Suspensa investigação contra alunas que afixaram cartazes feministas, na UFG, com dizeres “Tire seus rosários dos meus ovários”

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Em dezembro de 2015, foram afixados vários cartazes com dizeres considerados “feministas”, como “Tire seus rosários dos meus ovários”.

O juiz Denival Francisco da Silva, da 5ª Vara Cível de Goiânia, concedeu habeas corpus para suspender o procedimento policial de investigação criminal envolvendo cinco estudantes da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Goiás (UFG), investigadas por crime contra o sentimento religioso, após afixarem cartazes com frases relativas à luta contra a violência de gênero. Na ação, a advogada Bartira Miranda, professora das alunas e responsável por impetrar o pedido de habeas corpus, defendeu que o fato é atípico, não podendo ser configurado como crime.

Em dezembro de 2015, foram afixados vários cartazes com dizeres considerados “feministas”, como “Tire seus rosários dos meus ovários”, nas dependências da Faculdade. Duas professoras, um técnico e um estudante solicitaram providências ao diretor da Faculdade, que encaminhou o caso para a Delegacia de Polícia.

Ao tomar conhecimento do caso, a advogada Bartira Miranda propôs habeas corpus sob o fundamento de que a investigação – que já dura nove meses – viola o artigo 69 da Lei nº 9.099/95, pois não foi lavrado Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO), nem houve a instauração formal de inquérito policial.

“Além disso, o fato não se amolda às figuras típicas do artigo 208 do Código Penal, conforme apontado. O crime de vilipendiar objeto de culto religioso exige uma conduta que se dirige contra um objeto sagrado de culto religioso. Não configura o crime a simples menção a um objeto, além da inexistência do dolo de vilipendiar o objeto ou o sentimento religioso”, defendeu a advogada.

Ela ainda destacou que houve abuso de poder e desvio de finalidade da investigação, “que teria o único propósito de reprimir o debate de determinados temas na Faculdade de Direito”. Também apontou que, após a impetração do habeas corpus, tomaram conhecimento de que o caso já tinha sido arquivado pela Justiça Federal. O juiz Eduardo Pereira da Silva acolheu o pedido de arquivamento feito pelo procurador Marco Túlio de Oliveira e Silva, do Ministério Público Federal (MPF).

Liberdade
Ao analisar o caso, o juiz disse que “nem de longe houve situação de escárnio a alguém, impedimento ou perturbação de ato religioso, hipóteses primeira do tipo descrito”. Segundo observa, a Constituição Federal, em ser artigo 5º, IV, assevera com uma das modalidades do gênero liberdade, a livre manifestação do pensamento. O magistrado ressalta que, nada melhor do que fazê-lo de forma criativa, crítica e em defesa de interesses salutares, sem que isso expressa ofensa a terceiros.

Para o magistrado, dizer as pacientes, impessoalmente, para que retirem rosários dos vossos ovários é a evocação da própria dignidade. É um pedido para que respeitem suas vontades, suas liberdades, suas opções religiosas, suas escolhas sexuais, suas formas de viverem, seus valores morais, éticos, suas autonomias sobre o próprio corpo. “Enfim, um grito de liberdade”, completa. O juiz salienta, ainda, que sequer em tese pode-se afirmar que houve o intento de ofender objeto religioso.

Ambiente acadêmico
Em sua decisão, o juiz ressalta que o que mais espanta é que toda celeuma aconteceu num ambiente acadêmico, de uma Faculdade de Direito, donde se espera o enlevo, inclusive por motivos de ser objeto de estudos, dos direitos e garantias fundamentais. “Onde se espera a exaltação dos princípios determinantes do Estado Democrático de Direito. O alvoroço que se fez em torno da manifestação, legítima, livre, e que deve ser assegurada, estabelece uma verdadeira confusão inaceitável entre o Estado e a religião”, acredita.