A possibilidade de decretação do divórcio sem ouvir a outra parte

Sunária Brito*

Sim, é possível, e esse é o burburinho da vez, porque a esposa de um participante confinado em um reality show obteve o seu divórcio e o ex-cônjuge só soube que estava divorciado quando saiu do confinamento.

Um outro caso que havia ganhado notoriedade é o da apresentadora Ana Hickmann, que em uma entrevista disse que entrou com pedido de divórcio pela Lei Maria Penha por ser mais rápido.

Isso porque no caso de violência doméstica, como ocorreu com a apresentadora, a Lei prevê ferramentas de proteção à vítima que passa por situações de violência, seja no âmbito físico, sexual, psicológico, patrimonial ou moral.

E, entre as medidas de proteção, a lei introduziu a possibilidade do divórcio por meio do juízo que trata de violência doméstica [em situações comuns, o divórcio é regulado pela vara de família], que entende que essa mulher corre perigo e assim dá prioridade, celeridade a esse processo, além de medidas protetivas de proibição de contato do agressor com a vítima, seus familiares, e também com os filhos, pois, ao presenciarem situações de violência doméstica, estão submetidas também a sofrimento psíquico significativo. Porém, a partilha de bens continua sendo de competência da vara de família.

Dessa forma, a Lei Maria da Penha de fato busca dar maior celeridade no processo de divórcio em relação à separação de corpos com a devida proteção.

No caso recente, tratou-se de uma liminar concedendo o divórcio à requerente sem sequer ter ouvido, ou comunicado seu cônjuge, o que despertou curiosidade do público por meio das redes sociais quanto a essa possibilidade.

Pois bem, é sabido que o matrimônio antigamente era protegido enquanto instituição estatal, a lei priorizava sua indissolubilidade e buscava disciplinar os deveres conjugais, porém, progressivamente, juntamente com o avanço social, essa concepção de família foi se dissipando do ordenamento jurídico brasileiro, não se trata mais o casamento como uma instituição indissolúvel, sequer duradoura, e as normas se afrouxaram relativizando a união e deu ao divórcio um caráter opcional.

A Constituição Federal no seu artigo 226, parágrafo 6º,  trata então o divórcio como um direito potestativo de cada um dos cônjuges, não se submetendo a requisitos, mas tão somente à livre expressão de vontade de um deles de não permanecer casado, podendo cada um exercer sua vontade provocando a tutela jurisdicional independente do querer do outro.

Não há mais exigência de prazo mínimo de união matrimonial para a obtenção do divórcio, nem necessidade de exposição de motivos para a ruptura da sociedade conjugal, muito menos imposição de prévia separação judicial ou de fato do casal. Basta a expressão da vontade de um dos cônjuges, sendo desnecessária a ciência ou concordância da parte contrária.

Portanto, em observância ao dispositivo constitucional citado, o fim da sociedade conjugal pode ser concedido antes mesmo da oitiva da parte contrária, é o que chamamos de liminar ‘inaudita altera parte’, e foi o que aconteceu com o participante do reality show, sendo surpreendido com sua nova condição civil, status de divorciado.

*Sunária Brito é advogada no escritório Jucá e Souza Advogados.