Instruções da Receita Federal para declaração de bitcoin

*Cinthya Imano Vicente Ribeiro

O Bitcoin teve início em um trabalho denominado Bitcoin: a peer-to-peer electronic cash system apresentado em 2008, em um grupo de discussão sobre criptografias, por uma pessoa de pseudônimo Satoshi Nakamoto, denominação esta que até hoje é contestada, visto que não se sabe se esse criador é um inventor ou um grupo de inventores, havendo apenas suposições sobre quem seja seu real criador.

Antes dessa revolução, havia moeda digital, mas Bitcoin é a primeira moeda digital confiável e, atualmente, a mais conhecida, uma vez que solucionou problemas matemáticos e de criptografia e, portanto, de segurança, razão pela qual tem ganhado cada vez mais adeptos no mundo e, principalmente, nas transações de comércio eletrônico.

Mesmo tendo seu início mundial em 2009, poucos são os países que têm legislação específica sobre essa moeda ou que permitem sua transação em comércios eletrônicos. Nos Estados Unidos, o Federal Reserve não definiu uma política que regulamente o uso de Bitcoin e a Securities and Exchange Commission (SEC) também não emitiu um regulamento sobre quaisquer das moedas criptografadas existentes atualmente.

Entretanto, a Rede de Repressão aos Crimes Financeiros publicou diretrizes em 2013 sobre criptomoedas, sugerindo que, embora seu uso não seja ilegal, deve-se ater à sua aplicação para combater lavagem de dinheiro.

Com relação ao Brasil, em 19 de fevereiro de 2014, o Banco Central emitiu o Comunicado 25.306 esclarecendo que não deveria haver confusão entre as moedas virtuais (Bitcoin) e as moedas eletrônicas tratadas pela Lei 12.865, de 9 de outubro de 2013, uma vez que as moedas eletrônicas são disciplinadas por atos normativos e representam recursos armazenados em dispositivo ou sistema eletrônico que permitem ao usuário final efetuar transação de pagamento denominada em moeda nacional, enquanto que as moedas virtuais possuem forma própria de denominação, ou seja, são denominadas em unidade de conta distinta das moedas emitidas por governos soberanos, e não se caracterizam dispositivo ou sistema eletrônico para armazenamento em reais.

O Banco Central, por meio desse comunicado, deixou claro que não regulamenta os Bitcoins e sobre eles não tem nenhuma ingerência, alertando inclusive para o uso em atividades ilícitas e prevenindo que seu armazenamento pode sofrer ataques de hackers. Em que pese ainda não haver uma regulamentação brasileira sobre o Bitcoin, a Secretaria da Receita Federal determinou, em seu manual de 2017, que os Bitcoins, “muito embora não sejam consideradas como moeda nos termos do marco regulatório atual, devem ser declaradas na Ficha Bens e Direitos como ‘outros bens’, uma vez que podem ser equiparadas a um ativo financeiro”.

Os Bitcoins devem ser declarados pelo valor de aquisição e a própria Secretaria admite, nesse manual, que por não haver uma cotação oficial e um órgão responsável, também não há regra legal de conversão dos valores para fins tributários. Fato é que se a venda de Bitcoins for superior a 35 mil reais, eventual ganho de capital deverá ser tributado à alíquota de 15% (quinze por cento), considerando o índice mais conhecido (IXBTC), em que pese não ser um índice oficial.

Entretanto, apesar do entendimento da Secretaria da Receita Federal de que os Bitcoins devem ser tributados pelos ganhos de capital que sofrem, há uma linha de entendimento contrária, uma vez que aquele que detém Bitcoins o faz somente como meio de pagamento e não para ter bens, como um investimento financeiro. Essa tese defende que a mera propriedade de Bitcoins não deve ser declarada, por se tratar de um meio de pagamento e, ainda, por não existir regulamentação ou legislação que equipare formalmente o Bitcoin a bem.

Em 30 de outubro de 2018 a Receita Federal publicou a Consulta Pública RFB nº 06/2018, uma vez que ficou constatado o aumento de clientes de exchanges que superou o número de usuários inscritos na bolsa de valores de São Paulo, de forma a definir o que são criptoativos, exchanges e quem deverá fornecer as informações.

Referida obrigação passa a ser das corretoras e a entrega da declaração deve ser mensal, apontando todas as operações de criptomoedas realizadas pelos clientes, sempre que o valor mensal das operações, isolado ou conjuntamente, ultrapassar R$ 10.000,00 (dez mil reais).

No caso de não fornecimento das informações haverá denúncia no Ministério Público e a corretora estará sujeita a uma multa de até 3% da operação e, em eventual atraso na entrega da declaração, a multa será considerada entre R$ 500 R$ 1.500 por mês.

O assunto ainda é bastante debatido, pois inexiste legislação que regulamente sua natureza jurídica, todavia, a fim de evitar a aplicação da multa e demais denúncias, a orientação é para que as corretoras declarem e, havendo dúvidas sobre a legalidade, é fundamental consultar especialistas para orientação individual de cada caso.

*Cinthya Imano Vicente Ribeiro é especialista em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e especializada em Direito Civil pela Escola Paulista de Direito. Mestrando em Direito Comercial pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.