A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), deferiu medida cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 548 para “suspender os efeitos de atos judiciais ou administrativos, emanados de autoridade pública que possibilite, determine ou promova o ingresso de agentes públicos em universidades públicas e privadas”. Em sua decisão, a ministra suspende, ainda, qualquer determinação de recolhimento de documentos, interrupção de aulas, debates ou manifestações em universidades, bem como a coleta irregular de depoimentos de professores ou alunos pela “manifestação livre de ideias e divulgação do pensamento nos ambientes universitários ou em equipamentos sob a administração de universidades públicas e privadas”.
A ADPF foi ajuizada pela procuradora-geral da república, Raquel Dodge, contra decisões de juízes eleitorais que determinam a busca e apreensão de panfletos e materiais de campanha eleitoral em universidades e nas dependências das sedes de associações de docentes, proíbem aulas com temática eleitoral e reuniões e assembleias de natureza política, impondo-se a interrupção de manifestações públicas de apreço ou reprovação a candidatos nas eleições gerais de 2018, em universidades federais e estaduais. As medidas teriam como embasamento jurídico a legislação eleitoral, no ponto em que veda a veiculação de propaganda de qualquer natureza (artigo 37 da Lei n. 9.504/1997).
De acordo com a ministra Cármen Lúcia, os atos questionados apresentam “subjetivismo incompatível com a objetividade e neutralidade que devem permear a função judicante, além de neles haver demonstração de erro de interpretação de lei, a conduzir a contrariedade ao direito de um Estado democrático”.
A ministra esclarece que a finalidade da norma que regulamenta a propaganda eleitoral e impõe proibição de alguns comportamentos em períodos especificados é impedir o abuso do poder econômico e político e preservar a igualdade entre os candidatos no processo. Ela ressalta que o processo eleitoral, no Estado democrático, fundamenta-se nos princípios da liberdade de manifestação do pensamento, da liberdade de informação, de ensino e aprendizagem, e de escolhas políticas, além da autonomia universitária.
“Toda interpretação de norma jurídica que colida com qualquer daqueles princípios, ou, o que é pior e mais grave, que restrinja ou impeça a manifestação da liberdade é inconstitucional, inválida, írrita. Todo ato particular ou estatal que limite, fora dos princípios fundamentais constitucionalmente estabelecidos, a liberdade de ser e de manifestação da forma de pensar e viver o que se é, não vale juridicamente, devendo ser impedido, desfeito ou retirado do universo das práticas aceitas ou aceitáveis”, afirmou a ministra.
“Liberdade de pensamento não é concessão do Estado. É direito fundamental do indivíduo que a pode até mesmo contrapor ao Estado. Por isso não pode ser impedida, sob pena de substituir-se o indivíduo pelo ente estatal, o que se sabe bem onde vai dar. E onde vai dar não é o caminho do direito democrático, mas da ausência de direito e déficit democrático”, conclui, ressaltando que discordâncias são próprias das liberdades individuais. “As pessoas divergem, não se tornam por isso inimigas. As pessoas criticam. Não se tornam por isso não gratas. Democracia não é unanimidade. Consenso não é imposição.” A decisão liminar será submetida a referendo do Plenário na sessão da próxima quarta-feira (31).