Rodrigo Siti*
Sabe-se que, em regra, os documentos relacionados ao objeto da ação devem ser juntados na fase postulatória. No entanto, o legislador ordinário admitiu, em algumas circunstâncias, a excepcional juntada tardia de provas documentais, com a finalidade de assegurar, primordialmente, o direito ao contraditório. O que ocorre, não raramente, nesse contexto, é a utilização indevida – e até mesmo maliciosa – dessa prerrogativa, estendendo-a para além de seus limites e, por conseguinte, atentando-se contra o princípio que a ensejou e à almejada lealdade processual.
Insculpida no artigo 435, do Código de Processo Civil (CPC), a garantia viabiliza o pleno exercício do contraditório, uma vez que possibilita a inserção, ainda que extemporânea, de documentos úteis à instrução probatória, quando dizem respeito a fatos ocorridos posteriormente, mas que guardam relação com o objeto da lide.
Verifica-se, até agora, que a intenção legislativa se dirigiu aos acontecimentos novos. No entanto, o diploma processual também consagrou a juntada “atrasada” de documentos relacionados a eventos sucedidos à época da inicial ou da contestação, desde que, justificadamente, demonstrado o seu desconhecimento, inacessibilidade ou indisponibilidade àquele tempo.
Destaca-se, então, que, não obstante as condições estabelecidas pelo CPC, a jurisprudência do Colendo (C.) Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem se guiado de modo mais abrangente, como pode ser verificado no teor do REsp 1.721.700/SC, de Relatoria do Ministro (Min.) Ricardo Villas Bôas Cueva, em que se admitiu a juntada de novos documentos, inclusive na fase recursal, desde que não sejam indispensáveis à propositura da ação; não tenham sido ocultados dolosamente; e seja observado o contraditório.
Pois bem.
Adentrando à posição do Superior Tribunal, no que tange ao exercício do contraditório, não há maiores novidades, dispensando, portanto, comentários. Já acerca dos demais (não sejam indispensáveis à propositura da ação e não tenham sido ocultados dolosamente), contudo, há que se acautelar durante a análise.
Isso, porque, ao pensar na indispensabilidade dos documentos, muitas das vezes, tem-se, de imediato, a conclusão de inércia da inicial, pressuposto processual objetivo intrínseco, que levaria à extinção do feito sem resolução do mérito. Entretanto, em julgados mais recentes, inclusive, no REsp 1.632.673/MG, de Relatoria do Min. Raul Araújo, visualiza-se a especialização do conceito: às condições da ação; aos pressupostos processuais; e, ainda, ao vínculo direto ao objeto da demanda, à existência ou extensão da relação jurídica estabelecida, que é objeto da ação.
A meu ver, o último quesito é, realmente, o gerador de dúvidas sobre a matéria, pois se leva em consideração que, por óbvio, somente serão juntados, aos autos, documentos que se vinculem ao objeto da ação.
Entendo que o exame esteja ligado à fundamentabilidade daquele documento para a constituição do direito ou alegação da defesa. Em outras palavras, se a presença posterior do documento for capaz de mudar o cenário antes posto, ensejando prejuízo a alguma das partes, mesmo com o exercício do contraditório sobre ele, impera a sua inadmissibilidade.
Inclusive, reforçando a tese, em outubro de 2022, a Quarta Turma do C. STJ assim se posicionou sobre o tema, ao julgar o REsp 1776916/SP, de Relatoria do Min. Luis Felipe Salomão, e extinguir os famigerados processos sobre complementação de ações da Telesp com valor superior a 2 bilhões de reais.
Por outro lado, sobre a ausência de má-fé na ocultação, requisito essencialmente negativo, previsto no dispositivo processual, frisa-se que o cenário em comento vai em contrapartida à regra geral, sendo ônus da parte que requer a juntada tardia, assim como a justificativa por tal.
Em razão disso, pode-se afirmar que o Superior Tribunal, inicialmente, acrescentou um requisito – a indispensabilidade –, que já se encontrava previsto no CPC – art. 434, do CPC –, mas não no dispositivo que garante a prerrogativa – art. 435, do CPC –, e, mais tarde, tão somente o esmiuçou, delimitando sua abrangência, diante da necessidade de pacificação do tema.
*Rodrigo Siti Matos de Oliveira é acadêmico de Direito e estagiário