Empregado que atuava na prevenção e combate a incêndios deve ser reconhecido como bombeiro civil, entende TRT-GO

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Para a Segunda Turma do Tribunal Regional do Trabalho de Goiás (TRT-18), uma vez demonstrado que o empregado trabalhava na prevenção e combate a incêndios, aplicam-se os direitos previstos na Lei nº 11.901/2009. A norma estabelece regras a respeito da profissão de bombeiro civil.

A profissão é definida como o profissional que exerce, em caráter habitual, função remunerada e exclusiva de prevenção e combate a incêndio, como empregado contratado diretamente por empresas privadas ou públicas, sociedades de economia mista, ou empresas especializadas em prestação de serviços de prevenção e combate a incêndio. Com esse entendimento, o Colegiado manteve sentença do Juízo da 2ª Vara do Trabalho de Itumbiara (GO) em uma ação trabalhista de um motorista, que também atuava como bombeiro civil, em face de uma multinacional de bioenergia.

O caso

O motorista, contratado pela multinacional em 2007, disse na ação que ao longo do contrato de trabalho passou a desempenhar a função de líder de brigada desde maio de 2012, tendo sido dispensado em fevereiro de 2020. Ele conta que atuava no combate aos incêndios e queimadas, sendo que nenhum motorista ou auxiliar de brigada da empresa podia iniciar o combate sem a sua presença. Por isso, pediu à Justiça do Trabalho o reconhecimento de sua atividade como bombeiro civil e o enquadramento da jornada de trabalho de 36 horas semanais, com o pagamento das diferenças de horas extras e reflexos.

A multinacional disse que o ex-empregado não atuava como bombeiro. Alegou que a própria lei prevê requisitos cumulativos para o enquadramento como bombeiro civil, como a habilitação e atuação exclusiva e habitual no combate e prevenção a incêndio.

O Juízo da 2ª Vara do Trabalho de Itumbiara entendeu haver provas capazes de qualificar o motorista como líder de brigada, de acordo com a Lei 11.901/2009. Por isso, reconheceu o exercício da função de bombeiro civil pelo motorista entre fevereiro de 2015 a fevereiro de 2020, deferindo o pleito de horas extras após a 36ª hora semanal laborada e reflexos.

Recurso

Para tentar reverter essa condenação, a multinacional recorreu ao TRT-18. Argumentou não haver provas sobre a efetiva atuação do trabalhador no combate direto a incêndios, tampouco de forma habitual e exclusiva. Pediu a exclusão do reconhecimento e das verbas concedidas.

A relatora, desembargadora Kathia Albuquerque, disse que a sentença deveria ser mantida, pois restou comprovado o exercício da atividade de bombeiro civil pelo motorista. Ela citou o pagamento do adicional de periculosidade durante todo o período imprescrito, não sendo razoável que a empresa o fizesse todos os meses por liberalidade, notadamente quando há presunção jurídica de que o bombeiro civil está exposto a perigo.

A relatora explicou que embora a lei dos bombeiros civis se refira ao profissional habilitado, não há previsão específica dos requisitos para o exercício desta função. “Assim, à míngua de regulamentação de qual seria esse tipo de qualificação, tenho que um empregado deve ser considerado bombeiro civil quando se ativa habitualmente na prevenção e combate a incêndio”, afirmou. Além disso, Kathia Albuquerque ponderou sobre o princípio da primazia da realidade, dentro do processo do trabalho, prevalecendo os fatos sobre as formas.

A desembargadora considerou, ainda, a clareza da prova testemunhal a respeito da atuação do trabalhador no combate e prevenção a incêndios, mesmo sem a existência de focos de incêndio diários, o que não prejudica o enquadramento como bombeiro civil. Ela disse, ainda, que a habitualidade diária não é necessária, notadamente quando eficazes as ações de prevenção, que também são atribuições do bombeiro civil, que diminuem eficazmente a quantidade de focos de incêndios ou minimizam consideravelmente os riscos e/ou estragos.

Acerca do exercício de tarefas estranhas à atividade de bombeiro civil eventualmente determinadas pela empresa, a relatora citou o entendimento do desembargador Gentil Pio no julgamento de outro recurso sobre o mesmo assunto. Na oportunidade, Gentil Pio considerou que “a obrigatoriedade de exercício da função com exclusividade é destinada ao empregador, obstando-lhe atribuir atividades outras a esses profissionais, e não como condição de enquadramento dos trabalhadores, que muita das vezes são obrigados a exercerem, além das atividades típicas de bombeiro civil, outras estranhas ao seu cargo. Entender diferentemente importa no desvirtuamento dos objetivos da citada Lei especial, pois bastaria ao empregador atribuir a seu empregado, que exerce as atividades de prevenção e combate a incêndio, funções estranhas a essas, para se eximir de pagar os direitos devidos para a categoria, em fraude à legislação “.

Processo: 0010144-34.2020.5.18.0122