Rivalidade entre torcida do Goiás e Flamengo acaba em morte de torcedor. Houve crime nas condutas da torcida do Goiás e na atitude do torcedor do Flamengo?

*Lucas Morais Souza

No dia 31 de outubro, no Estádio Serra Dourada, em Goiás, foi realizado o jogo de futebol, pelo campeonato Brasileiro da Série A, Flamengo e Goiás.

Após o encerramentos do jogo e das festividades, nas redondezas do estádio, alguns torcedores da Torcida Jovem do Goiás, estavam determinando que torcedores do Flamengo que utilizavam camisetas ou bandeiras de seu clube de futebol as retirassem mediante violência e/ou grave ameaça.

Em uma destas ações, os torcedores do Goiás abordaram uma vítima, Policial Civil, nesse ato, o policial, buscando resguardar a sua integridade física, efetuou um disparo de arma de fogo contra aquela pessoa, que infelizmente veio a óbito.

O questionamento é, há crime nas condutas perpetrados pelos integrantes da torcida organizada Força Jovem do Goiás? Há crime na conduta praticada pelo Policial Civil?

O respectivo artigo, longe de exaurir toda a temática do Direito Penal, visa apenas analisar de maneira imparcial a luz do Direito Penal, se há crime em ambas as condutas. Nesse sentido, o ato dos torcedores do Goiás, ao exigirem que os torcedores do Flamengo forçadamente retirassem suas camisetas, bandeiras etc., mediante violência e/ou grave ameça, fazendo um juízo de subsunção, pode ser enquadrada no tipo penal do art. 146 do Código Penal.

O art. 146 do Código Penal preceitua que aquele que exige que alguém faça o que a lei não manda ou deixe de fazer o que a lei permite, mediante violência ou grave ameaça, poderá responder pelo crime de constrangimento ilegal.

No caso em comento, os torcedores utilizaram de violência e grave ameaça, obrigando torcedores do Flamengo a deixar de fazer algo que a lei permite, utilizar camisetas ou bandeiras de seus clubes.

Logo, as condutas da Torcida Jovem pode ser considerada crime nos termos do Artigo 146 do Código Penal, com pena detenção de até um ano.

É importante salientar que a pena da presente conduta pode ser duplicada se houver a reunião de três ou mais pessoas para a prática desse crime ou utilização de arma nos termos do parágrafo 1 do art. 146 do Código Penal.

Outro questionamento que se pode fazer é, caso ocorra lesão corporal nas vítimas, os autores responderão apenas pelo delito de constrangimento ilegal?

Por expressa previsão legal, nos termos parágrafo 2 do art. 146 do Código Penal, os autores do crime de constrangimento ilegal ainda responderão pelos crimes de lesão corporal, art. 129 do Código Penal, podendo ser leve, grave ou gravíssima a depender das circunstâncias. Noutro giro, e na conduta do policial civil há crime?

Segundo as redes de comunicações, vários torcedores da torcida do Goiás estavam fazendo exigências mediante violência ou grave ameaça, contra aquele Policial e seu grupo de amigos, desta feita, a partir do momento que alguém sofre uma injusta agressão, ou seja, aquela que não foi provocada por sua vontade, está autorizado a utilizar moderadamente dos meios necessários a afastar aquela agressão, nos termos do art. 25, do Código Penal.

No caso em tela, mesmo após o policial civil, se identificar e sacar sua arma, as injustas agressões continuaram, sendo assim, efetuou apenas um disparo de arma de fogo, buscando resguardar a sua integridade física e de seus amigos, mas, foi um disparo fatal.

Dessa maneira, pelas informações divulgadas até o presente momento, a conduta do policial está abarcada pela legítima defesa, nos termos do art. 25 do Código Penal, no entanto, caso seja apurado que o mesmo extrapolou o seu direito de legítima defesa, poderá ser criminalmente responsável, nos termos do art. 23, parágrafo único, do Código Penal, pelo excesso punível.

Posto isto, devemos refletir, independentemente de tipificação criminal das condutas, é legítimo o ato de cada torcedor ter o seu time do coração.

Os estádios de futebol são lugares para se frequentar com a família.

É muito bonito ver o show que cada torcida, por amor ao clube do coração, proporciona aos telespectadores, e ajuda o seu time, mas, toda e qualquer rivalidade deve se encerrar nas quatro linhas do campo.

O respeito a adversidade deve estar em todos os lugares, que cada torcida faça o mais bonito possível, mas dentro do campo, e do lado de fora, seja um lugar de paz e respeito.

*Lucas Morais Souza é professor, advogado, presidente da Comissão de Direito Criminal da Ordem dos Advogados do Brasil Subseção de Caldas Novas, sócio fundador do Escritório de Advocacia Morais & Paixão.