Sorria, você está sendo monitorado!

*Rafael Damásio Brasil Garcia

Desde o dia 9 de julho deste ano, o Cadastro Positivo passou a ser compulsório e todas as pessoas – físicas e jurídicas, têm seus dados de compras e pagamentos automaticamente lançados em um banco de dados.

Todo o histórico de pagamento de contas (até mesmo de água e energia), bem como o eventual atraso no pagamento de alguma fatura, passa a ficar à disposição dos birôs de crédito – Serasa, Boa Vista Serviços, Quod e SPC Brasil.

A lógica é que, com isso, o consumidor tenha um registro de todas as suas movimentações comerciais e, a partir daí, essas movimentações alimentarão um banco de dados que avaliará se o consumidor é confiável para buscar crédito em determinado estabelecimento.

A expectativa é que, a médio prazo, as taxas dos juros cairão no Brasil, já que o custo de crédito reduzirá por conta da consequente redução do risco de se emprestar dinheiro, dada a transparência das informações.

O Cadastro Positivo não é novidade, e embora tenha sido criado em 2011, com o advento da Lei Complementar 166/19, agora ele é obrigatório. E isso não é necessariamente bom.

O acesso aos dados dos consumidores é o primeiro dos pontos que requer atenção. Sobretudo agora, com a Lei Geral de Proteção de Dados entrando em vigor, é sabido que o tratamento dos dados requererá um cuidado especial.

Mesmo assim, as empresas de proteção ao crédito poderão utilizar todos os dados das compras pessoais, como água, luz, gás, internet, além de informações de familiares, a fim de classificar os consumidores como bons ou maus pagadores.

E embora seja vedado o uso de dados pessoais sensíveis, que façam distinção da classe social, por exemplo, é óbvio que as empresas de crédito acabarão por fazer tal distinção, já que agruparão os consumidores em perfis socioeconômicos específicos, o que já é um grande equívoco!

Além disso, o atraso em qualquer conta fará com que o consumidor seja mal avaliado, aumentando as taxas de juros e cerceando o acesso ao crédito. E atenção: mesmo cobranças indevidas terão o débito informado a esse sistema, representando verdadeira derrota para o consumidor hipossuficiente.

Por fim, a obrigatoriedade do envio dos dados dos consumidores vai de encontro com a política nacional das relações de consumo, que tem por objetivo a proteção dos interesses econômicos dos consumidores e a transparência das relações de consumo. Vale lembrar que grande parte dos consumidores brasileiros sequer sabe que, agora, seus dados são automaticamente expostos. Onde está, pois, a transparência?

E, se até esse momento, você tinha qualquer dúvida sobre a vulnerabilidade do sigilo das suas informações pessoais, agora só resta dizer: sorria, você está sendo monitorado!

*Rafael Damásio Brasil Garcia  é sócio do Brasil e Silveira Advogados, presidente do IEAD – Instituto de Estudos Avançados em Direito e diretor adjunto da Escola Superior de Advocacia – ESA Goiás.