Você não fez nada de errado – mas está sendo processado na OAB?

Sued Araújo Lima*

Receber uma notificação do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB informando sobre uma representação ética é um dos momentos mais difíceis na carreira de qualquer advogado.

E isso independe da experiência, notoriedade ou tempo de atuação: o impacto emocional é real.

Mais do que um processo, estamos falando de algo que atinge diretamente três pilares essenciais para o exercício da advocacia: habilitação profissional, reputação e confiança construída ao longo de anos.

E é justamente por isso que, mesmo quando o advogado está convicto de que não cometeu qualquer infração ética, o processo deve ser tratado com absoluta seriedade, técnica e estratégia.

  1. A falsa segurança da “inocência” — por que sua defesa ainda é indispensável

A principal armadilha que acomete advogados representados, sobretudo os que enfrentam essa situação pela primeira vez, é o argumento subjetivo da inocência:

“Mas eu não fiz nada de errado.”

Esse raciocínio, embora compreensível, não se sustenta juridicamente. O processo ético não avalia apenas intenção, mas atos, condutas, contextos e, sobretudo, provas.

Mesmo que não haja má-fé, a simples violação de norma pode configurar infração disciplinar.

O ônus da prova — da legalidade da conduta e da ausência de infração — é do representado, o que reforça a necessidade de uma defesa sólida, tecnicamente construída e bem fundamentada.

  1. As principais preocupações de quem é processado na OAB
  2. Temor pela carreira

A possibilidade de sanção (advertência, censura, suspensão ou até exclusão) é concreta. Ainda que a exclusão seja medida extrema, o medo de sofrer uma penalidade é legítimo.

  1. Repercussão profissional

Mesmo sendo um processo sigiloso (art. 72, §2º, EAOAB), em ambientes jurídicos menores ou em casos envolvendo clientes, a notícia da representação pode circular. Isso abala relações e compromete a imagem profissional antes mesmo de qualquer julgamento.

  1. Insegurança jurídica e desconhecimento do rito

A maioria dos advogados nunca lidou com processos disciplinares nem como parte, nem como defensor. Isso gera dúvidas sobre prazos, etapas, recursos e possibilidades reais de absolvição ou acordo.

  1. Impacto emocional e isolamento

O silêncio é comum. Muitos evitam comentar com colegas ou buscar ajuda por receio de exposição ou julgamento. Isso agrava a angústia e compromete a reação estratégica.

  1. Conheça o rito processual e seus direitos

O processo ético na OAB segue, em regra, as seguintes etapas:

  1. Representação e Admissibilidade – A presidência do TED verifica a presença de elementos mínimos (Art. 57, CED). Caso faltem requisitos formais, o arquivamento pode ser requerido.
  2. Notificação e Defesa Prévia – O advogado é citado para apresentar defesa no prazo de 15 dias úteis.
  3. Instrução – Produção de provas, depoimentos e manifestação de testemunhas. O relator elabora parecer com sugestão de sanção ou absolvição.
  4. Julgamento – Realizado por Turma Julgadora ou Câmara do TED, com direito à sustentação oral pelo representado ou seu defensor.
  5. Recurso – Ao Conselho Seccional e, se necessário, ao Conselho Federal, com efeito suspensivo garantido (Art. 77, EAOAB).

Dica: consulte o ementário da sua Seccional. Conhecer os precedentes e o posicionamento da banca julgadora é um diferencial estratégico.

  1. Evite atuar sozinho na própria defesa

Essa talvez seja a dica mais importante deste artigo.

Mesmo que o advogado possua domínio técnico e pleno conhecimento do direito, a condução da própria defesa em um processo disciplinar é emocionalmente desgastante e juridicamente arriscada.

A atuação defensiva exige:

  • Distanciamento emocional;
  • Leitura estratégica do processo;
  • Conhecimento profundo do regimento do TED;
  • Construção de teses defensivas baseadas em fatos, não apenas em argumentos legais genéricos.

Lembre-se: Terceirizar a defesa não é sinal de fraqueza — é medida de prudência.

  1. Trate o processo com seriedade — mas sem desespero

Cada caso tem suas nuances, e muitas representações resultam em arquivamento ou penalidades brandas, desde que haja uma atuação bem conduzida na defesa.

A serenidade é a primeira etapa de uma boa estratégia.

Tratar o processo com equilíbrio emocional, responsabilidade e discrição é fundamental.

Evite:

  • Comentários públicos;
  • Postagens em redes sociais sobre o processo;
  • Reações impulsivas contra cliente ou colegas.

Cuide da sua imagem — ela continua sendo um dos seus ativos mais valiosos.

  1. Teses defensivas possíveis mesmo sem “culpa”

Mesmo quando não há dolo, é possível defender-se com base em:

  • Ato atípico ou ausência de reprovabilidade ética;
  • Erro justificável pela complexidade do caso ou falha de terceiros;
  • Desvio de interpretação sem afronta direta ao EAOAB;
  • Irregularidades processuais (falta de notificação, ausência de despacho, vício formal).
  1. Considerações Finais

Enfrentar um processo ético-disciplinar é uma experiência tensa e emocionalmente exigente.

Contudo, com atuação jurídica especializada, clareza do rito processual, teses bem elaboradas e respeito às etapas legais, é possível enfrentar a representação com segurança e preservar sua trajetória profissional.

Desse modo, o processo ético não é uma sentença automática, mas sim uma oportunidade — e, muitas vezes, um teste de maturidade profissional.

*Sued Araújo Lima é sócio do escritório  Merola & Ribas Advogados. Especialista em Direito Público pelo Instituto Goiano de Direito. Foi Assessor da Presidência do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/GO.