A proporcionalidade como limite de conformação legislativa

O vício de constitucionalidade decorrente do excesso de poder legislativo é um dos temas mais tormentosos ligados ao controle de constitucionalidade.

Ele impõe ao controlador a aferição da compatibilidade ou não do dispositivo legal ou normativo em cheque com o princípio da proporcionalidade, vale dizer, impõe a verificação da adequação e da necessidade daquela norma.

Ao reconhecer o vício, como observa o Professor Gilmar Mendes, o Judiciário censura o excesso cometido na discricionariedade legislativa ou, como assente na doutrina alemã, na esfera de liberdade de conformação do legislador .

Isso pelo fato de a discricionariedade legislativa traduzir, a um só tempo, liberdade e limitação.

É reconhecido o direito – senão dever – de conformação do legislador, mas sempre dentro dos limites impostos pela Constituição.

O que extrapola as balizas constitucionais é nominado de excesso de poder legislativo.

“A doutrina identifica como típica manifestação do excesso de poder legislativo, a violação ao princípio da proporcionalidade ou da proibição de excesso, que se revela mediante contrariedade, incongruência, irrazoabilidade ou inadequação entre meios e fins. ”

No direito português, Canotilho ensina que o princípio da proporcionalidade, ou da proibição de excesso constitui um limite constitucional à liberdade de conformação do legislador .

Foi precisamente essa orientação que acabou convertendo o princípio da legalidade ou do devido processo legal em princípio da legalidade proporcional ou do devido processo legal substancial.

Trocando em miúdos, não basta que a lei exista formalmente no sistema.

Para que efetivamente seja norma jurídica válida, alinhada aos mandamentos constitucionais, é imprescindível que haja adequação entre os meios utilizados para consecução dos fins pretendidos, bem como seja flagrante a necessidade de utilização daquela norma para o atendimento do target normativo.   

O controle de constitucionalidade tendo como paradigma a proporcionalidade não é novidade no Supremo Tribunal Federal.

No RE nº 18.331, cujo relator foi o Ministro Orozimbro Nonato, a proporcionalidade foi utilizada para afastar uma norma que excedia a necessidade tributária do Estado, donde se disse que o poder legislativo é um poder, cujo exercício não deve ir até o abuso, o excesso, o desvio, sendo aplicável, ainda aqui, a doutrina fecunda do “détournement de pouvoir” .
 
O STF, desde então, tem destacado a incidência do princípio da proporcionalidade sobre múltiplos aspectos em que se desenvolve a atuação estatal, inclusive sobre a atividade normativa, destacando, sempre, ser sua observância essencial à racionalidade do Estado Democrático de Direito e imprescindível à tutela mesma das liberdades fundamentais, proibindo o excesso e vedando o arbítrio do Poder.

Em todas as hipóteses, extrai-se a proporcionalidade da acepção substancial ou material do due processo of law.

Enfatiza-se, neste ponto, que a cláusula do devido processo legal, proclamada no art. 5º, inciso LIV, da Constituição da República, traduz o fundamento dogmático da proporcionalidade.

Em síntese, pode-se extrair um recado ao legislador: não basta legislar. É preciso legislar nas balizas impostas pela proporcionalidade.

*Carlos Vinícius Alves Ribeiro é Mestre e Doutorando em Direito do Estado pela USP, Professor de Direito Público e Urbanístico e Promotor de Justiça