Relação de trabalho pós-contratual: Teoria da Culpa post pactum finitum

Na coluna desta quinta-feira (28), a colega Lorena Paroschi vai escrever sobre a Teoria da Culpa post pactum finitum na relação de trabalho pós-contratual. Ela é advogada, especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Unifil, pós-graduada em Direito Previdenciário pela Legale e pós-graduanda em Direito Empresarial pela Legale.

Leia a íntegra do texto:             

Lorena Paroschi

A teoria culpa post pactum finitum é resultado da jurisprudência alemã, e abarca em suma, a possibilidade de responsabilização das partes por eventuais danos oriundos após a extinção do contrato. O Código Civil Brasileiro resguarda, em seu artigo 422, a obrigação de probidade e boa-fé entre as partes contratantes.

Deste modo, em confluência com o Direito do Trabalho, referido dispositivo legal deve ser traduzido mediante a teoria da culpa post pactum finitum, ou seja, na fase pós-contratual das relações de trabalho, conservam as partes entre si as obrigações acessórias e laterais, aquelas chamadas de “deveres de consideração”, decorrentes do próprio contrato de trabalho.

Celebrado o contrato de trabalho, empregador e empregado comprometem-se com o cumprimento de deveres que transcendem a jornada de trabalho x remuneração, dentre eles, os principais são o respeito à dignidade do trabalhador e a boa-fé.

Com a dispensa do funcionário, na modalidade com ou sem justa causa, e a ulterior rescisão contratual, os deveres de consideração devem ser mantidos, independentemente do adimplemento das obrigações, a fim de garantir o dever anexo da lealdade. Neste sentido, leciona Flávio Tartuce:

“A boa-fé tem intrínseca relação com a observação dos deveres anexos ou laterais de conduta, já que são considerados o dever de cuidado, respeito, o dever de informar, de agir conforme a confiança depositada, lealdade e probidade, colaboração ou cooperação, agir com honestidade”. (TARTUCE, 2020, p. 648).

Nas espécies dos contratos de trabalho, o cumprimento das obrigações contratuais não exaure a responsabilidade de que, eventualmente, possa ser atribuída à uma das partes, em razão do descumprimento dos deveres norteadores da relação de trabalho, a responsabilização por dano na esfera material ou extrapatrimonial.

É cediço que o contrato de emprego traz consigo responsabilidade e comprometimento que ultrapassa a vigência contratual, conquentemente traz dúvidas quando se trata de mau comportamento ainda que, após a extinção do contrato de trabalho, condição que, em tese, objetivamente extinguiria as obrigações do que foi avençado para o cumprimento do contrato já acabado, conquanto haja cláusula contratual de obrigações futuras, acerca deste tema, Paulo Eduardo Vieira de Oliveira leciona que:   

“é importante que se frise, que há uma relação intersubjetiva entre empregado e empregador muito acentuada, que dá oportunidade, pelo trato sucessivo da relação, a uma das partes (e até a ambas em dano pessoal recíproco) de um causar dano pessoal à outra ou, ainda, do dano acontecer reciprocamente”.

A particularidade entre as partes que advêm do contrato de trabalho ultrapassa os limites para além da sua extinção, impondo as partes o dever de respeito recíproco, de modo que não se utilizem, por exemplo, de informações sigilosas ou privilegiadas em decorrência do cargo exercido, seja em benefício próprio ou para prejudicar outras pessoas.

 Isso significa que, as obrigações de confiança que são consequência do contrato de emprego permanecem além de seu término e exigem comprometimento de lealdade e boa-fé, sob pena de responsabilidade civil pós-contratual.

 Aludida responsabilização pode ocorrer pautada em um dos princípios basilares do ordenamento jurídico brasileiro, a boa-fé objetiva. Sabido que se trata de princípio geral e fundamental, que disciplina que todos os cidadãos devem conduzir seus atos em atenção à padrões éticos-morais e ao agir com lealdade jurídica. 

A configuração da responsabilidade pós-contratual ainda é tema pouco discutido na doutrina pátria. A teoria, de fato, carece de previsão expressa no Código Civil, embora, quando aplicada, seja corroborada com o artigo 422 do referido diploma legal, acrescido dos princípios constitucionais do nosso ordenamento.

Inexistem dúvidas de que a boa-fé objetiva deve ser garantida antes, durante e após o contrato de trabalho, de modo que os contratantes, quando da extinção do contrato e de suas obrigações, deem-se por satisfeitos e seguros diante do acordo de vontades exarado.

Dito isso, tem-se que o cumprimento da prestação contratual por sí só não possui o condão de eliminar a responsabilidade que surge através de fatos posteriores, os quais podem comprometer a realização do interesse especificado no contrato, a responsabilidade recíproca, resulta na obrigação propriamente dita das partes em se portarem de forma leal ainda que posterior ao cumprimento da obrigação principal, sem que frustrem qualquer efeito contratual anteriormente pactuado. 

Referências Bibliográficas:

TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 10. ed. rev, atual. 2020, p. 64.