Questões sobre o uso de agrotóxicos no Brasil e a sua regulação legal

Fernanda Santos*

O uso excessivo ou indevido de agrotóxicos nos produtos agrícolas produzidos no Brasil vem sendo objeto de estudos e reivindicações de atuação dos órgãos de Defesa do Consumidor e do Meio Ambiente, sendo certo a atuação em garantia da Segurança Alimentar e Nutricional, de modo a evitar a produção, publicidade e comercialização de alimentos impróprios e nocivos à saúde da população (BRASIL, 2023, s/p).

As questões mais relevantes na área da Defesa do Consumidor referem-se ao uso de agrotóxicos não autorizados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvis), ou com limites de resíduos acima dos resíduos regulamentares, detectados em amostras de alimentos expostos à venda (em geral frutas, legumes, verduras e grãos).

A Anvisa desenvolveu o chamado Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (Para), com o objetivo de avaliar e promover a qualidade dos alimentos em relação ao uso de agrotóxicos, publicando relatórios públicos periodicamente. Os relatórios anuais do Para são indicadores da qualidade dos alimentos adquiridos no mercado varejista e consumidos pela população, e reconhecidos por vários setores da sociedade.

O Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento(Mapa) possui diretrizes e ações que constam do Plano Nacional de Controle de Resíduos e Contaminantes em Produtos de Origem Vegetal (PNCRC/Vegetal, conforme Instrução Normativa DAS/MAPA n. 42, de 31/12/08). E este tem por objetivo monitorar a qualidade dos produtos de origem vegetal produzidos em todo o território nacional, em relação à ocorrência de resíduos de agrotóxicos e contaminantes químicos e biológicos. São monitorados produtos destinados ao mercado interno e externo.

A Lei de Agrotóxicos e Afins – Lei nº 7.802/89 estabelece que os agrotóxicos somente poderão ser utilizados no país se forem registrados em órgão federal competente, de acordo com as diretrizes e exigências dos órgãos responsáveis pelos setores da saúde, do meio ambiente e da agricultura.

O registro para novos produtos agrotóxicos só será concedido se a sua ação tóxica sobre o ser humano e o meio ambiente for comprovadamente igual ou menor do que a daqueles já registrados para o mesmo fim. É proibido o registro de agrotóxicos, seus componentes e afins, dentre outras hipóteses, para os quais não haja antídoto ou tratamento eficaz no Brasil; que revelem características teratogênicas, carcinogênicas ou mutagênicas, de acordo com os resultados atualizados de experiências da comunidade científica; que provoquem distúrbios hormonais, danos ao aparelho reprodutor, de acordo com procedimentos e experiências atualizadas na comunidade científica; e cujas características causem danos ao meio ambiente.

O Decreto nº 4.074/02, que regulamenta a Lei 7.802/89, estabeleceu as competências para os três órgãos envolvidos no registro: a Anvisa, vinculada ao Ministério da Saúde; Ibama, vinculado ao Ministério do Meio Ambiente; e o Mapa. A primeira A tem atribuição de avaliar e classificar toxicologicamente os agrotóxicos. Os resultados dos estudos toxicológicos são utilizados para calcular o parâmetro de segurança que consiste na Ingestão Diária Aceitável (IDA) de cada ingrediente ativo.

A Constituição Federal (art. 196) prevê que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (BRASIL, 2023, s/p).

É de atribuição do Sistema Único de Saúde (SUS): “controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e substâncias de interesse para a saúde e participar da produção de medicamentos, equipamentos, imunobiológicos, hemoderivados e outros insumos” (CF, art. 200, I) (BRASIL, 2023, s/p); “executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador” (CF, art. 200, II) (Brasil, 2023, s/p); “fiscalizar e inspecionar alimentos, compreendido o controle de seu teor nutricional, bem como bebidas e águas para consumo humano” (CF, art. 200, VI) (Brasil, 2023, s/p); e “participar do controle e fiscalização da produção, transporte, guarda e utilização de substâncias e produtos psicoativos, tóxicos e radioativos” (CF, art. 200, VII) (BRASIL, 2023, s/p).

Na agricultura moderna, os agrotóxicos têm sido utilizados de forma intensiva, visando equacionar os problemas proporcionados por organismos e pragas. Embora esses produtos sejam de fácil aplicabilidade e apresentem resultados imediatistas, o seu emprego contínuo e, na maioria das vezes, de forma errônea tem acarretado impactos severamente negativos para o homem, animais e ambiente.

No entanto, quando estes são aplicados na agricultura, seguindo todas as normas de uso e os cuidados que lhes são peculiares torna-se um importante aliado como método de controle, em especial no contexto do manejo integrado de praga. O Decreto nº 4.074/02 que regulamentou a Lei 7.802/89, que dispõe sobre a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem e rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercialização, a propaganda comercial, a utilização, a importação, a exportação, o destino final dos resíduos e embalagens, o registro, a classificação, o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos, seus componentes e afins.

