Código de Processo Civil/2015 e a contagem de prazos na recuperação judicial

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    Com a vigência a partir de março de 2015 da Lei 13.105 (Novo Código de Processo Civil), que trouxe um novo modelo para se contar prazos – em dias úteis -, houve um certo questionamento e tomada de posições por parte de doutrinadores e de julgadores sobre como se contar os prazos no instituto da recuperação judicial. Ocorre que a Lei 11.101/05. LFRE -, nada obstante prever os seus prazos, por óbvio não o faz especificando se sua contagem se dá em dias corridos ou em dias úteis. Por outro lado, diz esta Lei em seu artigo 189 que “Aplica-se a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil -, no que couber, aos procedimentos previstos nesta Lei”. (grifamos), referindo-se ao antigo CPC que vigorou até março de 2015, cuja contagem de prazos se verificava por dias corridos. Diante disso, na verdade, existiram não só questionamentos, mas, julgamentos diversos, com uns interpretando que a contagem dos prazos na recuperação judicial deveria continuar sendo feita como era, ou seja,  em dias corridos; e, outros, ao contrário, que este prazo deveria ser computado como manda o novo CPC, isto é, em dias úteis.

    Somente após 3 (três) anos de vigência do novo CPC é que a questão chegou ao conhecimento do STJ – Superior Tribunal de Justiça -, última instância para conhecer e julgar questões infraconstitucionais, como é o caso da presente Lei de Falências e Recuperação de Empresas. No REsp 1699528/MG, em que é Relator o eminente Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 10/04/2018, DJe 13/06/2018, pacificou-se que a contagem de prazos no instituto de recuperação judicial deveria ser da seguinte forma: www.recuperacaojudiciallimiro.com.br

    “RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. ADVENTO DO CPC/2015. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA. FORMA DE CONTAGEM DE PRAZOS NO MICROSSISTEMA DA LEI DE 11.101/2005. CÔMPUTO EM DIAS CORRIDOS. SISTEMÁTICA E LOGICIDADE DO REGIME ESPECIAL DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL E FALÊNCIA. 1. O Código de Processo Civil, na qualidade de lei geral, é, ainda que de forma subsidiária, a norma a espelhar o processo e o procedimento no direito pátrio, sendo normativo suplementar aos demais institutos do ordenamento. O novel diploma, aliás, é categórico em afirmar que “permanecem em vigor as disposições especiais dos procedimentos regulados em outras leis, as quais se aplicará supletivamente este Código” (art. 1046, § 2°). 2. A Lei de Recuperação e Falência (Lei 11.101/2005), apesar de prever microssistema próprio, com específicos dispositivos sobre processo e procedimento, acabou explicitando, em seu art. 189, que, “no que couber”, haverá incidência supletiva da lei adjetiva geral. 3. A aplicação do CPC/2015, no âmbito do microssistema recuperacional e falimentar, deve ter cunho eminentemente excepcional, incidindo tão somente de forma subsidiária e supletiva, desde que se constate evidente compatibilidade com a natureza e o espírito do procedimento especial, dando-se sempre prevalência às regras e aos princípios específicos da Lei de Recuperação e Falência e com vistas a atender o desígnio da norma-princípio disposta no art. 47. 4. A forma de contagem do prazo – de 180 dias de suspensão das ações executivas e de 60 dias para a apresentação do plano de recuperação judicial – em dias corridos é a que melhor preserva a unidade lógica da recuperação judicial: alcançar, de forma célere, econômica e efetiva, o regime de crise empresarial, seja pelo soerguimento econômico do devedor e alívio dos sacrifícios do credor, na recuperação, seja pela liquidação dos ativos e satisfação dos credores, na falência. 5. O microssistema recuperacional e falimentar foi pensado em espectro lógico e sistemático peculiar, com previsão de uma sucessão de atos, em que a celeridade e a efetividade se impõem, com prazos próprios e específicos, que, via de regra, devem ser breves, peremptórios, inadiáveis e, por conseguinte, contínuos, sob pena de vulnerar a racionalidade e a unidade do sistema. 6. A adoção da forma de contagem prevista no Novo Código de Processo Civil, em dias úteis, para o âmbito da Lei 11.101/05, com base na distinção entre prazos processuais e materiais, revelar-se-á árdua e complexa, não existindo entendimento teórico satisfatório, com critério seguro e científico para tais discriminações. Além disso, acabaria por trazer perplexidades ao regime especial, com riscos a harmonia sistêmica da LRF, notadamente quando se pensar na velocidade exigida para a prática de alguns atos e na morosidade de outros, inclusive colocando em xeque a isonomia dos seus participantes, haja vista a dualidade de tratamento. 7. Na hipótese, diante do exame sistemático dos mecanismos engendrados pela Lei de Recuperação e Falência, os prazos de 180 dias de suspensão das ações executivas em face do devedor (art. 6, § 4°) e de 60 dias para a apresentação do plano de recuperação judicial (art. 53, caput) deverão ser contados de forma contínua. 8. Recurso especial não provido”. (grifamos). 

    Embora a ementa acima se refira exclusivamente aos prazos previstos para a suspensão de todas as ações e execuções em face do devedor quando do deferimento do processamento da RJ (180) dias, e de apresentação do plano de recuperação judicial (60) dias, ficou claro, porém, que a aplicação das normas do Novo Código de Processo Civil à LFRE deve ser feita de forma subsidiária, até mesmo porque nele está previsto que continuam em vigor “as disposições especiais dos procedimentos regulados em outras leis, as quais se aplicará supletivamente este Código” (art. 1046, § 2°)”, sendo uma delas a de número 11.101/05. Não só por isto, mas também por outro princípios, como o da celeridade processual,  o da manutenção da atividade, o do interesse dos credores, entre outros, os prazos previstos na LFRE, diz o STJ, devem ser contados de forma contínua, e não como prevê o novo CPC, em dias úteis.

    Renaldo Limiro é advogado especialista em recuperação judicial no escritório Limiro Advogados Associados S/S. Autor das obras A Recuperação Judicial Comentada Artigo por Artigo, Ed. Delrey; Recuperação Judicial, a Nova Lei…, AB Editora; e, Manual do Supersimples, com Alexandre Limiro, Editora Juruá. É membro da ACAD – Academia Goiana de Direito e atual vice-presidente da Acieg. Mantém o site www.recuperacaojudiciallimiro.com.br