Fernanda Santos*
O Código Comercial de 1850 condicionava o exercício da atividade empresarial às pessoas capazes, que eram maiores de 21 anos à época de sua vigência (BRASIL, 2023, s/p). Com o advento do Código Civil Brasileiro – CCB, a maioridade foi reduzida para 18 anos, refletindo, de forma relevante, na área mercantil. Além disso, as hipóteses de impedimento previstas na legislação comercial que se encontravam defasadas foram amplamente revogadas, ficando tais situações previstas em legislação civil e processual civil e empresarial extravagante. Tendo em vista que para o desenvolvimento de uma atividade empresarial, dentro das formalidades legais não bastam as condições técnicas e econômicas, sendo indispensável que o empreendedor tenha a sua capacidade jurídica, passa se a abordar no decorrer destas linhas. E quem poderá ser empresário? O art. 972 do Código Civil Brasileiro – CCB assim dispõe que:
“Art. 972 – CCB – Podem exercer a atividade de empresário os que estiverem em pleno gozo da capacidade civil e não forem legalmente impedidos” (BRASIL, 2023, s/p).
Portanto, em regra, qualquer pessoa maior de 18 anos, poderá ser empresário, na condição de titular de firma individual ou administrador de uma sociedade. Os maiores de 16 anos legitimamente emancipados, também adquirem capacidade para o exercício de atividade empresarial. O Código Civil Brasileiro – CCB no teor de seu art. 5º, parágrafo único, I (BRASIL, 2023, s/p), e do art. 725, e seguintes do Novo Código de Processo Civil – NCPC/2015 (BRASIL, 2023, s/p), preveem algumas hipóteses em que cessará, para os menores, a incapacidade. São elas:
- a) Pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver 16 (dezesseis) anos completos;
- b) Pelo casamento;
- c) Pelo exercício de emprego público efetivo;
- d) Pela colação de grau em curso de ensino superior;
- e) Pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com 16 (dezesseis) anos completos tenha economia própria (BRASIL, 2023, s/p).
O documento de emancipação do menor empresário que deverá constar de escritura pública lavrada em cartório, e o mesmo documento deverá ser inscrito na Junta Comercial, conforme explana o texto do art. 976 do Código Civil Brasileiro – CCB. O mesmo documento deverá ser feito na hipótese de ato de autorização, mesmo se tratando de ato precário e revogável por decisão judicial. E sobre a incapacidade superveniente, falecimento de sócio e da continuidade da empresa o texto do art. 974 do Código Civil Brasileiro – CCB foi considerado como uma inovação neste liame, visto que, o Código Comercial de 1850 não continha qualquer previsão relativa a casos de interdição ou incapacidade superveniente, falecimento de sócio e da continuidade da empresa. Este dispositivo contempla duas hipóteses distintas:
- a) Falecimento do sócio;
- b) Interdição, fato que ocorre pela incapacidade superveniente (BRASIL, 2023, s/p).
Em ambos os casos, o legislador permitirá a continuidade da empresa, sem necessidade de sua dissolução. O interdito será representado na empresa por meio de um curador; enquanto na hipótese de falecimento de sócio, se o herdeiro for absolutamente incapaz, a representação será feita por seus pais ou tutores. Por fim, em caso de incapacidade relativa do herdeiro, deverá o mesmo ser assistido por seus pais em todos os atos que vier a praticar na condição de sócio da empresa. Nos casos mencionados anteriormente, a continuidade da empresa ou viabilidade de sucessão dependerão, obrigatoriamente de uma autorização judicial. Ressalta-se, ainda, que não deverão integrar o capital da empresa os bens que o incapaz ou os herdeiros do falecido possuíam ao tempo da incapacidade ou da sucessão, quando esses bens integrarem seu acervo pessoal. Sobre os impedimentos legais ao exercício da atividade empresarial estão previstos em legislação extravagante, entre eles destaca se:
- a) Servidores públicos civis (federais, estaduais e municipais);
- b) Magistrados;
- c) Membros do Ministério Público;
- d) Policiais militares da ativa;
- e) Militares da ativa das Forças Armadas;
- f) Empresários falidos (enquanto não houver reabilitação);
- g) Presidente da República, Ministros, Governadores e Prefeitos;
- h) Condenado a pena que vede o acesso a cargos públicos;
- i) Condenado por crime falimentar; entre outros (BRASIL, 2023, s/p).
Cabe ressaltar que a legislação trabalhista, no teor de seu art. 482, alínea c, restringe o exercício da atividade empresarial aos empregados que não sejam expressamente autorizados pelo empregador, quando possa constituir ato de concorrência, e conforme disposto no referido artigo laboral ressalta se que:
“Art. 482 – CLT – Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador: (…) c) negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregado, e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço” (BRASIL, 2023, s/p).