Com referência às embalagens dos agrotóxicos e afins, o art. 44 da Lei nº 7.802/89 (BRASIL, 2023, s/p), trata como as embalagens deverão obedecer aos seguintes requisitos:

  1. ser projetadas e fabricadas de forma a impedir qualquer vazamento, evaporação;
  2. perda ou alteração de seu conteúdo e de modo a facilitar as operações de lavagem, classificação, reutilização, reciclagem e destinação final adequada;
  3. ser imunes à ação de seu conteúdo ou insuscetíveis de formar com ele combinações nocivas ou perigosas;
  4. ser resistente em todas as suas partes e satisfazer adequadamente às exigências de sua conservação;
  5. ser providas de lacre ou outro dispositivo externo, que assegure plena condição de verificação visual da inviolabilidade da embalagem;
  6. as embalagens rígidas deverão apresentar, de forma perfeita e irremovível em local de fácil visualização, exceto na tampa, o nome da empresa titular do registro e advertências quanto ao não reaproveitamento da embalagem.
  7. De acordo com o artigo 84 da lei 7.802, as responsabilidades administrativa, civil e penal pelos danos causados à saúde das pessoas e ao meio ambiente, em função do descumprimento do disposto na legislação pertinente aos agrotóxicos, seus componentes e afins, recairão sobre:
  8. o registrante que omitir informações ou fornecê-las incorretamente;
  9. o produtor, quando utilizar agrotóxicos, seus componentes e afins em desacordo com as especificações constantes do registro;
  10. o produtor, comerciante, usuário, profissional responsável e prestador de serviços que opuser embaraço à fiscalização dos órgãos competentes ou que não promover a destinação final das embalagens vazias de acordo com a legislação;
  11. o profissional que prescrever a utilização de agrotóxicos e afins em desacordo com as especificações técnicas;
  12. o comerciante, quando efetuar a venda sem o respectivo receituário, em desacordo com sua prescrição ou com as recomendações do fabricante e dos órgãos registrantes e sanitário-ambientais;
  • o comerciante, empregador, profissional responsável ou prestador de serviços que deixar de promover as medidas necessárias de proteção à saúde ou ao meio ambiente;
  1. o usuário ou prestador de serviços, quando proceder em desacordo com as recomendações do fabricante ou dos órgãos sanitário-ambientais;
  2. as entidades públicas ou privadas de ensino, assistência técnica e pesquisa, que promoverem atividades de experimentação ou pesquisa de agrotóxicos, seus componentes e afins em desacordo com as normas de proteção da saúde pública e do meio ambiente (BRASIL, 2023, s/p).

Pela Lei 7.802/89, o termo agrotóxico e afins é definido como os produtos e agentes de processos físicos, químicos ou biológicos, destinados ao uso no setor de produção, armazenamento e beneficiamento de produtos agrícolas, nas pastagens, na proteção de florestas nativas ou plantadas, e de outros ecossistemas, como também em ambientes urbanos, hídricos e industriais, cuja finalidade seja alterar a composição da flora ou da fauna, a fim de preservá-las da ação danosa de seres vivos considerados nocivos, assim como as substâncias e produtos empregados como desfolhantes, dessecantes, estimuladores e inibidores de crescimento (Brasil, 2023, s/p).

*Fernanda Santos é bacharela em direito, especialista latu sensu em Direito do Consumidor pela Universidade Federal de Goiás – UFG, especialista latu sensu em Direito Penal e Direito Processual Penal pela Rede Atame, especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil pela Faculdade Legale, especializanda em Docência Universitária pela Faculdade Serra Geral, entrevistadora do DM Jurídico, foi entrevistadora do Arena Criminal WEB, pela Rádio MID, capacitada em práticas colaborativas pelo Instituto Brasileiro de Práticas Colaborativas – IBPC em 2018, capacitada em administração de conflitos e negociação pelo Centro Universitário Faveni em 2021, controller jurídico  do Grupo Pitterson Maris Advogados Associados, parecerista em matéria cível, filiada na Associação Brasileira de Juristas pela Democracia – ABJD – Núcleo Goiás, e da Associação Vida e Justiça – Associação Nacional em Apoio e Defesa dos Direitos das vítimas da COVID-19 – Núcleo Goiás, Vice presidente da Rede de Ação e Reação Internacional – RARI Núcleo Goiás (2021/2023), foi articulista do jornal Perspectiva Lusófona em Angola (2010/2012), articulista do jornal Diário da Manhã (2009/2019), com publicações veiculadas no site Opinião Jurídica (2008/2011) no site Rota Jurídica em Goiânia-GO (2014/2017), e no Jornal O Hoje (2022/2023), em Goiânia-GO, pela Revista Consulex (2014/2016), e com artigos publicados pela Revista Conceito Jurídico, e Prática Forense pela Editora Zakarewicz (2019). Foi membro efetivo da Comissão da Advocacia Jovem – CAJ, da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Goiás – OAB/GO – Gestão 2013/2015.

 REFERÊNCIAS:

BRASIL. Lei nº 7.802, de 11 de julho de 1989. Dispõe sobre a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem e rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercialização, a propaganda comercial, a utilização, a importação, a exportação, o destino final dos resíduos e embalagens, o registro, a classificação, o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos, seus componentes e afins, e dá outras providências. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7802.htm>. Acesso em: 04 abr 2023.

______. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 04 abr 2023.

______. Decreto nº 4.074, de 4 de janeiro de 2002. Regulamenta a Lei no 7.802, de 11 de julho de 1989, que dispõe sobre a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem e rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercialização, a propaganda comercial, a utilização, a importação, a exportação, o destino final dos resíduos e embalagens, o registro, a classificação, o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos, seus componentes e afins, e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/d4074.htm>. Acesso em: 04 abr 2023.

______, EMBRAPA. José Adalberto de Alencar. Sistema de Produção – Cultivo da Videira. Disponível em: <http://www.cpatsa.embrapa.br:8080/sistema_producao/spuva/agrotoxicos.html> Acesso em 04 abr 2023.