Prestação obrigatória e necessária das contas eleitorais

*Danúbio Remy

De acordo com a Lei Federal nº 9.504/1997, a prestação de contas de campanha é exigida de todos os candidatos e partidos políticos que participaram do pleito eleitoral, mesmo que tenham renunciado ao longo do período. Ela deve ser apresentada até 30 dias após a realização das eleições.

O objetivo principal da prestação de contas é atestar a regularidade na arrecadação e aplicação dos recursos de campanha feitas ao longo do período eleitoral, com a finalidade de preservar a transparência das transações financeiras dos candidatos e, impedir que partidos e candidatos se utilizem de fontes de recursos não contabilizados, ação ilícita que ficou conhecida como “Caixa 2”.

No tocante à análise das prestações de contas, a Justiça Eleitoral é responsável por decidir se ela será aprovada, aprovada com ressalvas, desaprovada ou pela não prestação.

Em relação à aprovação das contas, (com ou sem ressalvas) não poderá haver repercussão negativa na esfera do candidato. Já em relação à não prestação de contas, ao candidato que não as apresentar será negada a certidão de quitação eleitoral (comprovante de que está regular perante a Justiça Eleitoral) pelo prazo igual ao do mandato pelo qual concorreu e, ultrapassado esse prazo, até que as contas sejam apresentadas.  Em relação a isso, a questão segue pacífica nos tribunais.

A grande discussão, no entanto, gira em torno da rejeição das contas apresentadas pelos candidatos e da concessão ou não de quitação eleitoral em decorrência disso. Esse tema foi item de frequente discussão pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que vem alterando seu entendimento aos longos dos últimos anos.

Em 2008, o TSE, por meio do art. 41, § 3º3, da Resolução nº 22.715/2008 tinha o entendimento de que a desaprovação das contas de campanha impedia a obtenção da certidão de quitação eleitoral do candidato, que, entre outras finalidades, é necessária para o registro de candidatura.

Em 2009, a Lei Federal nº 12.034/2009 incluiu o § 7º ao art. 11 da Lei das Eleições (Lei Federal nº 9.504/1997), cuja redação é a seguinte:

 Art. 11 […]

  • 7º A certidão de quitação eleitoral abrangerá exclusivamente a plenitude do gozo dos direitos políticos, o regular exercício do voto, o atendimento a convocações da Justiça Eleitoral para auxiliar os trabalhos relativos ao pleito, a inexistência de multas aplicadas, em caráter definitivo, pela Justiça Eleitoral e não remitidas, e a apresentação de contas de campanha eleitoral. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009.)

Em virtude desse novo dispositivo legal, o TSE passou a divergir quanto a esse tema.

Havia um posicionamento no sentido de que a desaprovação das contas continuaria a impedir a obtenção de certidão de quitação eleitoral ao respectivo candidato sob o argumento de que a referida norma deveria ser interpretada à luz dos princípios norteadores do processo eleitoral.

Por outro lado, formou-se um posicionamento contrário, sob a fundamentação de que o legislador havia sido claro quanto a que bastaria a tão só apresentação das contas de campanha para que o candidato estivesse quite com a Justiça Eleitoral.

Em 2010, o art. 26, § 4º4, da Resolução-TSE nº 23.221/2010, trazia que, entre outras hipóteses, a quitação eleitoral deveria abranger a apresentação “regular” de contas de campanha eleitoral. Em virtude dessa expressão “regular”, muito se discutiu se o TSE não estaria extrapolando seu poder regulamentar.

Em outros termos, muito foi especulado se o TSE estaria restringindo a obtenção de certidão de quitação eleitoral pelo candidato de forma a não bastar apenas a apresentação das contas de campanha para sua aquisição, tal como havia sido estabelecido pelo Congresso Nacional, ao incluir o § 7º no art. 11 da Lei das Eleições, acima transcrito.

Diante das várias discussões quanto à expressão “apresentação regular das contas de campanha”, prevista na Resolução-TSE nº 23.221/2010, o que prevaleceu foi o entendimento de que a rejeição das contas de campanha, por si só, não teria o poder de impedir a obtenção da certidão de quitação eleitoral.

Assim, por voto da maioria, o TSE entendeu que o adjetivo “regular” não significava a necessidade de aprovação das contas de campanha, de modo que a desaprovação das contas não impediria a quitação eleitoral do candidato (REspe nº 4423-63/RS, rel. Min. Arnaldo Versiani, em 28.9.2010).

Mesmo após esse entendimento, vários doutrinadores e cortes eleitorais divergem quanto a esse tema: uns se posicionam pela não concessão de quitação eleitoral àqueles candidatos que tiverem suas contas desaprovadas; outros, pela impossibilidade de negar certidão de quitação eleitoral em decorrência da rejeição das contas.

Em junho de 2012, ao excluir o § 2º do art. 52 de sua Resolução nº 23.376/2012, que dispunha acerca da suspensão de quitação eleitoral a candidatos que tivessem suas contas rejeitadas, o TSE levou a crer que o entendimento adotado seria, de fato, o mais benéfico aos candidatos.

Porém, a não prestação surte efeitos de inelegibilidade, até o fim do pleito para o qual concorreu e, a prestação inadequada pode gerar efeitos secundários judiciais com penalidade que vão desde a devolução do recurso não prestado até a cassação da candidatura ou mandato eletivo, por via de meios judiciais próprios.

*Danubio Cardisi Remy é advogado, mestre em Direito e especialista em Direito Público e Eleitoral.