Liminar autoriza casal a construir em lote cujo contrato impede benfeitorias no local até a quitação de financiamento de 15 anos

Wanessa Rodrigues

Imagine comprar um lote para realizar o sonho de ter a casa própria, mas ser impedido de construir até pagar, em sua totalidade, o financiamento do bem. E mais: as parcelas só serão quitadas em 15 anos. A situação parece distante da realidade, mas foi o que aconteceu com um casal que adquiriu um lote residencial em Aparecida de Goiânia.

Contrato impede benfeitorias

No caso em questão, cláusulas contratuais impedem que sejam feitas benfeitorias no local até a quitação total do débito, o que só ocorrerá em outubro de 2034. Contudo, os consumidores conseguiram na Justiça liminar para construir no local. A medida foi concedida, em agravo de instrumento, pelo desembargador Jairo Ferreira Júnior, da 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO).

O magistrado estipulou multa diária de R$ 200 a ser paga pela incorporadora responsável pelo loteamento em caso de descumprimento da decisão. Em primeiro grau, a medida havia sido negada pelo juízo da 9ª Vara Cível de Goiânia.

Conforme relatou no pedido o advogado Tiago Andrade, o casal adquiriu o lote residencial, em Aparecida de Goiânia, em julho de 2019. Diz que, desde então, sempre horaram com o pagamento do financiamento. Contudo, estão impedidos de construir em decorrência de cláusulas contratuais que proíbem que eles exerçam a posse ou façam qualquer benfeitoria enquanto não quitarem o valor total do bem. Ou, em caráter excepcional, mediante a lavratura de escritura pública de compra e venda com pacto adjeto de alienação fiduciária.

O advogado apontou que as cláusulas são abusivas e que é imperioso reconhecer que a posse já foi transmitida ao casal na época da entrega do empreendimento, conforme expresso em cláusula contratual. Inclusive eles são os responsáveis pelo pagamento de taxa associativa desde outubro de 2019.

No pedido, o advogado cita contradições nas cláusulas contratuais. Isso porque, uma delas prevê a transmissão da posse no prazo de 36 meses a contar do lançamento do empreendimento, desde que os compradores estejam adimplentes com as suas obrigações. Porém, outra fixa que a posse somente será transmitida após a quitação total do bem.

Contrato confuso

Ao analisar o pedido, o juiz disse que, em princípio, nota-se que o contrato evidencia a confusão do redator quanto aos conceitos de propriedade e posse. De forma que, ao contrário do que dispõe uma das cláusulas, a propriedade é que se transmite após a quitação do bem, com o competente registro.

Assim, segundo o magistrado, não remanesce dúvidas de que o contrato, ao prever que os consumidores sejam impedidos de empreender qualquer tipo de benfeitoria no local, sugere medida impositiva de restrições aos atributos de posse. O que é inconcebível à luz do entendimento jurisprudencial.

O magistrado observa que, pelos documentos apresentados, vê-se que o casal está em dia com as parcelas e que o termo final financiamento é outubro de 2034. Assim, esse seria o momento em que os compradores estariam aptos a construir. Contudo, o magistrado observou que o casal já firmou contrato de prestação de serviços com outros profissionais, objetivando a construção de um sobrado residencial. “O que, por óbvio, não pode aguardar até o na de 2034 para a sua efetivação”, completou.