Multa cominatória e indenização: possibilidade de cumulação

*Isabella Martins

Nota-se, não poucas vezes, a dificuldade que o Judiciário apresenta diante do descumprimento de suas determinações. É notória a existência de situações em que as partes, em grande parte os réus, agem de forma a obstar o andamento do processo. Diante disso – e do princípio da efetividade da tutela jurisdicional – há previsão legal de providências que o juiz detém, capazes de compulsar a efetivação daquilo que foi determinado.

Astreintes, ou multa cominatória, é uma das medidas destinadas a impelir o réu ao cumprimento de decisão judicial. Nesse caso, a penalidade refere-se ao pagamento de valor arbitrado pelo juízo em caso de inexecução de ordem estabelecida. Quanto ao valor, há ainda a possibilidade de ser progressivo a medida em que a parte desatende a decisão judicial, com o objetivo de “pesar no bolso” até o momento em que passa-se a cumprir o estipulado.

A verdade é que a intenção das astreintes não é que o compelido pague a multa, mas que deixe de fazê-la em virtude da efetivação do que lhe foi estabelecido, ou seja, cumpra com a obrigação de fazer ou não fazer. Quanto à multa, conforme disposto no art. 537 do Código de Processo Civil, esta pode ser aplicada em vários momentos processuais, desde as tutelas até a execução e não necessita de requerimento, o que permite que seja decretada de ofício pelo juiz.

A dúvida paira quanto à possibilidade de cumulação entre as astreintes e uma superveniente indenização relativa ao mesmo fato. O questionamento se dá devido argumentação, acerca da fixação de multa por descumprimento de ordem judicial ser óbice à condenação por indenização em razão da inexecução da mesma decisão, quando em demanda envolvendo as mesmas partes.

A título de exemplificação, tome-se o caso de cadastro indevido em arquivo de inadimplentes no qual foi fixada multa cominatória para retirada do nome, mas que o responsável não executou a medida. Da narrativa, poder-se-ia concluir pelo bis in idem em caso de condenação por indenização em situação que as astreintes já fossem capazes de provocar dispêndio relativo às mesmas partes e às mesmas circunstâncias.

Ocorre que, em contrapartida à multa, que possui cunho coercitivo, a indenização visa reparar o abalo moral suportado pela vítima do ato ilícito de terceiro e que atinja a dignidade da pessoa humana. Percebe-se, assim, que os institutos possuem natureza jurídica distintas. As astreintes têm finalidade tão somente compulsória, enquanto que a indenização apresenta caráter reparatório a fim de alcançar o equilíbrio, o que torna possível a cumulação dos institutos.

O próprio Código de Processo Civil, em seu art. 500, prevê que a indenização pode ser arbitrada mesmo quando já tiver sido fixada multa para compelir o réu ao cumprimento de obrigação. A propósito, o Superior Tribunal de Justiça proferiu acórdão no REsp 1689074, em outubro de 2018, no qual consolidou entendimento quanto à possibilidade de cumulação dos institutos.

*Isabella Martins, advogada civilista, associada ao escritório GMPR Advogados.