A pessoa legalmente impedida de exercer atividade própria de empresário se a exercer, responderá pelas obrigações contraídas pela mesma. A responsabilização será pessoal e atingirá o patrimônio particular da pessoa impedida. Em relação da sociedade empresária entre os cônjuges, a restrição prevista no art. 977 do Código Civil Brasileiro – CCB, no tocante à constituição de sociedade pelos cônjuges casados no regime da comunhão universal de bens, e da separação obrigatória, gerou várias discussões judiciais em relação à necessidade da adaptação dos atos constitutivos das sociedades constituídas antes da vigência dessa norma. Conforme menção legal a seguir:
“Art. 978 – CCB – O empresário casado pode, sem necessidade de outorga conjugal, qualquer que seja o regime de bens, alienar os imóveis que integrem o patrimônio da empresa ou grava-los de ônus real” (BRASIL, 2023, s/p).
Ficará dispensada a outorga uxória para alienar ou gravar de ônus reais os bens que integrem o patrimônio da empresa de cada cônjuge participe individualmente. E para permitir que os credores tenham ciência de quais bens do empresário poderão ser objeto de garantia, o Código Civil Brasileiro – CCB preceitua que:
“Art. 979 – CCB – Além de no Registro Civil, serão arquivados e averbados, no Registro Público de Empresas Mercantis, os pactos e as declarações antenupciais do empresário, o título de doação, herança, ou legado, de bens clausulados de incomunicabilidade ou inalienabilidade” (BRASIL, 2023, s/p).
Com relação a alteração de estado civil do empresário (separação e ato de reconciliação) também deverá haver a publicidade dos atos a este respeito, pois normalmente a partilha de bens gerará efeitos sobre os direitos dos credores. Segundo o art. 980 do Código Civil Brasileiro – CCB, a sentença que decretar ou homologar a separação judicial do empresário e o ato de reconciliação não podem ser opostos a terceiros, antes de arquivados e averbados no Registro Público de Empresas Mercantis – RPEM. O conceito de atividade empresarial poderá ser identificado no art. 966 do Código Civil Brasileiro – CCB, segundo a teoria da empresa, no caput do mesmo artigo que: “considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços” (BRASIL, 2023, s/p). Já em relação ao Código Civil Brasileiro – CCB, não podem ser administradores de empresas na condição de sócio ou não sócio, enquanto perdurarem os efeitos da condenação, além das pessoas impedidas por lei (menção do Código Civil Brasileiro – CCB no art. 1.011, § 1º). No âmbito da capacidade de cada cônjuge, individualmente ou conjuntamente, o Código Civil Brasileiro – CCB facultará aos cônjuges contratar sociedade, entre si ou com terceiros, desde que não tenham casado no regime da comunhão universal de bens, ou no do regime da separação obrigatória de bens (Código Civil Brasileiro – CCB, art. 977).
Assim, pessoas casadas sob o regime da comunhão parcial de bens poderão ser sócias entre si, com ou sem a presença de terceiros na sociedade, pois estarão fora dos impedimentos. Por fim, podem exercer a atividade de empresário os que estiverem em pleno gozo da capacidade civil, e não forem legalmente impedidos. Por outro lado, a pessoa legalmente impedida de exercer atividade própria de empresário, se exercer tal atividade empresária, responderá pelas obrigações contraídas, não havendo a limitação desta responsabilidade, nem o benefício de ordem quanto a eventuais execuções dos bens da empresa, podendo alcançar diretamente os bens pessoais (BRASIL, 2023, s/p). E conclui –se que a atividade econômica é um conjunto de atos destinados a uma finalidade comum com plena intenção de lucro, que organizam os fatores de produção, para produzirem ou fazerem circular bens ou serviços. A economicidade da atividade exige que ela seja capaz de criar novas utilidades, novas riquezas, englobando aqui o aumento do valor do bem. No entanto, não é, caracterizada como atividade econômica aquela desenvolvida unicamente com o intuito da satisfação das necessidades pessoais do seu responsável, bem como aquela voltada exclusivamente para produção do mercado, pois a segurança jurídica poderia ser atingida. Produzir bens é fabricá-los, é a essência da indústria. Toda atividade industrial é empresarial. Produzir serviços é igual a prestar serviços. A circulação de bens é a atividade de comércio, ou seja, a mediação entre o produtor e o consumidor; e a circulação de serviços também requer essa mediação, ou ainda, intermediar a prestação de serviços (TOMAZETTE, 2022).
