Reabertura do Programa de Renegociação de Dívidas com a União é oportunidade para empresas em recuperação judicial quitarem débitos

*Gabryella Sales da Costa

Desde meados de fevereiro de 2020, infelizmente, o Brasil entrou no ranking dos países acometidos pela disseminação em massa do novo coronavírus e, deste então, uma grave crise econômico-financeira se instalou no país, agravando ainda mais a possibilidade de pessoas físicas e jurídicas saldarem seus débitos tributários junto a Fazenda Nacional.

Diante do cenário enfrentado pelo país, objetivando estimular a regularidade relativa dos débitos inscritos em Dívida Ativa da União e, consequentemente, permitir a retomada da atividade produtiva após os efeitos da pandemia causada pelo coronavírus, na data de 01 de outubro de 2020, foi publicada a Portaria PGFN nº 21.562, da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional – PGFN, que instituiu o Programa de Retomada Fiscal.

O Programa de Retomada Fiscal reuniu um conjunto de medidas adotadas para oportunizar o contribuinte obter certidão negativa de débito, suspender inscrição no CADIN, suspender apresentação ou sustar protesto de CDA, suspender execuções fiscais e os respectivos pedidos de bloqueio judicial de bens, suspender leilões e demais atos de cobranças administrativas e judiciais, de modo que alcançou em média a negociação de dívidas da ordem de R$ 81 bilhões, em aproximadamente 270 mil acordos realizados até a data de seu encerramento em dezembro de 2020 .

Desse modo, em razão do excelente resultado obtido com o programa em 2020 e com a finalidade de minimizar os efeitos nocivos que a pandemia vem causando à economia brasileira, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional decidiu reabrir o Programa de Retomada Fiscal por meio da publicação da Portaria PGFN nº 2.381/2021, permitindo a negociação de todos os débitos que vierem a ser inscritos em dívida ativa da União até 31 de agosto de 2021.

De acordo com a nova Portaria todos os contribuintes, sejam pessoas físicas ou jurídicas, incluindo as empresas em recuperação judicial, podem se beneficiar negociando suas dívidas nas modalidades de transação extraordinária, transação excepcional, transação no contencioso tributário de pequeno valor e transação excepcional para débitos do Simples Nacional, as quais estão disponíveis para adesão através do Portal Regularize (https://www.regularize.pgfn.gov.br/), no período de 15 de março até 30 de setembro de 2021.

De acordo com o Portal Regularize, o programa prevê o alongamento dos prazos de pagamento em até 145 meses e concessão de descontos de até 70%.

Na modalidade extraordinária há possibilidade de parcelamento do débito por meio de pagamento de 1% do valor total do débito em 03 meses e o restante em até 81 meses, ou de até 142 meses, em caso de contribuinte pessoa física, empresários individuais, microempresas, empresas de pequeno porte, instituições de ensino, Santas Casas de Misericórdia e Cooperativas.

A modalidade excepcional permite o pagamento em até 72 meses, com descontos de até 100% sobre o valor de multas, juros e encargos, observando o limite de 50% do valor total do débito e a capacidade de pagamento do contribuinte, podendo o prazo ser estendido para 133 meses e o limite de desconto para 70% do total da dívida.

Por sua vez, a transação no contencioso tributário de pequeno valor permite que o contribuinte negocie dívidas de até 60 salários-mínimos com descontos que variam de 30% a 50% do valor total.

A entrada em vigor da Lei 14.112/2020 ,em 23 de janeiro de 2021, teve considerável contribuição para a reabertura do Programa de Retomada Fiscal por intermédio da nova Portaria, tendo em vista as significantes mudanças aplicadas na Lei de Recuperação Judicial e Falências (Lei 11.101/2005), bem como, na legislação tributária federal.

A Lei 14.112/2020 se destaca pelos novos dispositivos trazidos para resolução do passivo fiscal das empresas em recuperação judicial, tais como: alterações nas formas de parcelamento, possibilidade de negociação dos débitos inscritos em dívida ativa e aproveitamento do prejuízo fiscal; merecendo destaque a alteração promovida nos artigos 10-A e 10-C da Lei 10.522/2002.

