Arma com numeração oculta não autoriza condenação pela prática de crime mais grave, entende juíza

Wanessa Rodrigues

Juíza Placidina Pires, da 10ª Vara Criminal de Goiânia.

Portar arma de fogo que não apresenta numeração visível, seja porque se encontra oculta ou porque desapareceu pela ação do tempo/desgaste natural, não caracteriza crime de porte de arma de fogo de numeração raspada ou suprimida. Esse foi o entendimento da juíza Placidina Pires, da 10ª Vara Criminal de Goiânia, ao julgar caso em que um policial civil foi encontrado com uma pistola, calibre 38, marca Taurus, com numeração não visível. Posteriormente, a perícia observou uma marcação adicional secreta na referida arma.

Placidina Pires explica que o legislador pune mais severamente aquele que porta arma de fogo com numeração suprimida ou raspada porque essa circunstância dificulta a identificação do armamento e do responsável por ela. Porém, se a arma possui numeração secreta e é possível identificar sua numeração, responde o agente apenas pelo crime de porte ilegal, que se trata de imputação menos grave. Nesse caso, a pena mínima é dois anos.

No caso em questão, a denúncia do Ministério Público de Goiás (MP-GO) relata que, em maio de 2014, o acusado foi encontrado em um bar do Setor Vila Nova, portando a referida arma, com numeração raspada, municiada com seis cartuchos intactos, de uso permitido, sem autorização. O réu negou a autoria da arma, no entanto, os policiais responsáveis pela apreensão do armamento, ao serem ouvidos, tanto na Delegacia de Polícia quanto em juízo, foram uníssonos em aduzir que, no momento da abordagem policial, o acusado se identificou como o proprietário da aludida arma de fogo.

Ao analisar o caso, a magistrada salientou que o acusado não comprovou a negativa e não produziu nenhuma prova capaz de infirmar o presente acervo probatório e evidenciar que os policiais militares responsáveis por sua abordagem teriam motivos para injustamente incriminá-lo.

A magistrada, porém, observou que, apesar de a arma de fogo supramencionada não apresentar numeração de série visível, após exame detalhado, a perícia observou uma marcação adicional secreta nela. Fato que possibilitou, posteriormente, a sua identificação, inviabilizando a imputação feita ao réu de portar arma de fogo sem numeração ou com numeração raspada ou suprimida.

Placidina salienta que, embora o número de série da arma de fogo estivesse em desacordo com os padrões utilizados pela indústria fabricante de armas de fogo Taurus, vez que não apresentava numeração visível na lateral da armação, não foi possível determinar se a ocultação foi ocasionada por ação voluntária ou em decorrência do desgaste natural/temporal da arma. Segundo explica, essa circunstância também inviabiliza a responsabilização do réu pela prática do delito de porte de arma de fogo de numeração raspada ou suprimida

“Nesse toar, tendo a arma de fogo sido devidamente identificada, não há razão para a conduta do imputado ser punida mais gravemente, com sua consequente responsabilização pela prática do delito do artigo 16, parágrafo único, inciso IV, do Estatuto do Desarmamento, impondo-se, desse modo, a desclassificação do delito para o tipo penal do artigo 14 da Lei 10.826/200″. O acusado foi condenado a três anos de reclusão, pena substituída por duas penas restritivas de direitos, prestação de serviços a comunidade e prestação pecuniária.