Poliana Ribeiro*
Ainda vemos, na prática, a jurisdicionalização de fatos e circunstâncias em que poderiam ser evitadas, mitigadas. Tanto a jurisdicionalização quanto a burocratização são práticas que combatemos diariamente. Há uma máxima que diz que: “A advocacia não é para covardes”. De que advocacia se fala? Da contenciosa a todo e qualquer custo?
O direito enquanto sistema de regras não deve se sobrepor, no primeiro plano, ao direito do indivíduo enquanto ser social e dotado do exercício pleno de manifestação de vontade. Há que se ter coerência na aplicação de normas, aspectos regulatórios, na situação fática, considerando seus contornos e o que está ou será regulado nas relações sejam elas pessoais, interpessoais e organizacionais.
Trata-se de uma perspectiva que pode não só valorar as relações e negócios, mas evitar a jurisdicionalização e prejuízos que vão além dos econômico-financeiros, mas que favorece o cumprimento dos aspectos regulatórios (o Compliance, por exemplo), na viabilidade do equilíbrio das relações negociais, bem como possibilita maior rentabilidade e segurança jurídica aos envolvidos.
Eu tenho, por exemplo, utilizado o método de Documentação Humanizada, que aplico aos meus clientes, operações e negócios. É uma metodologia autoral, que criei e desenvolvi a partir de minha experiência de quase 20 anos de atuação no extrajudicial, com a formalização de atos e documentos e em processos documentais.
A aplicação da metodologia da Documentação Humanizada possibilita resultados diferenciados aos clientes, pois envolve a aplicação, a partir da coerência e coexistência entre aspectos fáticos, jurídicos, procedimentais e operacionais, sejam nos âmbitos do direito público e privado, vez que abarca as relações e negócios jurídicos envolvendo questões de cunho pessoais, interpessoais e organizacionais.
Trata-se de ver o direito enquanto fato social, com suas dinâmicas, o direito dos indivíduos enquanto seres sociais, considerando que a frente de um CNPJ há um CPF, e o documento e o processo documental a partir das lentes dos relacionamentos e das relações, e vice-versa, como um ciclo virtuoso, sem perder de vista o documento como núcleo primário à formalização dos atos e fatos que concorrem às vidas e cidadãos, empresas e organizações, e ainda, organismos enquanto instituições que representam causas e grupos.
Os documentos enquanto núcleo originário, na prática, ainda não recebem, em si, a devida importância. Os documentos são a formalização das relações. São nos detalhes que a vida se desenha, bem como a formalização dela.
Um acordo bem elaborado libera pessoas e viabiliza negócios. Melhor documentamos quando conseguimos extrair a dinâmica relacional existente, seja na regularização de uma área que envolve vários herdeiros que visa o desenvolvimento de um empreendimento imobiliário, seja na melhor e mais adequada composição societária em uma empresa familiar por meio do acordo societário e protocolo familiar, por exemplo.
Em princípio, por mais que pareça óbvio, não o é, mas sim, é basilar, estruturante às melhores práticas e resultados. Necessário se faz dizer que nem sempre trata-se de trazer luz à lei. A compreensão do que é um “documento” vai além de um papel, oficial, público ou particular.
O documento uma vez sendo a formalização de um ato ou fato, trata-se de um registro de informações, que precisam ser claramente definidas, sustentáveis, que permitam uma coerência. Ratifica-se, entre a realidade fática e material, enquanto instrumento. É a tradução do que se propõe, em tempo e ocasião, em conformidade com aspectos regulatórios.
Reconhecendo que a essência de que o melhor documentar é o relacionar, imprescindível a interpretação não só dos ditames legais, mas do exercício das vontades, alinhado ao equilíbrio da relação enquanto negócio jurídico.
Neste tempo, é imperativo qualificar os processos documentais, com seus atos e procedimentos, a depender da demanda, pois eles são a garantia, compõem aspectos basilares para resultados qualificados, vez que há mitigação de riscos e contendas futuras, uma vez que se é possível antever as mudanças nas relações entre os envolvidos. Melhor documentarmos quando há a clareza e visão acerca da interação negócio x relação entre os envolvidos.
*Poliana Ribeiro é advogada. CEO e fundadora da Inteligência Cartorial. ceo@pribeiro.com.br