimes de Organização Criminosa (Lei 12.850/2013) e Usurpação de Função Pública (art. 328, CP).

Roberto Serra é conselheiro federal por Goiás

A relatora da OAB de Santa Catarina, Maria de Lourdes Bello Zimath, conheceu do recurso e lhe deu provimento para reformar a decisão do Conselho Pleno da Seccional do Rio de Janeiro, e declarar a inidoneidade, impossibilitando a inscrição do recorrido nos quadros da OAB.

De acordo com a relatora, a verificação de inidoneidade moral não está atrelada ao trânsito em julgado de sentença criminal condenatória, e face ao interesse público envolvido no contexto da inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil, há supremacia do princípio “in dubio pro societate”, de modo que havendo “dúvidas ou apuração interna sobre o atendimento dos requisitos para inscrição nos quadros da OAB, deve ser indeferido, visto que é de interesse público que a advocacia não seja exercida de forma temerária”.

O conselheiro federal da OAB-GO Roberto Serra abriu divergência para entender que “a denúncia e a sentença penal condenatória sem o trânsito em julgado não são suficientes, ‘de per si’, para suplantar a presunção de idoneidade, a qual decorre do princípio da presunção de não culpabilidade (ou de inocência), previsto no art. 5º, inciso LVII, da Constituição Federal”.

Para ele, “este princípio constitucional possui primazia no ordenamento jurídico pátrio”, e por isso que “eventual dúvida sobre a integridade profissional ou à imagem da advocacia em decorrência do processo penal, assim como o chamado ‘in dubio pro societate’, não poderão ser considerados pelo órgão julgador em desfavor do recorrido para o reconhecimento da sua inidoneidade moral, uma vez que repelidos pelo modelo constitucional por se revelarem incompatíveis com o art. 5º, inciso LVII, da Constituição Federal”.

A ementa publicada no DEOAB ficou assim redigida:

“RECURSO. INSCRIÇÃO NA OAB. INIDONEIDADE MORAL (ART. 8º, VI, LEI 8.906/1994). CONDENAÇÃO PELO CRIME DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA E USURPAÇÃO DE FUNÇÃO PÚBLICA. INDEPENDÊNCIA DAS INSTÂNCIAS. AUSÊNCIA DE TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA. PRNCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. IN DUBIO PRO SOCIETATE. INAPLICABILIDADE. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO. 1. O simples fato de ter sido o recorrido condenado em primeiro grau na esfera criminal, sem o trânsito em julgado da sentença, pelos crimes de Organização Criminosa (Lei 12.850/2013) e Usurpação de Função Pública (art. 328, CP), não acarreta, de per si, o reconhecimento da inidoneidade moral para efeito do descumprimento do inciso VI do art. 8º da Lei n. 8.906/1994. 2. Em decorrência da independência das instâncias, o juízo administrativo não se vincula ao penal, de modo que somente quando os elementos probatórios produzidos no devido processo legal administrativo forem suficientes para concepção da inidoneidade moral é que a mesma se aperfeiçoa. 3. O chamado in dubio pro societate, lastreado na eventual dúvida sobre a integridade profissional ou à imagem da advocacia decorrente da condenação penal, se revela incompatível com o art. 5º, inciso LVII, da Constituição Federal (princípio da presunção de inocência). 4. A OAB, dentro da capacidade de autotutela que lhe é conferida, tem autoridade para cancelar, posteriormente, a inscrição do profissional que vier a perder qualquer um dos requisitos para a inscrição (art. 11, V, Lei n. 8.906/1994). 5. Recurso conhecido e desprovido para manter a decisão majoritária de origem que afastou a inidoneidade moral do recorrrido, sem prejuízo das responsabilizações eventuais e/ou futuras no caso de trânsito em julgado da sentença penal condenatória.
Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros da Primeira Câmara do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, observado o quorum exigido no art. 92 do Regulamento Geral, por maioria, (17×6), negar provimento ao recurso, nos termos do voto vencedor divergente do Conselheiro Federal Roberto Serra da Silva Maia (GO)”.