Por maioria de votos, a 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) conheceu e deu provimento a um recurso de apelação, no qual a Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Goiás (OAB-GO) atuou como terceira interessada (“amicus curiae”). A decisão resultou na anulação da sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de São Miguel do Araguaia, que havia condenado dois advogados ao pagamento de custas judiciais por suposta litigância predatória ou fraudulenta. Dessa forma, foi determinada a restauração e o prosseguimento do processo.
A decisão foi proferida na sessão ordinária da última terça-feira (25/02). O relator do desembargador Reinaldo Alves Ferreira, que foi voto vencido, afastou a condenação dos advogados ao pagamento das custas processuais, destacando que tais encargos não podem ser imputados ao defensor no exercício de suas atividades. Ele ressaltou, ainda, que a imposição dessa penalidade não se insere no poder geral de cautela, sendo competência exclusiva da OAB a sindicância de atos praticados por advogados. No entanto, o relator manteve o reconhecimento da litigância predatória.
O desembargador Vicente Lopes da Rocha Júnior, porém, abriu a divergência desse entendimento ao considerar inexistente a litigância predatória. Ele argumentou que, em comarcas de pequeno porte, é natural que um mesmo advogado se especialize em determinada matéria. Destacou, ainda, que a competência para fiscalizar a conduta ética dos advogados cabe à OAB, e que a penalização imposta resultou na extinção do processo sem resolução de mérito, prejudicando o jurisdicionado. “Essa questão deveria ser resolvida em um ambiente administrativo. Não reconheço litigância predatória”, afirmou.
Durante a sessão, após a audição do áudio da audiência, em que foram analisadas as declarações do autor da ação e as manifestações do juiz, o juiz substituto em 2º Grau Antônio Cézar Pereira Meneses e o desembargador presidente Carlos Alberto França acompanharam a divergência. Eles não apenas excluíram a penalidade imposta aos advogados, conforme já previsto no voto do relator, como também reconheceram a ausência de litigância predatória e anularam a sentença. A juíza substituta em 2º Grau Viviane Silva de Moraes Azevedo acompanhou o relator.
Com o placar de 3×2, a 2ª Câmara Cível cassou a sentença e determinou o retorno dos autos ao juízo de origem para o prosseguimento da ação.
Sustentação oral
O conselheiro federal Pedro Paulo Medeiros realizou sustentação oral em defesa dos advogados, enfatizando a nulidade da decisão por violação das prerrogativas da advocacia. Segundo ele, os advogados foram contratados para discutir a retenção indevida de valores na conta bancária do cliente, e, na audiência de instrução, o consumidor expressamente confirmou conhecer os advogados e tê-los contratado.
No entanto, conforme apontado por Pedro Paulo, o juiz determinou a retirada dos defensores da audiência, o que configurou violação ao Estatuto da Advocacia. “Não se pode confundir advocacia especializada e reiterada em uma área jurídica com litigância fraudulenta, que deve ser combatida por todos os atores da Justiça”, pontuou.
Pedro Paulo também criticou a decisão do juízo da Comarca de São Miguel do Araguaia, que declarou a existência de litigância predatória e determinou o pagamento de custas e encargos pelos advogados. Segundo ele, não houve comprovação da litigância predatória, uma vez que o cliente confirmou ter contratado os advogados para representá-lo contra o banco. “E, assim como ele, há muitos outros que enfrentam problemas bancários. Em uma cidade pequena, é natural que os mesmos profissionais atuem na defesa desses clientes”, argumentou.
O subprocurador de Prerrogativas da OAB, Luís Felipe Santana Araújo, também defendeu a aplicação do princípio constitucional da ampla defesa e do contraditório. “O juiz deveria ter concedido prazo para que os advogados se manifestassem. No entanto, eles foram retirados da audiência, e todos os atos processuais transcorreram sem a presença de seus defensores, o que configura clara violação das prerrogativas da advocacia”, afirmou.