*Alessandra Paes Barreto Arraes
O direito de greve é garantido a todo trabalhador, público ou privado, a fim de exigir seus direitos, bem como buscar melhorias nas condições de trabalho, sendo definido pela legislação como a suspensão coletiva, temporária e pacífica, total ou parcial, de prestação pessoal de serviços ao empregador.
Para o trabalhador privado, o direito está garantido no artigo 9º da Constituição Federal e previsto também na Lei 7.783/89, que dispõe sobre o exercício do direito de greve, definindo as atividades essenciais e regulando o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.
Já para o trabalhador da Administração Pública, embora haja previsão constitucional do direito de greve no artigo 37º, inciso VII, referida disposição é norma de eficácia limitada, isto é, depende de regulamentação infraconstitucional para ser aplicada.
Considerando a omissão legislativa, já que inexiste lei específica, inúmeros mandados de injunção foram distribuídos para suprir a lacuna e possibilitar aos servidores públicos o exercício do direito de greve. No julgamento dessas ações, o Supremo Tribunal Federal definiu que, enquanto houver a omissão legal, serão aplicadas aos servidores públicos as disposições da Lei 7.783/89.
Contudo, tendo em vista que na Administração Pública existem os imperativos da continuidade dos serviços públicos e da supremacia do interesse público sobre o privado, de modo que todo serviço público pode ser considerado como essencial, há certos critérios que devem ser observados a fim de que seja considerado legal o movimento paredista.
Dentre eles, destacam-se a necessidade de comunicação formal à Administração com antecedência mínima de 72 horas da paralisação, a demonstração de frustração da negociação prévia e a paralisação parcial, de forma que seja assegurado o funcionamento dos serviços essenciais em cota mínima, garantindo, como dito, a continuidade da prestação do serviço público.
No tocante aos efeitos da paralisação, por se tratar de suspensão do vínculo funcional, a Administração Pública poderá descontar os dias não trabalhados, cabendo acordo para compensação desses dias. Todavia, o desconto será indevido se for demonstrado que a greve ocorreu em virtude de conduta ilícita do poder público.
Mas, embora haja a possibilidade de paralisação dos serviços pelos servidores públicos, existem posicionamentos divergentes do Poder Judiciário acerca da legalidade do exercício do direito de greve em determinados setores do serviço público.
Tal fato se dá em razão de o Supremo Tribunal Federal já ter se manifestado no sentido de que seria proibida a paralisação nos casos de servidores públicos que atuam em serviços essenciais que são imprescindíveis à preservação da ordem pública, da administração da justiça, da exação tributária e da saúde, a fim de que não haja prejuízo para a sociedade.
Inclusive, em repercussão geral, a Corte Suprema entendeu que é vedado aos policiais civis e a todos os servidores públicos que atuem diretamente na área de segurança pública o exercício do direito de greve.
Com isso, os demais órgãos do Poder Judiciário vêm adotando a tese para proibir a greve nos setores mencionados.
No momento atual, em que vivemos a pandemia da Covid-19, esse posicionamento vem ganhando força especialmente com relação ao setor da saúde pública, tendo em vista o crescimento exponencial da demanda do serviço, de modo que a paralisação, ainda que parcial, poderia comprometer gravemente o atendimento da população, causando prejuízos irreversíveis ao interesse público.
Embora compreensível, tal posição prejudica sobremaneira os profissionais envolvidos que se veem privados da ferramenta mais poderosa para garantir o respeito aos seus direitos.
Assim, a fim de encontrar um equilíbrio, é necessário avaliar caso a caso, considerando as especificidades de cada setor para que seja possível, ao mesmo tempo, garantir à população o fornecimento do serviço público de forma efetiva e permitir que os trabalhadores públicos se valham do direito assegurado pela Carta Magna.
*Alessandra Paes Barreto Arraes é bacharel em Direito pela Universidade Federal Fluminense (UFF), desde 2012. Ela é especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Cândido Mendes (UCAM-RJ), em 2014, e inscrita na Ordem dos Advogados do Brasil sob o n° 428.020.