A tradicional marca Kopenhagen perdeu na Justiça o direito exclusivo de uso da expressão “Língua de Gato” para seus chocolates, após decisão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), que considerou o termo genérico. A sentença tem potencial de reverberar por diversos setores da economia e levanta uma importante discussão sobre os limites da proteção de nomes de produtos que, com o tempo, se tornaram populares ou sinônimos de categorias inteiras.
Para o advogado Bernardo Drummond, sócio da área civil estratégica do Marcelo Tostes Advogados, a decisão está alinhada com a jurisprudência atual, que tem restringido a exclusividade de termos considerados descritivos ou de uso comum. “A Justiça tem entendido que marcas compostas por nomes genéricos ou pouco distintivos não devem impedir o uso desses termos por outras empresas, especialmente quando há diferenças visuais e gráficas entre os produtos”, afirma.
No caso da Kopenhagen, o tribunal entendeu que “Língua de Gato” é uma expressão que descreve o formato do chocolate — semelhante à língua de um gato (animal) — e que, portanto, não pode ser apropriada exclusivamente por uma única empresa. Para o advogado, isso reforça a importância de um cuidado redobrado com os elementos distintivos de uma marca.
“Quando a empresa utiliza uma marca mista, que combina palavras e elementos visuais, o grau de proteção pode ser afetado se os componentes nominativos forem considerados genéricos. A exclusividade, nesses casos, pode recair apenas sobre o conjunto gráfico completo”, explica Drummond.
O advogado ressalta ainda que, embora a decisão tenha gerado repercussão, ela não representa uma ruptura repentina, mas sim a continuidade de uma linha interpretativa que já vem sendo adotada pela Justiça brasileira. “O uso comum e repetido de determinados termos no mercado acaba esvaziando sua originalidade, e o Judiciário tende a não admitir monopólio sobre expressões que se tornaram corriqueiras.”
Apesar disso, Drummond acredita que a Kopenhagen ainda pode recorrer utilizando o conceito de secondary meaning (ou “significado secundário”), que é aceito pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). “Esse conceito reconhece que uma marca inicialmente genérica ou descritiva pode ganhar força distintiva com o tempo, caso o público associe aquela expressão diretamente à empresa. É possível que esse argumento seja usado nas instâncias superiores, desde que bem fundamentado e comprovado.”
Para outras empresas que possuem marcas ou produtos consagrados, o caso serve como alerta. Drummond recomenda que as estratégias de branding levem em consideração não apenas aspectos mercadológicos, mas também critérios jurídicos. “A melhor forma de proteger um nome que corre o risco de se tornar sinônimo de categoria é garantir uma identidade visual forte, com elementos gráficos autênticos, evitando qualquer margem de confusão com concorrentes”, orienta.
O advogado também aponta que a decisão pode gerar impactos no setor de chocolates e alimentos em geral, abrindo espaço para uma concorrência mais acirrada. “Existe o risco de um aproveitamento parasitário, no qual outras empresas tentem capturar o prestígio de uma marca estabelecida, o que pode comprometer a concorrência leal. Por isso, é fundamental que as marcas estejam atentas e bem assessoradas para proteger seus ativos intangíveis com segurança jurídica.”
Com a judicialização crescente de disputas envolvendo propriedade intelectual, casos como o da “Língua de Gato” mostram que o cuidado com a construção e manutenção de uma marca vai muito além do marketing — é uma questão estratégica para a longevidade e diferenciação no mercado.