Para o MP-GO, gastos com desporto educacional só devem ser realizados pelo município quando devidamente comprovado o cumprimento da Lei de Diretrizes e Bases
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A promotora de Justiça Ana Paula Antunes Vieira Nery propôs ação civil pública com obrigações de fazer e não fazer contra o município de Aparecida de Goiânia e a Associação Atlética Aparecidense, em razão de irregularidades apuradas no processo que levou ao convênio entre as partes. Na ação, a promotora requer a suspensão dos repasses de verbas públicas ao time e do Termo de Colaboração n° 606/2018, bem como a declaração de nulidade desse convênio.

Foi requerida ainda a proibição de o município efetuar novos termos de colaboração ou de fomento com o Aparecidense, ou qualquer outra entidade privada, para incentivo do desporto profissional e educacional, até que seja sanada a irregularidade referente ao déficit de vagas na rede profissional. Para a promotora, gastos com desporto educacional só devem ser realizados pelo município quando devidamente comprovado o cumprimento da Lei de Diretrizes e Bases, no que se refere ao oferecimento da educação infantil, devendo ser observado o dever constitucional de priorização de ações relacionadas ao mínimo existencial. Por fim, foi pedida a restituição dos valores repassados à entidade, até a data da suspensão judicial do termo de colaboração que não tenham sido efetivamente aplicados.

O caso 
A promotora relata que o MP abriu em 2017 as investigações para apurar irregularidades no procedimento da Chamada Pública n° 3/2017, destinado ao credenciamento de instituição para implementação e execução de projeto para o desporto de formação e desporto de alto rendimento de Aparecida de Goiânia, que resultou em parceria com a Associação Atlética Aparecidense. Com isso, o município destinou mais de R$ 5 milhões à entidade.

De acordo com a ação, existem apenas duas associações dessa natureza instaladas no município. No entanto, a Associação Aparecida Esporte Clube não tomou conhecimento do chamamento público destinado ao credenciamento em 2018, sustentando que o certame não foi amplamente divulgado.

A promotoria, então, colheu informações no portal da transparência do município, tais como o edital de chamada pública, a ata de divulgação do julgamento da proposta, portaria da comissão de seleção, parecer técnico e ata de recebimento e análise dos documentos de habilitação.

Ao analisar a documentação, a promotora verificou que algumas cláusulas favoreceram o Aparecidense, instituição que, inclusive, há muito tempo firma convênios com o município sem licitação. “Os ajustes, na prática, significam o uso de recursos públicos para financiamento de clube de futebol, que detém fortes laços com agentes políticos e, em troca, não realiza a significativa contrapartida social prometida”, avalia Ana Paula Nery.

Constatou-se também que, visando fugir da licitação, a prefeitura fundamentou a chamada pública na Lei Federal n° 13.019/2014, que estabelece o regime jurídico das parcerias entre a administração pública e as organizações da sociedade civil, em regime de mútua cooperação para finalidades de interesse público.

O MP também analisou o termo de referência que subsidiou o procedimento, verificando a generalidade do seu objeto e a falta de plano de trabalho ou cronograma para cumprimento dos objetivos da parceria. Neste sentido, o objetivo da cooperação seria tanto a implementação e execução de desporto de formação educacional quanto o desporto de alto rendimento, ambos na modalidade futebol de campo, ou seja, duas áreas distintas. A promotora, então, recomendou que deixassem de celebrar o contrato fundado na Chamada Pública n° 3/2017, o que não ocorreu.

Em continuidade à investigação, chamou a atenção o parecer técnico da chamada, que registrou que o Aparecidense tirou zero no quesito “atendimentos realizados para jovens de 12 a 18 anos que permaneceram pelo menos um ano com vínculo na entidade, nos últimos três meses”, apesar dos altos valores recebidos pelo município há cerca de 16 anos.

Da análise dos documentos, também foi possível verificar que o time não comprovou possuir qualificação ou expertise para desenvolver o desporto educacional, fornecer e garantir o objeto da parceria.

Direcionamento
Sobre o direcionamento para a Associação Atlética Aparecidense, a promotora destaca um ofício do então titular da pasta de Esportes Lazer e Juventude, com data de janeiro de 2017, em que são pedidos à Secretaria de Transparência orientações para proceder no trâmite para novos convênios com o Aparecidense com repasses financeiros, diante das mudanças na legislação.

A ação destaca ainda que o plano de trabalho elaborado pelo município não forneceu critérios objetivos para os participantes do certame. A promotora entende que, diante dessa omissão, os interessados não se arriscariam ao credenciamento, uma vez que ficariam à mercê de agentes públicos, risco que não afastou o clube vencedor, por gozar de influência e proximidade com os mesmos.

“O próprio parecer da Secretaria de Transparência, Fiscalização e Controle, que sugeriu a realização do certame, informava que o termo de referência deveria conter plano de trabalho que contemplasse plano de ações sociais de responsabilidade social para atender às crianças da cidade. Portanto, o contexto revela que o chamamento público e o uso da lei federal foram apenas um subterfúgio destinado à continuidade do favorecimento do Aparecidense com recursos públicos federal”, conclui a promotora. Fonte: MP-GO