Por que há muitas decisões judiciais diferentes nas ações de concursos públicos?

Normalmente as demandas jurídicas envolvendo causas de concursos públicos movimentam uma grande quantidade de candidatos que se sentem lesionados em seu direito e buscam uma solução jurídica para reverter a reprovação.

Há diversos motivos que ocasionam ações judiciais: seja em decorrência de questões que erraram na prova objetiva e deveriam ser anuladas, porém não foram consideradas; seja pelo fato da banca examinadora de forma arbitrária não considerar a resposta elaborada em um prova discursiva; por não conseguir concluir um teste físico, pois o fiscal não contabilizou os exercícios corretamente; por ter sido reprovado na avaliação médica porque um simples problema de saúde que não comprometeria o trabalho a ser executado como servidor público, entre outros.

Por conseguinte, muitas vezes, os candidatos acabam entrando na justiça com ações ordinárias e mandados de segurança em situações bem idênticas. Por exemplo, 100 candidatos são reprovados no teste psicotécnico aplicado no concurso da polícia militar e destes, apenas 50 ingressam com demandas jurídicas individuais. Porém, cada petição é distribuída para juízes diferentes que tem pensamentos e posicionamentos distintos. Então, alguns candidatos consegue uma decisão judicial favorável e retorna para o concurso e outros não.

“Mas, doutor, o meu colega que foi reprovado no teste psicológico, conseguiu uma liminar para retornar ao certame e prosseguir nas demais etapas e eu não, por quê?”

Não é fácil explicar, no entanto, para entender é preciso adentrar na essência da ciência jurídica reconhecendo que esta não é exata. Diferentemente da matemática que sempre traz resultados exatos e previsíveis, o que não ocorre no Direito, pois o mundo da Justiça é dinâmico e relativo.  E cada juiz tem uma forma de interpretar cada caso concreto em sua peculiaridade.

Outro ponto que influencia em sentenças judiciais tão díspares quando se trata de concurso público é a grande divergência que existe nas decisões jurisprudenciais em sentidos opostos, inclusive, por parte dos Tribunais Superiores.

Há casos que o juiz constata que houve ilegalidade por parte da Administração Pública e da Banca Examinadora, reconhece o direito do candidato e anula a sua reprovação, retornando-o às demais etapas subsequentes do respectivo certame. Contudo, outros juízes mais conservadores e ortodoxos, entendem que a comissão organizadora tem liberdade (discricionariedade) de avaliar o candidato e tem autonomia para eliminar e reprovar, não cabendo ao Poder Judiciário revisar atos emanados do Executivo, sob pena de ferir o princípio da separação dos poderes. Logo, percebe-se que existem razões jurídicas para ambos os entendimentos. E não temos algo pacificado a respeito.

Diante desse cenário, diversos candidatos ficam confusos pelo fato de uns conseguirem êxito nas ações judiciais e outros não terem o seu direito reconhecido mesmo se tratando de assuntos idênticos. Isso também ocorre por ausência de uma legislação específica abordando sobre como o procedimento administrativo de concurso público deve ser realizado e quais são os direitos que os candidatos possuem.

Por um lado, essa proliferação de julgamentos em sentidos tão distintos gera muita insegurança jurídica, pois a pessoa deseja ter pelo menos um pouco de certeza a respeito da probabilidade do seu direito. De outro lado, isso traz uma esperança que até mesmo em casos aparentemente sem solução, dependendo da tese jurídica apresentada e da especificidade do caso é possível conseguir uma resposta favorável por parte do Poder Judiciário.

Em que pese haja divergências doutrinárias, jurídicas e jurisprudenciais, defendemos que os juízes não podem esquivar-se de apreciar as demandas envolvendo concursos públicos, com a alegação falaciosa que “não compete ao Judiciário substituir a banca examinadora” ou “o Poder Judiciário não pode adentrar no mérito administrativo, para não ferir a separação dos poderes”.

Ora, se o jurisdicionado não é socorrido pelo Poder Judiciário, a quem recorrer? Logo, não há que se falar em lesão a harmonia e independência dos Poderes, uma vez que a própria Constituição estabeleceu que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito, previsto no seu artigo 5º.

Em suma, é dever do juiz intervir em casos de ilegalidades e arbitrariedades cometidos pelos entes públicos e comissões organizadoras de concursos públicos. Se há injustiça, então se torna imperioso a intervenção jurisdicional no controle dos atos administrativos.

Dr. Agnaldo Bastos, advogado especialista em direito público, atuante em causas envolvendo concursos públicos, agentes públicos e licitações.

*Dúvidas podem enviar para o e-mail contato@agnaldobastos.adv.br

Ademais, temos um vídeo interessante onde comentamos sobre quais quesitos devem ser analisados para saber a probabilidade de êxito em uma ação envolvendo concurso público. Para assistir, clique aqui!