Por meio do artigo 10-A da legislação supramencionada passou a aceitar que empresas em recuperação judicial parcelem todos os seus débitos com a Fazenda Nacional, ainda que não vencidos até a data do pedido de recuperação judicial, de natureza tributária ou não, inscritos ou não em dívida ativa, em até 120 prestações mensais. E, mediante o artigo 10-C do mesmo dispositivo legal, empresas com o processamento do pedido de recuperação judicial já deferido podem, de forma alternativa, submeterem à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional proposta de transação relativa a créditos inscritos em dívida ativa da União, nos termos da Lei 13.988/2020.

Desse modo, a publicação da Portaria PGFN 2.381/2021, complementada pela Portaria PGFN 2.382/2021, possui o objetivo de viabilizar e regulamentar as alterações trazidas pela Lei 14.112/2020.

O inciso VII do artigo 9º da Portaria PGFN 2.381/2021 dispõe que “são modalidades de transação excepcional na cobrança da dívida ativa da União para pessoas jurídicas em processo de recuperação judicial, pagamento, a título de entrada, de valor mensal equivalente a 0,334% (trezentos e trinta e quatro centésimos por cento) do valor consolidado dos créditos transacionados, durante 12 (doze) meses, e o restante pago com redução de até 100% (cem por cento) do valor dos juros, das multas e dos encargos-legais, observado o limite de até 70% (setenta por cento) sobre o valor total de cada crédito objeto da negociação, em até 108 (cento e oito) parcelas mensais e sucessivas, sendo cada parcela determinada pelo maior valor entre 1% (um por cento) da receita bruta do mês imediatamente anterior, apurada na forma do art. 12 do Decreto-Lei nº 1.598/77, e o valor correspondente à divisão do valor consolidado pela quantidade de prestações solicitadas.”

Por sua vez, o artigo 3º da Portaria PGFN 2.382/2021 complementa que são objetivos dos instrumentos de negociação de débitos inscritos em dívida ativa da União relativos a contribuintes em processo de recuperação judicial:

I) viabilizar a superação da situação transitória de crise econômico-financeira do sujeito passivo, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora e do emprego dos trabalhadores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica;
II) assegurar que a cobrança dos créditos inscritos em dívida ativa seja realizada de forma a equilibrar os interesses da União e dos contribuintes em processo de recuperação judicial;
III) assegurar que a cobrança de créditos inscritos em dívida ativa seja realizada de forma menos gravosa para União e para os contribuintes em processo de recuperação judicial;
IV) assegurar aos contribuintes em processo de recuperação judicial nova chance para retomada do cumprimento voluntário das obrigações tributárias correntes.

Destarte, levando em consideração que a maior dificuldade de uma empresa em recuperação judicial é a regularização de seus débitos tributários, tem-se que a Reabertura do Programa de Retomada Fiscal por meio da Portaria PGFN nº 2.381/2021, e sua complementação para o âmbito da recuperação judicial por meio da Portaria PGFN nº 2.382/2021, é mais um mecanismo adotado pelo Governo Federal para viabilizar a preservação dos benefícios econômicos e sociais decorrentes da atividade empresarial, de modo a contribuir para o soerguimento empresarial e econômico das empresas em crise.

Portanto, assim como as alterações proporcionadas pela Lei 14.112/2020 na Lei de Recuperação Judicial e Falência, bem como, na legislação tributária federal, a Reabertura do Programa de Retomada Fiscal pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, visa impactar de forma positiva as empresas que estão passando por crise econômico-financeira capaz de justificar um pedido de Recuperação Judicial, ou, até mesmo de autofalência, pois, proporciona a regularidade fiscal dos contribuintes, como forma de estímulo da economia e recuperação de créditos tributários, de modo a proporcionar recuperação de caixa para a União Federal e possibilitar a manutenção da fonte produtora e do emprego dos trabalhadores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.

*Gabryella Sales da Costa é graduada em Direito pelo Centro Universitário de Goiás – Uni-Anhanguera, pós-graduada em Direito Civil e Processo Civil pelo Instituto Proordem, especialista em Direito Notarial, Registral e Documentação Imobiliára, advogada no escritório Murillo Lobo Advogados Associados na área de Recuperação Judicial de empresas.