A organização da atividade ocorrerá quando nela estiverem presentes os quatro fatores de produção: capital, insumos, mão de obra e tecnologia, na busca do lucro pela realização de determinada atividade. Contudo, compreende-se que a empresa poderá ser exercida sem o fator mão de obra externa (empregados). Imagine-se o caso de um pipoqueiro que não precisará de empregados para que a sua atividade seja considerada como empresa. O profissionalismo no exercício da atividade empresarial estará presente quando existir: (a) pessoalidade: (b) habitualidade e; (c) monopólio das informações. A pessoalidade se traduz na necessidade de o empresário exercer pessoalmente a atividade empresarial. A pessoalidade não requer que o empresário exerça sozinho a atividade, já que pode contratar empregados (prepostos), mão de obra necessária à consecução da atividade. A habitualidade é a reiteração da prática da atividade. Logo, não será empresário aquele que exerce, esporadicamente ou eventualmente, a venda de bens (TOMAZETTE, 2022). O monopólio de informações significará que o empresário detém o conhecimento e todas as informações acerca do produto ou serviço que executa. Assim, é importante ressalvar que a proteção da empresa, como uma atividade econômica organizada, destacada dos titulares que a exercem, impõe-se como exigência do princípio da função social do empreendimento. Entre as atividades econômicas, algumas não são consideradas empresas para fins empresariais, por definição e estipulação legal (BRASIL, 2023, s/p).
São os casos dos profissionais liberais (quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística) que prestem serviços de forma direta, a não ser que a atividade do profissional liberal constitua elemento de empresa. Como é o caso do profissional que exerce a atividade de veterinária. Mas se junto com a atividade intelectual exercer a atividade de venda de produtos, como no caso do pet shop, haverá assim uma atividade intelectual inserida na atividade de comércio, constituindo um todo (menção do Parágrafo Único do art. 966 do Código Civil Brasileiro – CCB). As atividades rurais só serão consideradas como empresariais se o produtor rural estiver devidamente registrado no Registro Público de Empresas Mercantis – RPEM, que ficará a cargo da Junta Comercial conforme a menção no texto dos arts. 971 e 984 do Código Civil Brasileiro – CCB. E as sociedades simples e as cooperativas exercerão sempre atividades não empresariais, pouco importando o que sejam conforme a menção legal do art. 982 do Código Civil Brasileiro – CCB (BRASIL, 2023, s/p).
*Fernanda Santos é bacharela em direito, especialista latu sensu em Direito do Consumidor pela Universidade Federal de Goiás – UFG, especialista latu sensu em Direito Penal e Direito Processual Penal pela Rede Atame, especialista latu sensu em Direito Civil e Direito Processual Civil pela Faculdade Legale, entrevistadora do DM Jurídico, foi entrevistadora do Arena Criminal WEB, pela Rádio MID, capacitada em práticas colaborativas pelo Instituto Brasileiro de Práticas Colaborativas – IBPC em 2018, capacitada em administração de conflitos e negociação pelo Centro Universitário Faveni em 2021, controller jurídico do escritório Abrahão Viana – Advogados Associados, e do Grupo Pitterson Maris Advogados Associados, parecerista em matéria cível, filiada na Associação Brasileira de Juristas pela Democracia – ABJD – Núcleo Goiás, e da Associação Vida e Justiça – Associação Nacional em Apoio e Defesa dos Direitos das vítimas da COVID-19 – Núcleo Goiás, Vice presidente da Rede de Ação e Reação Internacional – RARI Núcleo Goiás (2021/2023), foi articulista do jornal Perspectiva Lusófona em Angola (2010/2012), articulista do jornal Diário da Manhã (2009/2019), com publicações veiculadas no site Opinião Jurídica (2008/2011) e no site Rota Jurídica em Goiânia-GO (2014/2022), e pela Revista Consulex (2014/2016), e com artigos publicados pela Revista Conceito Jurídico, e Prática Forense pela Editora Zakarewicz (2019). Foi membro efetivo da Comissão da Advocacia Jovem – CAJ, da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Goiás – OAB/GO – Gestão 2013/2015.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
BRASIL. Lei nº 556, de 25 de junho de 1850. Código Comercial – Arts. 1º ao 456º, revogados pela Lei nº 10.406, de 2002, Brasília, DF. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lim/LIM556compilado.htm>. Acesso em: 20 mar 2023.
______. Decreto-Lei Nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, Brasília, DF. Disponível em: < https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>. Acesso em: 20 mar 2023.
______. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil Brasileiro – CCB. Brasília, DF. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm>. Acesso em: 20 mar 2023.
______. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Institui o Novo Código de Processo Civil – NCPC/2015. Brasília, DF. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 20 mar 2023.
TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial: Teoria geral e direito societário. Vol.1. 13ª ed. São Paulo: SaraivaJur, 2022.