Na Praça da Bíblia, livro sagrado que narra a história de Jesus, um advogado é torturado pela PM

*Glauco Felipe

“Meus filhinhos, estas coisas vos escrevo, para que não pequeis; e, se alguém pecar, temos um Advogado para com o Pai, Jesus Cristo, o justo.” 1 João 2:1.

Ironicamente, porém, na cidade de Goiânia, nesta última quarta-feira (21), na praça dessa mesma Bíblia que narra a história desse mesmo Jesus Cristo, o maior pacifista da humanidade, e nosso advogado junto a Deus, um outro colega, Dr. Orcélio Ferreira Júnior, foi brutalmente torturado por um policial militar do Grupamento de Intervenção Rápida e Ostensiva (Giro).

Dr. Orcélio estava nas proximidades da praça com seus próprios pais. Quando percebeu uma abordagem excessiva e invariavelmente violenta da PM-GO, reagiu na defesa de um popular, um ninguém, um “flanelinha”… Certamente, sem procuração, sem honorários, sem o direito de se identificar como advogado, mas, apenas com a típica reação humana às injustiças: imobilizado, frente às câmeras e aos pais, agonizou os golpes mais covardes do trio de facínoras sem escrúpulos legitimados pela farda preta do Estado…

Depois da cena, o agressor e a vítima foram encaminhados para a Delegacia de Polícia. A vítima, pasmem: também respondendo a queixas de crimes dos mais levianos: desobediência; desacato; e essas coisas características dos abusadores com inclinações tiranas… Infelizmente, até o presente momento, nenhuma autoridade minimamente responsável veio a público pedir desculpas à sociedade. Nem o chefe da PM; ou secretário da segurança pública; governador; ninguém! O que parece estar se confirmando com o silêncio ensurdecedor é que Goiás ainda é um estado muito provinciano. Onde os líderes políticos mais se parecem com os antigos coronéis que fazem dos integrantes da segurança pública seus legítimos capangas ou jagunços!

A sensação que temos é que a civilidade não existe mais. Isso é muito mais perplexo do que o sentimento de revolta. É preocupante, bárbaro, despótico. Em qualquer lugar sério, o governador e o secretário de segurança pública já teriam no mínimo pedido desculpas e sugerido ao Parlamento a colocação de uma coleira nesses perversos. Ou, no mínimo, uma câmera em seus coletes, como já vem sendo realizado no Rio de Janeiro e em São Paulo. Mas, o que se faz aqui é apenas o culto à morte e a veneração à violência. Algo contraproducente, absurdo, desumano, anticristo e apocalíptico.

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, entidade de classe da qual pertenço, agendou ato de desagravo no qual certamente devo comparecer, se até lá minha síndrome do pânico assim me permitir. É que nesse cenário implacável de truculência, a gente fica com medo de ser gente. Será que vamos encontrá-los nos vigiando às ruas? Será que vão levantar contra nós o tacão inveterado do autoritarismo? Quem de nós será o próximo? à tortura? ou à morte? Alguém assegura que o agressor foi pelo menos suspenso ou tirado das ruas? O advogado apanhou. A sociedade sofre.

*Glauco Felipe é advogado