Juiz nega aplicação da nova lei de distrato em contrato firmado antes da vigência da norma

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Wanessa Rodrigues

O juiz Douglas Borges da Silva, da 3ª Vara Cível de Barretos, no interior de São Paulo, condenou uma empresa de empreendimentos imobiliários daquela cidade a restituir 80% do valor pago por um consumidor na compra de um imóvel no regime de multipropriedade. Diante da rescisão contratual, a empresa pretendia aplicar a definições da lei do distrato (13.786/2018), cobrando uma retenção de 50% das quantias pagas. Contudo, o contrato de compra e venda foi firmado em 2017, antes da referida lei entrar em vigor.

Em sua decisão, o magistrado disse que as alterações introduzidas pela Lei 13.786/2018, às disposições da Lei nº 4.591/64 e da Lei nº 6.766/79, regulando os requisitos que devem ser observados no instrumento e que disciplinou penalidades a serem aplicadas ao inadimplente, não se aplicam aos contratos celebrados antes da sua vigência. Isso em respeito à Constituição Federal, sobretudo considerando a existência de ato jurídico perfeito.

Conforme o advogado goiano Pitágoras Lacerda dos Reis explicou na inicial do pedido, o consumidor já pagou mais de R$ 23,9 mil referente ao imóvel, porém, após passar dificuldades financeiras buscou a rescisão do contrato firmado em outubro de 2017. Contudo, a empresa propôs para a rescisão contratual a aplicação das definições da lei do distrato, mesmo sem estar em contrato, cobrando uma retenção de 50% das quantias pagas, além da retenção total da entrada.

Disse que o consumidor entende ser injusto a forma proposta pela empresa, que, segundo afirmou, foge até do contrato, que apesar de ser abusivo, é mais benéfico. O advogado salienta que a abusividade emerge fundamentalmente da vantagem excessiva para a construtora na dedução de valores quando da extinção do contrato, ocasionando inclusive enriquecimento sem causa.

Em sua contestação, a empresa sustentou, em resumo, a inaplicabilidade do CDC ao caso dos autos e a inexistência de abusividade nas cláusulas pactuadas entre as partes. Além da legalidade da retenção das arras confirmatórias, a exigibilidade da multa rescisória, a necessidade fixação de indenização pela fruição e do abatimento da taxa condominial incidente desde a entrega do bem.

Ao analisar o pedido, o juiz disse que o desfazimento do compromisso de compra e venda de imóvel a pedido do compromissário comprador, em razão da sua impossibilidade financeira de arcar com as obrigações pecuniárias assumidas, é pacífica na jurisprudência. Quanto ao cálculo do valor a ser restituído, o magistrado disse que este deve ser parametrizado pelas despesas derivadas da própria celebração do negócio jurídico.

No caso em questão, disse que a empresa não trouxe aos autos qualquer elemento concreto a demonstrar os efetivos gastos operacionais despendidos com a comercialização do bem. De modo que o equivalente a 20% do preço pago pela parte autora se mostra suficiente para indenizá-la pelo desfazimento anormal do negócio jurídico.

1000871-14.2020.8.26.0066