Saneago é proibida de ceder móveis de luxo em comodato

Após verificar que a companhia Saneamento de Goiás (Saneago) realizou diversos contratos de uso de bens públicos, que não possuem relação com a sua finalidade de atuação, o juiz Ricardo Teixeira Lemos, da 7ª Vara Cível de Goiânia, determinou que a empresa se abstenha de celebrar novos termos de cessão de uso e contratos de comodato de bens móveis, seja com instituições públicas ou privadas, incompatíveis com suas finalidades legal e estatuária. Em caso de descumprimento da sentença, o servidor ou empregado da Saneago que firmar novo contrato deverá pagar multa de R$ 500 mil.

O Ministério Público do Estado de Goiás (MPGO), ao analisar os contratos de uso de bens públicos pertencentes a Saneago, que foram cedidos a órgãos e entidades da Administração Pública nos últimos 5 anos, constatou que a companhia firmou diversos contratos que não condizem com seus objetivos e finalidades, interpondo Ação Civil Pública com pedido de obrigação de não fazer.

De acordo com o MPGO, a quantia apurada com a cessão dos bens trespassados em desacordo com os objetivos da empresa foi de R$ 118.823,76. Aduziu que os contratos não se destinam ao objetivo de constituição da empresa, não podendo a empresa firmar ajustes com outros entes da Administração Pública, sem que atendam a tais objetivos – exploração de serviços de saneamento básico.

Em contrapartida, a Saneago defendeu que os contratos foram celebrados para atender ao interesse público secundário, na forma da Lei de Concessões. Disse que não houve dano ao patrimônio da companhia, pois os bens cedidos à administração serão ressarcidos ao final do contrato. Em relação ao contrato realizado com a Secretaria do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Semarh), cedendo uma caminhonete e uma moto, alegou que teve o objetivo de proteção ao meio ambiente e à saúde.

Desvio de finalidade

Ricardo Teixeira Lemos explicou que a Saneago, sendo uma sociedade de economia mista, é instrumento de atuação do Estado, devendo estar acima dos interesse privados e atendendo ao interesse público, que motivou sua criação. Disse, ainda, que o regime instituído por lei, às sociedades de economia mista, determina um sentido específico à sua atuação, não podendo se esquivar destes objetivos, sob pena de desvio de finalidade.

Portanto, o magistrado informou que a atividade-fim da companhia é captar, tratar e distribuir água, coletar e tratar esgotos sanitários. “Assim, quando a Saneago é dirigida para uma outra finalidade, que não aquela para a qual foi criada, ocorre evidente desvio de finalidade”, afirmou.

Móveis de luxo

Após analisar os autos, o juiz verificou que a Saneamento de Goiás cedeu ao Governo do Estado diversos móveis de luxo, entre sofás de couro e várias mesas, de madeira, granito, vidro e aço cromado, totalizando R$ 21.759,00 em contratos. Foi cedido, também, a órgãos do Estado, aparelhos de raio-X e aparelhos de consultório de odontologia. Por fim, averiguou que foram firmados contratos para o uso de estabilizadores, liquidificador industrial e computadores com o Centro de Trabalho Comunitário, além de 38 banheiros químicos com o Sindicato de Comércio Varejista de Feirante e Vendedor Ambulante no Estado de Goiás, no valor de R$ 62.700,00.

“De início, causa estranheza a diversidade do patrimônio pertencente à Saneago”, disse Ricardo Teixeira. “Analisando os móveis cedidos, móveis de certo luxo, em couro, vidro, granito e aço escovado, chego à conclusão que se encaixam melhor num Palácio de governo do que numa empresa prestadora de serviço público para abastecimento de água. Ao que parece, a Saneago tem sido usada como ‘laranja’ para aquisição de móveis pela administração pública, isto para burlar a transparência inerente ao poder público”, falou.

O magistrado observou que não houve, pela empresa, demonstração da origem desses bens, não justificando em nenhum momento o porquê de ter em seu acervo patrimonial bens que nada têm relação com sua finalidade de atuação. “O mais grave ainda é a Saneago adquirir tais bens e cedê-los à iniciativa pública ou privada, isto sem processo licitatório, que em tese está obrigada a fazê-lo, tudo obviamente ocorre com desvio de finalidade, isto descaradamente”, reiterou.

Ademais, informou que os bens, que nada têm a ver com a atividade-fim da Saneago, não são considerados bens públicos, podendo, inclusive, serem doados. Ricardo Teixeira disse que, para isso, a companhia deveria estar bem estruturada e gozando de boa saúde financeira. “Entretanto, o que se vê no dia a dia é a falta de recursos para gerir a falta de água no Estado”, afirmou. Logo, considerou que restou claro o desvio de finalidade dos recursos da Saneago.

“Portanto, em atenção aos princípios de legalidade, moralidade e razoabilidade, em face do desvio de finalidade dos contratos entabulados, amplamente demonstrado por farta prova documental, a Saneago nestes casos atua fora da área de sua precípua atividade no fornecimento de água tratada e esgoto, configurando-se verdadeira fraude para fornecimento de bens móveis para outras instituições públicas e privadas, vislumbro ser mais do que necessária a pronta intervenção do Estado-Juiz no total acatamento do pleito Ministerial, devendo a requerida refrear-se em celebrar novos contratos desta natureza, sob pena de em pouco tempo inviabilizar por completo a atividade principal da empresa”, concluiu.